Alfabetizadores de adultos na província moçambicana de Cabo Delgado alertam que os seus subsídios não chegam para pagar as despesas básicas. As autoridades conhecem o problema, mas não há solução à vista.
Publicidade
Os alfabetizadores em Cabo Delgado queixam-se da falta de incentivos do Governo. Muitos deles não têm outras ocupações e contam apenas com um subsídio mensal do Estado de 650 meticais (cerca de 9,60 euros). "Esse subsídio é muito pouco", comenta a alfabetizadora Isabel Carlos Luís.
O montante não chega para suprir os gastos básicos do mês. "Nós recebemos só 650 meticais. O arroz começa de 900 meticais (13 euros) para lá, o balde de milho está a 200 (3 euros) e o saco de carvão está a 250 (3,70 euros). Com 650 não chega para nada, mas mesmo assim nós vamos avante", afirma.
Pedidos de aumentos
Os alfabetizadores pedem ao Governo que aumente o seu rendimento para, pelo menos, o salário mínimo nacional, que, no setor da Função Pública, ronda os 4.500 meticais (cerca de 65 euros).
Para além da questão do salário, os alfabetizadores alertam também para a falta de material didático, incluindo manuais de ensino.
Alfabetizadores de adultos pedem aumento dos subsídios
Ancha Macário, de 21 anos de idade e uma das beneficiárias do programa de alfabetização, está solidária com a luta dos alfabetizadores. E lembra a importância do programa: "Eu não sabia ler nem escrever. Assim, consigo ler mensagens, textos, cartas e é vantajoso. É muito importante estudar", diz em entrevista à DW África.
Na província de Cabo Delgado, a taxa de analfabetismo é de 60,7% num total de 2,3 milhões de habitantes, de acordo com o Censo da População de 2017.
Daúdo Ussuhale, diretor provincial de Educação e Desenvolvimento Humano em Cabo Delgado, garante que está ciente dos problemas de todos os que se decidiram voluntariar para combater o analfabetismo, e promete encontrar soluções. Mas, segundo Ussuhale, o aumento do subsídio para os alfabetizadores é um assunto que depende do Governo central.
"A questão do subsídio é uma questão da Nação", diz. "Todos os anos temos estado a analisar, há dois ou três anos houve uma subida, mas o Governo está a trabalhar para isso e vamos ver se, nos próximos anos, sobe um bocadinho."
Inhambane: 20 mil alunos começam ano letivo sentados no chão
Ano letivo começa esta sexta-feira em Moçambique, mas há muitos alunos que não têm sequer uma carteira para se sentarem. Só na província de Inhambane, sul do país, são mais de 20 mil. E há salas de aula sem condições.
Foto: DW/L. da Conceicao
Aulas no chão, sem condições
Sentados no chão, sem condições mínimas para trabalhar. É assim que milhares de alunos da província de Inhambane, no sul de Moçambique, começam o ano letivo esta sexta-feira. Os alunos mais afetados são os das zonas rurais. O Governo disse que haveria novas carteiras escolares, mas entregou muito menos do que as que tinha prometido.
Foto: DW/L. da Conceicao
Chão sem cimento
Muitos alunos trazem bancos de casa para a escola, para evitarem sujar o uniforme com a areia da sala de aula. A maioria das escolas tem salas como esta: com material precário, sem chão cimentado e em avançado estado de degradação. Milhares de alunos abandonam o ensino no Inverno, por causa da falta de condições.
Foto: DW/L. da Conceicao
Carteira é só do professor?
Para muitos alunos das zonas rurais e dos bairros suburbanos, há uma pergunta que não quer calar: Por que é que o professor tem direito a uma carteira, para colocar o seu material, mas eles têm de assistir às aulas sentados no chão? Na província de Inhambane, as autoridades de educação estimam que mais de 20 mil alunos não têm carteiras escolares neste início de ano.
Foto: DW/L. da Conceicao
Onde estão as carteiras e a madeira?
O governo provincial de Inhambane entregou madeira a uma empresa da província de Sofala para produzir carteiras escolares, mas, nos últimos dois anos, só foram entregues 3.000 de um total de 10 mil carteiras encomendadas. A empresa alega que só recebeu uma parte do dinheiro da encomenda e não tem recursos para produzir mais. Entretanto, milhares de alunos esperam por um lugar para se sentar.
Foto: DW/L. da Conceicao
As promessas do governo
O setor da Educação prometeu distribuir, até finais de 2018, mais de 16 mil bancos melhorados e mais de 10 mil carteiras duplas. Mas esses bancos e carteiras ainda não chegaram. Palmira Pinto, diretora provincial da Educação e Desenvolvimento Humano em Inhambane, promete que se estão a fazer esforços para, ainda ao longo deste ano, minimizar a preocupação dos alunos que não têm carteiras.
Foto: DW/L. da Conceicao
Aulas debaixo da árvore
Algumas escolas, sobretudo escolas primárias, vêem-se obrigadas a dar aulas debaixo de árvores, porque não têm dinheiro para mandar construir salas. A situação piorou com a saída de alguns parceiros internacionais, que cooperavam diretamente com o setor da Educação em Moçambique na construção de recintos escolares.
Foto: DW/L. da Conceicao
Crise reflete-se nas escolas
Com o conflito entre as forças do Governo e o braço armado da RENAMO e a crise financeira e a descoberta das "dívidas ocultas", parceiros internacionais, que costumavam cooperar com Moçambique, deixaram de dar apoios - também na Educação. Para evitar que os alunos tenham aulas debaixo de árvores, como noutros sítios, há escolas que constroem salas com chapa de zinco. Mas faltam carteiras.
Foto: DW/L. da Conceicao
Como é que se escreve aqui?
Uma das soluções que os alunos arranjaram foi ir buscar blocos de cimento, para não se sentarem no chão. Mas os pais e encarregados de educação estão preocupados com as condições no ensino. Como é que os alunos podem aprender a escrever aqui, sem mesa - só em cima do joelho?
Foto: DW/L. da Conceicao
Escolas privadas
Devido à falta de condições, muitos pais e encarregados de educação acabam por matricular os filhos e educandos em escolas privadas. E, mesmo aqui, há queixas quanto à qualidade das carteiras escolares. Ainda assim, mais vale ter carteiras do que ter aulas no chão, pensam os pais.
Foto: DW/L. da Conceicao
Buracos na sala de aula
Há escolas públicas, como esta, que estão numa fase avançada de degradação. Muitos alunos acabam por contrair doenças, devido à falta de condições. Tanto as autoridades do setor da Educação como líderes comunitários têm levado a cabo uma campanha para construir salas de aula em cada zona pedagógica.
Foto: DW/L. da Conceicao
Contributo comunitário
No âmbito da campanha, membros da comunidade têm construído salas de aula com materiais locais. Mas ainda faltam carteiras escolares, e os alunos têm de se sentar no chão ou nos blocos de cimento. Uma sala de aula acolhe cerca de 60 a 70 alunos, de uma só turma. Face a estas condições, há quem diga que, para conseguir estudar e ter sucesso na vida, é preciso ter muita força de vontade.
Foto: DW/L. da Conceicao
"O maior problema é nas escolas primárias"
Onde há mais falta de carteiras escolares é nas escolas primárias e completas, onde há um maior número de alunos, diz a diretora provincial da Educação e Desenvolvimento Humano, Palmira Pinto. Mas a província de Inhambane espera, neste ano letivo de 2019, retirar mais alunos do chão, para que eles possam assistir às aulas sentados em carteiras.