Moçambique: Aprovado orçamento do Estado para 2021
Leonel Matias (Maputo)
3 de dezembro de 2020
O parlamento em Maputo aprovou esta quinta-feira (03.11) o plano económico e social e o orçamento do Estado para 2021. Partidos da oposição, RENAMO e MDM, votaram contra, defendendo que os instrumentos são irrealistas.
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O plano económico e social e o orçamento do Estado para 2021 foram aprovados esta quinta-feira (03.11) no Parlamento em Maputo com os votos do partido governamental FRELIMO. O primeiro-ministro moçambicano, Carlos Agostinho do Rosário, olha com otimismo para 2021, apesar do contexto adverso provocado pela Covid-19. Nas palavras do chefe do Governo, a recuperação da economia mundial e o retorno gradual do financiamento externo ao orçamento do Estado poderão contribuir para Moçambique alcançar resultados positivos.
"Um crescimento económico de 2,1%, manter a inflação média anual em um dígito, cerca de 5%, atingir 3,8 mil milhões de dólares norte-americanos em exportações e constituir reservas internacionais líquidas para cobrir 6/8 meses de importações em bens não fatoriais", indicou o governante.
O Ministro da Economia e Finanças, Adriano Maleiane, informou que o défice orçamental está estimado em cerca de 102 mil milhões de meticais, o equivalente a 1.300 milhões de euros, o que correspondente a 9,1% do Produto Interno Bruto (PIB). "Um aspeto importante a salientar neste orçamento é que as receitas correntes são superiores às despesas", ressalvou.
Na área da Saúde, o titular da pasta, Armindo Tiago, disse que o país aderiu à iniciativa COVAX que vai permitir um acesso rápido e equitativo a vacinas contra a Covid-19 em colaboração com a Organização Mundial da Saúde (OMS). "Moçambique receberia neste mecanismo cerca de seis milhões de doses de vacinas para os 20% da população atual que está estimada em 30 milhões", explicou.
Armindo Tiago garantiu ainda que Moçambique tem um stock de medicamentos suficiente para os próximos três meses e espera receber uma nova encomenda de fármacos para cobrir as necessidades a seis meses.
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Oposição com muitas dúvidas
As bancadas parlamentares da FRELIMO e da oposição divergiram na apreciação do plano económico e social e do orçamento do Estado para 2021. O partido no poder diz que o Governo vai continuar a alocar recursos aos vários setores, com vista a reduzir as desigualdades sociais, reforçar a capacidade das forças de defesa e segurança e prosseguir com as medidas de prevenção contra a Covid-19.
"O capital humano é a primeira prioridade deste plano económico e social 2021", frisou deputado da FRELIMO, Aires Aly.
Porém a RENAMO, que votou contra a proposta de orçamento do Governo, justifica-se, afirmando que o documento dá primazia à Presidência da República e à Casa Militar, em detrimento dos setores da vida social e económica do país. "A presente proposta não coloca como desiderato o grande desafio dos moçambicanos que é a despartidarização do aparelho do Estado e a eliminação da perseguição política aos membros da oposição", afirmou Carlos Manuel, deputado do maior partido da oposição.
Para o MDM, os jovens vão continuar abandonados e sem oportunidades de emprego. Segundo o deputado Fernando Bismarque, o Executivo continua a relegar para a sociedade civil a responsabilidade de assistência às vítimas da violência armada no centro e norte do país. "É urgente a assistência psicossocial a estas famílias", asseverou.
Demasiados gastos com o aparelho do Estado?
Segundo Adriano Nuvunga, coordenador do Fórum de Monitoria do Orçamento (FMO), a proposta de orçamento do Estado não está ajustada à realidade moçambicana. "O orçamento continua a prever gastos maiores ao nível central. Este tem sido o calcanhar de Aquiles", advertiu.
Adriano Nuvunga notou ainda com preocupação que o orçamento prevê um valor "ínfimo" para a proteção social. "Este setor foi sempre negligenciado, isto é a razão pela qual continuamos a dizer que os números da Covid-19 atingiram este ponto, porque as pessoas não foram atingidas. E este padrão mantém-se aqui no orçamento de 2021", sublinha.
Relativamente a este assunto, o Ministro da Economia e Finanças, Adriano Maleiane, referiu no parlamento que apesar do orçamento estar muitas vezes centralizado em termos absolutos, na prática não é o que acontece, porque durante a sua execução acaba por ser descentralizado.
O fardo da Covid-19 para as famílias de Inhambane
Milhares de famílias estão a sofrer na província de Inhambane, no sul de Moçambique, desde que eclodiu a pandemia do novo coronavirus. Há pessoas sem emprego, em isolamento, obras paralisadas e os bens escasseiam.
Foto: Luciano da Conceição/DW
Famílias sofrem por causa da Covid-19
Muitos habitantes da província moçambicana de Inhambane perderam os postos de trabalho por causa da crise provocada pela Covid-19, outros foram dispensados para cumprirem o isolamento social. Por outro lado, há obras paralisadas e faltam vários produtos, principalmente nas zonas rurais. Muita gente está a migrar para as cidades e vilas.
