Missão do FMI visita Maputo para debater novo programa
Lusa | ar
29 de novembro de 2016
Uma missão do Fundo Monetário Internacional (FMI) vai visitar, entre os dias 01 e 12 de dezembro, Moçambique, para iniciar as conversações sobre um novo programa, informa um comunicado da instituição.
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A equipa será liderada por Michel Lazare, chefe de missão do FMI para Moçambique, e as discussões vão prolongar-se até ao primeiro trimestre do próximo ano.
O FMI e os doadores do orçamento do Estado suspenderam a ajuda a Moçambique em abril deste ano, no seguimento da divulgação de empréstimos escondidos garantidos pelo Governo, entre 2013 e 2014, no valor de mais de 1,4 mil milhões de dólares (1,2 mil milhões de euros), e que se somaram aos encargos já conhecidos da Empresa Moçambicana de Atum (Ematum), contratados em igual circunstância.
Em junho, uma missão técnica do FMI, também liderada por Michael Lazare, esteve em Moçambique para avaliar o impacto das dívidas escondidas, tendo declarado na altura que o país alcançou "progressos sólidos".
O Governo de Moçambique assumiu, a 25 de outubro, incapacidade financeira para pagar as próximas prestações dos seus encargos com os credores, defendendo uma reestruturação dos pagamentos e uma nova ajuda financeira do FMI.
O pedido de reestruturação diz respeito aos encargos da Empresa Moçambicana de Atum (EMATUM), uma das beneficiadas pelos empréstimos ocultos e que já tinha sido alvo de uma conversão, há sete meses, dos seus encargos em títulos da dívida moçambicana, no valor de 727 milhões de dólares (652 milhões de euros).
Auditoria internacionalOs credores consideraram, porém, que não estavam em condições de aceitar o pedido de reestruturação, pelo menos até ao fim de uma auditoria internacional independente às dívidas escondidas, já em curso e com um prazo de 90 dias.Mais recentemente, o Ministério da Economia e Finanças insistiu que não tem dinheiro para pagar as próximas prestações, não só da Ematum, como das outras empresas beneficiadas pelos empréstimos ocultos, MAM (Mozambique Asset Management) e Proindicus, e cujas dívidas totais ascendem a mais de dois mil milhões de dólares.
O diretor adjunto do FMI para África, David Owen, esteve a 14 de novembro em Maputo e saudou "as medidas corretas que o Governo tomou recentemente em ligação com as dívidas escondidas", mas avisou que vai ser preciso fazer mais.
"São medidas importantes, mas é um trabalho em progresso, é preciso fazer mais em todos estes assuntos", declarou, numa referência às decisões monetárias e fiscais para conter a desvalorização do metical e aumento da inflação, à contratação de um auditor externo para analisar as dívidas das três empresas beneficiadas pelos empréstimos ocultos e ainda ao pedido de reestruturação da dívida externa.Owen alertou ainda que, no entendimento do FMI, as medidas de ajustamento do Governo devem "dar atenção aos setores mais pobres da sociedade", já de si os mais sacrificados do país.
Moçambique não cumpre os cinco indicadores
Apesar dos elogios do FMI às medidas tomadas recentemente pelo Governo, o reatamento da ajuda a Moçambique está condicionado pelas regras do Fundo, que impedem ajuda financeira a um país com 'debt distress', ou seja, com dívida em esforço ou problemática.
Para avaliar esta dívida o FMI recorre a cinco indicadores que Moçambique não cumpre.
Segundo dados oficiais após a divulgação do escândalo dos empréstimos escondidos, a dívida pública de Moçambique disparou para os 130% do produto interno bruto.
Faces de Tete e do carvão de Moçambique
A vida mudou na província de Tete desde a chegada de empresas multinacionais para explorarem o carvão. Os ventos da mudança trouxeram, para alguns, oportunidades para melhorar de vida; para outros, novas preocupações.
Foto: DW/Marta Barroso
Coque, o trabalhador
Coque tem 28 anos. Trabalha há quatro anos na empresa mineira britânica Beacon Hill. Lá, amarra lonas nos camiões que transportam o carvão até ao vizinho Malawi. Tal como muitos jovens na região, dantes Coque fabricava tijolos que vendia no mercado local. Mas hoje, diz, vive melhor. Por camião recebe 800 meticais, cerca de 20 euros, que divide com o colega que estiver com ele no turno.
