Moçambique: Artistas de Nampula enfrentam dificuldades
Sitoi Lutxeque (Nampula)
17 de junho de 2017
Na província moçambicana, os artesãos enfrentam dificuldades financeiras. Escultores e pintores pedem aos cidadãos nacionais que valorizem a sua cultura.
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Em Moçambique, apesar da trégua decretada por tempo indeterminado entre as forças do Governo e da RENAMO, o maior partido da oposição, e a valorização do metical face ao dólar, nos últimos meses, na província nortenha de Nampula, os artistas, principalmente pintores e escultores, continuam a queixar-se da falta de clientes dos seus produtos artesanais.
Os artistas estão também preocupados com o facto de os principais clientes serem os cidadãos de origem estrangeira e acusam os nacionais de não valorizarem a sua própria cultura.
Gilberto Pedro, de 40 anos, é responsável pela Galeria de Artes Maconde, uma das mais antigas da província de Nampula, criada em 1974, ainda antes da independência de Moçambique.
Em entrevista à DW África, Gilberto Pedro, que é também escultor há mais de 20 anos, lamentou a fraca adesão dos clientes aos produtos que ele e seus colegas produzem. O escultor diz não perceber a real causa, uma vez que abrandou o clima de tensão político-militar que era a justificação dada pelos clientes, na maioria, estrangeiros.
"Desde aquele tempo em que ficámos em guerra [2015], não temos sucesso no negócio. O movimento dos clientes está muito fraco'', afirma o escultor.
Apelo aos moçambicanos
Face a esta realidade, segundo Gilberto Pedro, os artistas são confrontados com sérios problemas, desde dificuldades na compra da matéria-prima (madeira), no pagamento da renda da galeria e da luz, bem como no sustento da família.
Segundo Gilberto, há dias em que não se vende nem uma peça de artesanato, ao contrário do que acontecia em anos anteriores, quando a galeria recebia diariamente dezenas de apreciadores e clientes.
Os cidadãos de origem estrageira, sobretudo vindos da China, Portugal, Alemanha, Inglaterra, e Estados Unidos da América são os principais compradores. Por isso, o responsável pela Galeria de Arte Maconde lança um apelo aos moçambicanos: "Venham à nossa galeria apreciar e comprar os nossos produtos”.
Ser escultora numa galeria de homens
Na Galeria de Arte Maconde trabalham 24 escultores. Há apenas uma mulher. Judite Albino, de 27 anos, abraçou a arte de esculpir há 4 anos, graças a uma formação de um projeto da UNESCO. No meio do desemprego e gosto pela cultura, a única mulher no grupo de artistas está satisfeita com este trabalho – uma ajuda para alimentar os seus quatro filhos.
"Sempre que estou a trabalhar não me sinto mulher e diferente dos homens, faço tudo oque eles fazem", sublinha Judite.
Entre os artistas, a DW África encontrou uma cliente. Na companhia dos seus parentes, Belinda Dickeg, cidadã norte-americana, visitou as galerias de artes localizadas no interior do Museu Nacional de Etnologia, em Nampula, e comprou alguns objectos. "Adoro a cultura africana”.
Transformar lixo em artesanato
A organização moçambicana ALMA produz artesanato do lixo que recolhe no Tofo, Moçambique. Por exemplo, de jornais usados fabricam-se bases para tachos. Os artigos são vendidos em Moçambique e no estrangeiro.
Foto: DW/J. Beck
Esta base para tachos foi feita de jornais
A organização moçambicana ALMA - Associação de Limpeza e Meio Ambiente produz uma variada gama de produtos de artesanato do lixo que recolhe no Tofo, uma aldeia na costa da província de Inhambane, no sul de Moçambique, que é famosa pelas suas praias e pelos locais de mergulho. Por exemplo, de jornais usados fabricam-se bases para tachos. Os artigos são vendidos em Moçambique e no estrangeiro.
Foto: DW/J. Beck
ONG faz a recolha do lixo
Com o apoio da Câmara Municipal de Inhambane (CMI), a ALMA é responsável pela recolha do lixo no bairro Josina Machel, onde também se situa a localidade do Tofo. A aldeia é um centro do turismo ecológico em Moçambique. Muitos turistas procuram esta parte da costa do Oceano Índico para mergulhar com raias jamanta e tubarões baleia que são encontrados com frequência.
