Assinalam-se 25 anos da assinatura do Acordo Geral de Paz, a 4 de outubro de 1992. A paz foi interrompida pelo recente conflito que teve Manica como um dos palcos principais. Mas a normalidade parece estar de regresso.
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As vias de comunicação foram os principais pontos afetados durante o recente conflito político-militar. Mas desde a trégua, há vários meses, o cenário melhorou nas estradas de Manica.
"Desde do momento em que houve tréguas, primeiro uma trégua temporária e depois a definitiva, a situação que tem que ver com ataques ficou calma”, confirmou Gonçalves Lopes, condutor de longo curso.
"Sobre os assaltos e cobranças ilícitas, digamos que pode estar a acontecer com um e outro [condutor], mas no meu caso ainda não aconteceu", acrescenta.
Segundo o condutor, os postos de controlo mantêm-se em alguns pontos, com a presença das Forças de Defesa e Segurança.
"A dificuldade que nós podemos estar a registar, neste momento, tem que ver com o excesso de buracos. As nossas vias não estão em condições, o que estraga as nossas viaturas e também cria dificuldade a própria condução", conta Gonçalves Lopes.
Circulação segura
A porta-voz do comando provincial da Polícia da República de Moçambique (PRM) em Manica, Elsídia Filipe, garante que se verifica "uma circulação livre e segura das pessoas e bens".
Moçambique celebra Dia da Paz
"As pessoas passeiam à vontade, divertem-se à vontade. As nossas instituições estão a funcionar no seu horário normal e os agentes económicos estão a trabalhar", afirma Elsídia Filipe.
No entanto, "isso não significa que não estejamos a registar casos criminais ou acidentes de viação, estamos sim, mas não de forma que haja uma perturbação significativa da liberdade e do exercício dos direitos e garantias dos cidadãos", acrescenta a porta-voz da PRM em Manica.
Oposição duvida de paz duradoura
No entanto, Jaime Nhanteme, da liga da juventude do Movimento Democrático de Moçambique (MDM) em Manica, não acredita que a paz seja duradoura."Moçambique está num momento feliz em relação ao período anterior. Mas agora estarmos em paz, não estamos como tal", comenta Jaime Nhanteme.
O membro da terceira força política moçambicana entende que o Presidente Filipe Nyusi e o líder da Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), Afonso Dhlakama, deviam envolver o povo no diálogo e não cingi-lo apenas a dois protagonistas.
"A paz não envolve apenas duas pessoas, porque num país democrático e de direito a paz não pode ser definida por duas pessoas, o Presidente da República e o líder da RENAMO. Deveria haver a intervenção do povo nesta discussão sobre paz", critica Jaime Nhanteme.
Democracia mais próxima dos cidadãos
Mais otimista, o delegado político do principal partido da oposição na província de Manica, Sofrimento Matequenha, mostra-se ansioso em ver as negociações entre o Presidente e a RENAMO chegarem a bom porto, ou seja, a uma paz duradoura e definitiva em Moçambique.
"Queremos um ambiente que vai fazer com que os moçambicanos se sintam donos deste país", afirma Sofrimento Matequenha.
Nesse sentido, "esperamos que as negociações consigam chegar a bom despacho e que a descentralização que o povo espera, a nível da administração do Estado, seja uma realidade. O que significa em 2019 termos governadores eleitos em todas as províncias. E que, pela primeira vez no país, as populações das províncias sejam governadas pelos governadores eleitos por elas próprias", sublinha o político.
Na prática, acrescenta o delegado político da RENAMO, é "aproximar a democracia das comunidades, para que as próprias comunidades decidam sobre o seu futuro".
Depois de cerca de dois anos do reacender do conflito, a RENAMO declarou a primeira trégua em dezembro de 2016. Em março último, Afonso Dhlakama declerou uma trégua "sem prazos" que continua em vigor.
20 Anos de Paz em Moçambique: Uma viagem
A 4 de outubro de 1992, FRELIMO e RENAMO assinaram o Acordo Geral de Paz, pondo fim a 16 anos de guerra civil em Moçambique. Apesar da paz, a guerra civil continua a marcar a vida de muitos moçambicanos.
Foto: Marta Barroso
A guerra presente todos os dias
A 4 de outubro de 1992, FRELIMO e RENAMO assinaram o Acordo Geral de Paz, pondo fim a 16 anos de guerra civil em Moçambique. Apesar da paz, a guerra civil continua a marcar a vida de muitos moçambicanos. Joula estava grávida de oito meses quando uma mina anti-pessoal lhe arrancou um pé em 1991. Na noite anterior, a RENAMO tinha atacado a aldeia e plantado minas em redor.
Foto: Marta Barroso
De armas a enxadas... ou cadeiras
Desde 1996, o projeto "Armas em Enxadas" dá um novo destino ao material bélico que destruiu milhares de vidas durante a guerra civil. O objetivo da iniciativa, lançada pelo Conselho Cristão de Moçambique, é criar, com as armas, obras de arte com mensagens de paz. Muitas peças foram encontradas pelo país, outras foram recolhidas a privados.