Foto: Luciano da Conceição/DW
A culpa é do coronavírus
Dulce Eugénio, mãe de dois filhos e residente no bairro Sarrene, na cidade de Maxixe, disse que antes da pandemia o negócio corria muito bem, mas depois ficou sem dinheiro: "Consegui comprar o meu terreno e já estava a construir a minha casa de blocos com este pequeno negócio de vender tomates, cebola, pepino e cenoura, mas essa doença veio atrapalhar toda a situação."
Foto: Luciano da Conceição/DW
"Coronavírus trouxe mais fome"
Com o confinamento obrigatório decretado em abril de 2020, a situação da fome agravou em Inhambane. Os cidadãos consideram que a pandemia do novo coronavírus "trouxe mais fome e miséria às comunidades". O desespero continua a imperar.
Foto: Luciano da Conceição/DW
Viver de hortaliças é para quem pode
Há cada vez mais pessoas desempregadas, muitas famílias tiveram de adaptar as receitas em casa e passaram a consumir mais verduras, por exemplo. Mesmo assim, nem todos conseguem comprar, porque as hortaliças também já começam a escassear. Marta Alberto diz que não foi registada para receber o subsídio da Covid-19, concedido pelo Estado, e pede ajuda.
Foto: Luciano da Conceição/DW
Produção agrícola em queda
Não é só a pandemia que tem sido um problema. Não tem chovido e muitas pessoas abandonaram a atividade agrícola. Os camponeses pedem ao Estado sementes, que estão cada vez mais caras no mercado. Em Inhambane, nem todos os camponeses vão receber o subsídio de dois mil meticais mensais (cerca de 23 euros) para suprir as suas necessidades durante seis meses.
Foto: Luciano da Conceição/DW
Abandonada pela família e sem apoio
Joana Cândido foi abandonada pela família. Vivia com os netos, mas, com a pandemia, o filho solicitou aos netos que residissem juntos noutro bairro, deixando assim a idosa à sua sorte. Com problemas na perna e dores constantes na coluna, não lhe é fácil ter três refeições por dia. Afirma que não foi selecionada pelo Instituto Nacional de Ação Social (INAS) para receber o subsídio da Covid-19.
Foto: Luciano da Conceição/DW
"Estamos a sofrer e precisamos de apoio"
Laura Simão foi registada pelo INAS, na cidade de Maxixe, mas ainda não recebeu o dinheiro e afirma não ter comida suficiente. Em situação semelhante estão muitas outras pessoas carenciadas, que foram inscritas mas ainda não receberam os subsídios.
Foto: Luciano da Conceição/DW
Excluída dos apoios, com a panela vazia
Maria João revela que não foi contemplada pelos apoios da Covid-19. Ficou surpreendida, porque não trabalha, tem filhos a seu cargo e a panela vazia. E pede apoio ao Estado.
Foto: Luciano da Conceição/DW
Enganar a fome
Teresa António trabalhava como doméstica em Inhambane, numa residência, mas, com a pandemia, teve de deixar de trabalhar para os seus patrões. Agora desempregada, diz que é difícil ter arroz na mesa e, muitas vezes, tem de misturar o arroz com tapioca (farinha de mandioca) para conseguir enganar a fome.
Foto: Luciano da Conceição/DW
Vender mangas para sobreviver à pandemia
Cândida Maurício fazia venda ambulante no centro da cidade da Maxixe, mas - impossibilitada de continuar o negócio na rua por causa da pandemia - teve de se adaptar. Faz agora revenda de mangas na sua residência, mas soma prejuízos e não recebe apoio do Governo.
Foto: Luciano da Conceição/DW
Perdeu o emprego com a Covid-19
Com o encerramento dos estabelecimentos comerciais em cumprimento do decreto do estado de emergência, João Saul foi demitido do serviço de guarda. Afirma que a pandemia lhe trouxe efeitos negativos que jamais irá esquecer. Sobrevive com o subsídio que recebe por ser desmobilizado - não superior a 50 euros - valor que considera insuficiente.
Foto: Luciano da Conceição/DW
Sonho perdido?
Nina Cumbe concluiu o 12º ano de escolaridade em Inhambane, em 2019. Antes da eclosão da pandemia, queria concorrer a uma escola técnica profissional, mas não conseguiu, porque muitos estabelecimentos de ensino tiveram que encerrar com a declaração do estado de emergência no país. Agora, tenta ganhar a vida fazendo tranças a amigas.
Foto: Luciano da Conceição/DW
Resta fé e esperança
No meio de tanto sofrimento provocado pela pandemia do novo coronavírus, as famílias estão a lutar para superar a crise. Ilda Joaquim, residente de Inhambane, afirma que o confinamento social agravou a maneira de viver e que está a ser difícil adaptar-se às novas medidas. Reza muito para que consiga ultrapassar esta crise, porque está difícil receber apoios.
Foto: Luciano da Conceição/DW
À espera de dias melhores
Antes da chegada do novo coronavírus, Maria Alberto fazia trabalhos para terceiros e produzia mandioca para fabricar e vender farinha. Hoje, é uma simples dona de casa que deixa as panelas limpas à espera que o marido traga alguma coisa dos seus biscates diários. Lamenta o sofrimento provocado pela Covid-19, mas vive na esperança de que tudo voltará à normalidade.