Foto: DW/J. Beck
As praias limpas do Tofo
Para além da recolha normal de lixo, que é feita duas vezes por semana, os membros da ALMA limpam as ruas e as praia. "Uma vez por mês fazemos uma limpeza geral", conta Gito Nhanombe, o coordenador da ALMA. "Sem a ALMA o Tofo não estaria tão limpo", diz Nhanombe. A limpeza torna o Tofo mais atrativo para turistas. "E menos lixo na praia, significa também menos lixo no mar", diz o coordenador.
Foto: DW/Johannes Beck
Evitar imagens como esta
Com a limpeza regular das ruas e praias do Tofo, a ALMA quer evitar imagens como esta (foto da Indonésia). O lixo plástico no mar é perigoso: pode asfixiar tartarugas que confundem sacos plásticos com medusas e tentam comê-los. Mas o plástico nos oceanos também ameaça a saúde dos homens, pois após a sua decomposição entra na cadeia alimentar através do consumo de peixes que comeram o granulado.
Foto: picture alliance/WILDLIFE
Separação de lixo
Em alguns lugares, como aqui em frente da esquadra local da Polícia da República de Moçambique no Tofo, existem vários contentores de lixo. Cada um serve para diferentes tipos de lixo. Neste caso para separar plástico do lixo comum para facilitar a reciclagem. Um sistema que já é amplamente usado em países como a Alemanha.
Foto: DW/J. Beck
Triagem do que pode ser reutilizado
Os membros da ALMA separam do lixo tudo o que podem usar para o fabrico de artesanato ou para a reciclagem. Guardam as tampas de garrafas de cerveja e de refrigerantes numa caixa. Guardam também papel, cavilhas de latas e pacotes de bebidas. Neste momento não há recolha de plástico, mas a ALMA espera encontrar um novo comprador para as grandes quantidades de plástico reciclado.
Foto: DW/J. Beck
Tampas como base
As tampas de garrafas são forradas com restos de capulanas, que são fornecidos por um alfaiate de Inhambane. No total, 11 pessoas trabalham nos dois setores de limpeza e artesanato da ALMA: seis mulheres e cinco homens. A venda do artesanato e do material reciclado permite à organização não-governamental criar empregos e pagar salários.
Foto: DW/J. Beck
Bases para tachos
Depois de forrarem as tampas, os artesãos juntam várias destas caricas para criar bases para tachos em formato hexagonal. Um conjunto destas bases custa 250 meticais moçambicanos (equivalente a 6,25 euros) e pode servir para colocar tachos, garrafas e copos na mesa.
Foto: DW/J. Beck
Jornais usados ganham nova vida
Entre os materiais procurados pelos artesãos da ALMA estão os jornais. Se não chegarem muito sujos à ALMA, podem ser processados. O papel dos jornais tem boa textura e, quando é impregnado com cola, pode ser enrolado e transformado em bases. Neste caso, custam 150 meticais (equivalente a 3,75 euros).
Foto: DW/J. Beck
A lixeira da ALMA
Mas mesmo com reciclagem e com o aproveitamento de alguma parte do lixo para artesanato, ainda sobra uma grande parte do lixo recolhido. Este material é depositado numa lixeira a céu aberto no terreno da ALMA junto à estrada principal de acesso ao Tofo. Se houver um comprador para o plástico reciclado, a quantidade de lixo depositado poderá ser reduzida.
Foto: DW/J. Beck
Loja local no Tofo
Os produtos produzidos localmente são vendidos na loja da ALMA. O coordenador da ALMA, o jovem moçambicano Gito Nhanombe (na foto), apresenta os produtos aos interessados e explica os materiais que foram usados. Esta bolsa é feita de pacotes de leite.
Foto: DW/J. Beck
Venda principalmente a turistas
Em vários pontos de Moçambique encontram-se pontos de venda da ALMA. São principalmente turistas os clientes da ALMA, mas alguns moçambicanos também fazem compras. No Restaurante Sul do Tofo (na foto), uma montra junto ao balcão mostra alguns produtos. Também há vendas na Europa através de encomendas. A cooperação alemã GIZ já apresentou trabalhos da ALMA numa exposição em Bona, Alemanha.
Foto: DW/J. Beck
Quem adivinhava que eram anilhas de latas?
À primeira vista, muitas peças da ALMA não fazem pensar em reciclagem de lixo. Estes suportes de copos foram feitos com anilhas de latas de alumínio. Os artesãos moçambicanos uniram-nas com fio de croché, em forma de flor. O artesanato amigo do ambiente cria empregos e contribui para manter uma parte da costa moçambicana limpa.