Foto: Marta Barroso
Ataques inesperados
São as mesmas armas que há 20 anos eram usadas para atacar seres humanos como estes refugiados em Chamanculo, perto da capital, Maputo, em 1992. Chamanculo nunca recuperou da chegada de milhares de refugiados da guerra civil. Ainda hoje, é um bairro pobre. Foi aqui que nasceram figuras ilustres do país como Maria de Lurdes Mutola.
Foto: DW/Cristina Krippahl
Ruas desertas em Maputo
A guerra, que se arrastou por 16 anos, atrasou o desenvolvimento do país. Também a vida social sofreu, até mesmo na capital. Engarrafamentos eram, durante a guerra e nos primeiros anos seguintes, algo raro como se pode ver nesta fotografia do centro de Maputo de 1992.
Foto: DW/Cristina Krippahl
Filhos da guerra
Em 1990, Moçambique era considerado o país mais pobre do mundo. Em 2011, ocupava o lugar 184 entre 187 Estados no Índice de Desenvolvimento Humano do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, PNUD. 20 anos depois de assinada a paz, os moçambicanos continuam a viver, em média, 50 anos.
Foto: DW/Cristina Krippahl
Filhos da paz
20 anos depois do Acordo Geral de Paz, ainda há muito que fazer no combate à pobreza em Moçambique. As províncias do Niassa, de Maputo, Cabo Delgado e Tete (na imagem) são, segundo o Programa da ONU para o Desenvolvimento, PNUD, as que têm maior incidência de pobreza no país.
Foto: Marta Barroso
Casa de Espera
Iniciativas como esta na aldeia de Vinho, no Parque Nacional da Gorongosa, província de Sofala, contribuem para diminuir a mortalidade infantil e materna. Atualmente, em Moçambique cerca de 500 mães morrem por cada 100 mil crianças nascidas vivas. Para evitar que isso aconteça na aldeia de Vinho, a Casa de Espera assiste as mulheres grávidas das redondezas na preparação dos partos.
Foto: Marta Barroso
Economia dominada por megaprojetos
A paz possibilitou megaprojetos, como o da exploração de carvão em Moatize, Tete. De futuro, a esperança é de que os rendimentos destes projetos beneficiem mais a população. Devido aos incentivos fiscais de que gozam as multinacionais ligadas a eles, o Estado moçambicano deixa de ganhar mais de 200 milhões de dólares por ano, segundo o Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE).
Foto: Marta Barroso
Carvão, a euforia de Tete
74 toneladas de carvão já estão carregadas nesta transportadora que pode levar até 400 toneladas. O carvão da província central de Tete tem vindo a atrair investidores nacionais e internacionais à procura do "El Dorado" que tem limitado a diversificação da economia nacional na segunda década de paz em Moçambique.
Foto: Marta Barroso
Cahora Bassa...
Durante a guerra civil, as linhas de transmissão de Cahora Bassa foram alvo de ataques da RENAMO. Hoje, a barragem funciona em pleno. Cahora Bassa tem uma capacidade instalada de 2.075 megawatts, a maior parte da energia é exportada para os países da região: 70% para a África do Sul e 5% para o Zimbabué. Apenas um quarto da eletricidade aqui produzida é consumida em Moçambique.
Foto: DW/M. Barroso
... um elefante branco para esta área do país?
Ainda há poucas casas em redor de Cahora Bassa com acesso regular à eletricidade. Para o economista moçambicano Carlos Castel-Branco do IESE, dever-se-iam estender as bases do desenvolvimento do país às aldeias e vilas em torno da barragem para que também aqui a vida económica se transformasse num elemento de estímulo para o investimento.
Foto: Marta Barroso
Gentes ligadas
A reabilitação das infraestruturas permite agora uma maior mobilidade e fomenta o comércio interno. A linha férrea de Sena liga a província de Tete, no interior de Moçambique, à cidade portuária da Beira. No tempo da guerra civil, foi encerrada e acabou por ser completamente destruída. Nos últimos anos, o corredor ferroviário foi reabilitado para escoar sobretudo o carvão da região de Tete.
Foto: Marta Barroso
Gentes apertadas
O comboio é um dos meios de transporte mais baratos em Moçambique. Em fevereiro de 2012, a Linha de Sena abriu a passageiros em toda a sua extensão. A reconstrução foi feita por troços e acabou por tomar muito mais tempo que o previsto, porque o consórcio indiano responsável pelas obras não cumpriu diversos prazos. Grande parte do dinheiro veio do Banco Mundial.
Foto: Marta Barroso
Há esperança em Moçambique
Idalina Melesse viajou de comboio pela primeira vez em 2012. Durante a guerra civil, os ataques impediram-na de se mover dentro do país. Desde então e até à reabertura da Linha de Sena, não tinha tido dinheiro para longas viagens. A Linha de Sena e outras infraestruturas não só unem moçambicanos, mas devolvem-lhes a liberdade de movimento e a facilidade de comunicação confiscadas pela guerra.