Foto: Marta Barroso
Paulo, o diretor de operações da Vale
Apesar dos enormes incentivos fiscais de que gozam as empresas dos megaprojetos em Moçambique, como a brasileira Vale, Paulo Horta diz que um projeto de mineração como o de Moatize gera uma cadeia produtiva tão grande que a população local beneficia em grande medida com a sua vinda para Tete: através da criação de outras empresas, serviços, tributos gerados por terceiros e criação de empregos.
Foto: DW/Marta Barroso
Gomes António, vítima de maus tratos
Gomes António Sopa foi espancado e detido pela polícia na sequência da manifestação de 10 de janeiro de 2012, quando os habitantes de Cateme bloquearam a passagem do comboio que transportava carvão das minas até ao porto da cidade da Beira. Muitas das promessas feitas pela Vale, responsável pelo reassentamento de centenas de famílias, continuam por cumprir. Ainda hoje, Gomes António sente dores.
Foto: Marta Barroso
Duzéria, a curandeira
Os habitantes do Centro de Reassentamento de 25 de Setembro, no distrito de Moatize, queixam-se de que muitos aspetos culturais não foram respeitados durante o processo de reassentamento pelas empresas mineiras. A curandeira do bairro, por exemplo, diz que no planeamento do complexo não se teve em conta a construção de uma casa para o seu espírito.
Foto: Marta Barroso
Lória, a rainha
Provavelmente Lória Macanjo e a sua comunidade deverão ser reassentadas brevemente: a multinacional Rio Tinto está já a operar um mina de carvão em Benga, perto da sua aldeia, Capanga. Também aqui, debaixo da terra que herdou do pai, a empresa mineira descobriu carvão. Mas a rainha sabe do destino dos que já se mudaram e recusa-se a deixar a sua casa.
Foto: DW/Marta Barroso
Olivia, a cabeleireira
Olivia (esq.) tem 29 anos e veio em 2008 do seu país, o Zimbabué, fugindo à crise financeira que lá se vive. Tete é agora a terra das grandes oportunidades, tinham-lhe dito. Hoje, é cabeleireira no Mercado Primeiro de Maio e, tal como a amiga Faith (dir.) faz trabalhos de manicure. Diz que, por dia, consegue 500 a 1000 meticais, entre 15 e 25 euros. Com esse dinheiro consegue sustentar-se.
Foto: DW/Marta Barroso
Guta, o empresário
Ao todo, Guta emprega 130 homens nas áreas de carpintaria e construção civil na cidade de Tete. Diz que desde a chegada das grandes empresas à região não sentiu grandes alterações no seu negócio. Os projetos de mineração requerem quantidades às quais não consegue responder. Uma vez, conta, a Vale pediu que fornecesse, juntamente com outra carpintaria da cidade, 5000 portas em 60 dias.
Foto: DW/Marta Barroso
Canelo, o vendedor de amendoins
Canelo diz que tem 11 anos. E diz também que frequenta a segunda classe. Todas as tardes vende amendoins no centro de Tete. "Para ajudar a mãe que não tem trabalho." O pai também está desempregado. Canelo é uma de muitas crianças que vendem amendoins na cidade. Um saco pequeno fica por dois meticais, cerca de cinco cêntimos de euro, o maior custa cinco meticais, treze cêntimos de euro.
Foto: DW/Marta Barroso
Catequeta, o ativista
Manuel Catequeta mudou-se para Tete em 2001. O ativista dos direitos humanos sabe o que custa viver com a subida constante do custo de vida. O seu salário não lhe permite luxos. A sala de sua casa "de dia é sala, de noite vira quarto". Mas mudar de casa, para já, está fora de questão. Hoje em dia, uma boa casa na capital provincial passa dos 5.000 dólares, cerca de 4.000 euros, por mês.
Foto: DW/Marta Barroso
Júlio, o otimista
O músico Júlio Calengo vê oportunidades de negócio, agora que em Tete há tantas empresas novas. O seu objetivo é, em breve, montar uma empresa de limpeza: tanto nos escritórios das empresas mineiras como nos das firmas que entretanto apareceram na cidade. Interessados não vão faltar, diz Júlio. O que é preciso é ter criatividade e, claro, dinheiro.