Moçambicanos vão às ruas contra leis de regalias para políticos de topo
15 de maio de 2014![](https://static.dw.com/image/17196828_800.webp)
São cerca de 20, as organizações da sociedade civil que decidiram sair às ruas, esta sexta-feira (16.05.14), em Maputo, para manifestar a sua indignação face à recente aprovação, pelo Parlamento, das novas leis que concedem mais regalias aos chefes de Estado e aos Parlamentares, tanto durante o seu mandato como no período de reforma.
As organizações apelam à não promulgação da lei pelo Chefe do Estado. A promulgação da lei é condição para que a mesma entre em vigor no país.
A marcha foi batizada com o lema "não ao roubo legalizado." Os manifestantes estão a ser convidados a trajarem-se de preto, que simboliza o luto.
Trabalho em benefício próprio
Uma das organizações que lidera a iniciativa é o Fórum Mulher. A diretora de Programas desta organização, Zira de Deus, revela que a motivação da marcha se deve ao fato de que "o Parlamento está a aprovar leis em seu benefício. Não olha aquilo que é a real preocupação dos moçambicanos."
Zira de Deus enumera os problemas cotidianos enfrentados pela população. "A pobreza está a atingir níveis alarmantes, a desigualdade social tem vindo a aumentar e ainda asim não estamos a perceber de parte dos nossos dirigentes uma seriedade para ultrapassar conjuntamente e coletivamente estes problemas," lamenta.
De acordo com um manifesto das organizações da sociedade civil promotoras da marcha, "não se pode conceber que num país pobre como o nosso [Moçambique], os deputados aprovem leis destinadas a estimular a acumulação de riqueza de forma ociosa e às custas dos impostos dos seus eleitores."
As mesmas fontes revelam que o salário de um deputado é suficiente para pagar 23 trabalhadores com salários mínimos no setor da agricultura, área considerada pelas autoridades como sendo a base do desenvolvimento do país.
Já o líder de uma bancada parlamentar tem um rendimento 50 vezes superior ao de um trabalhador de base.
O conteúdo das novas leis
As novas leis prevêm, por exemplo, que um chefe de Estado, após concluído o seu mandato, tenha direito a um subsídio de reintegração equivalente a dez anos de vencimento base atualizado - para além de viajens anuais pagas pelo erário público para qualquer parte do mundo, para si e familiares, entre outras regalias.
Só o impacto destas regalias para os antigos chefes de Estado vai representar mais de um milhão de euros para o Orçamento do Estado.
Zira de Deus diz que deve haver justiça, num país em que muita gente ainda está afetada pela pobreza extrema. Estatísticas oficiais revelam que mais de 30% da população vive em pobreza absoluta.
"É no quadro destas todas questões que nós estamos vindo a protestar, exigindo mais transparência, mais equidade social e justiça social, e a ética dos nossos dirigentes, como servidores públicos," considera.
Argumentos não convencem
Zira de Deus recorda que, quando os médicos realizaram uma greve, no ano passado, exigindo melhores salários, a resposta das autoridades foi a de que a exigência era incomportável para o erário público.
A ativista questiona como, então, o Parlamento acaba de aprovar agora regalias altíssimas para os ex-chefes de Estado e Parlamentares.
O Parlamento fundamenta a aprovação das duas leis com a necessiadade de se dignificar os cargos de chefe de Estado e de membro do próprio Parlamento.
Para Zira de Deus, o país tem vários desafios sociais a ultrapassar neste momento e é nisso que se deve concentrar.
"A questão, por exemplo, do acesso à escola, à maternidade, a medicamentos ainda consistem num desafio muito grande para as classes mais baixas, as classes trabalhadoras," cita.
A última manifestação de rua promovida por organizações da sociedade civil, este ano, foi em protesto contra alguns artigos do anti-projecto de revisão do Código Penal, considerados atentatórios aos direitos das mulheres e da criança.
Na sequência desta manifestação, o Parlamento retirou os artigos em causa.
A manifestação desta quarta-feira tem como um de seus objetivos apelar ao Presidente Armando Guebutza para que não promulgue as novas leis.