Especialistas defendem, em Maputo, que Moçambique não deve pagar nem negociar a reestruturação dos empréstimos. Segundo o CIP, Estado moçambicano tem "todas as condições para dizer que não paga esta dívida".
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Em Moçambique, especialistas nacionais e estrangeiros em matérias relacionadas com a dívida defenderam esta sexta-feira (15.03) que o país não deve pagar nem negociar a reestruturação dos empréstimos que foram contraídos ilegalmente com garantias do Governo.
Centenas de pessoas, entre especialistas, académicos, políticos, a sociedade civil e o público em geral participaram em Maputo num seminário internacional de reflexão sobre o endividamento público promovido pela organização não governamental Centro de Integridade Pública (CIP).
O seminário debateu diferentes perspetivas sobre como é que Moçambique deve lidar com o caso das chamadas dividas ocultas contraídas por três empresas com garantias do Governo e sem o conhecimento do Parlamento, que lesaram o Estado em mais de dois mil milhões de dólares. Abordou ainda como evitar que a situação se repita no futuro.
Dizer "não" às dívidas
O diretor do CIP, Edson Cortês, afirmou no final do encontro que "a principal lição é que o Estado moçambicano tem todas as condições para dizer que não paga esta divida oculta".
Um dos painelistas, o alemão Mathias Goldmann, especialista em questões de dívida soberana, disse que há provas de que essas dívidas são ilegais, não foram autorizadas pelo Parlamento e as garantias foram emitidas ilegalmente.
"Moçambique não deve renegociar essas dívidas, deve repudiá-las. Deve recusar-se a pagá-las. Se Moçambique mostrar boa fé, investigar o caso, julgar e responsabilizar as pessoas envolvidas, e demonstrar compromisso contra a corrupção, os doadores internacionais incluindo o Fundo Monetário Internacional vão aceitar este esforço porque, o FMI também é contrário a corrupção".
Comentando sobre o que poderá acontecer ao Estado moçambicano se pagar a dívida, Mathias Goldmann pensa que "será aberto um precedente terrível, porque isso vai encorajar que casos similares aconteçam. É como se estivesse a estimular os detentores do capital que em parceria com nacionais continuem a levar a cabo esse tipo de praticas corruptas", destacou o especialista em questões de dívida soberana.
Por seu turno, o economista moçambicano Roberto Tibana defende que o Estado não deve dirigir-se aos credores para dizer que não consegue pagar a dívida neste momento, para pedir um alargamento do prazo de amortização, a redução dos juros ou o perdão de toda a dívida.
Reforçar as instituiçõesRoberto Tibana considera que o Estado moçambicano deve assumir a seguinte posição em relação à dívida: "Não pago, mas eu tenho uma responsabilidade como Estado para resolver este problema. E a resolução que eu ponho é apanhei os meus, justiça com eles, arrestei os bens , liquidei, deduzi os custos disso o que sobra é isto. Agora eu quero que vocês aceitem isso, aquilo que não cobre vão buscar aos outros, aqueles que estes deram no tribunal os nomes deles que foram os colaboradores deles com quem fizeram isso".
Moçambique: Como fugir às dívidas ocultas?
Já o especialista em questões da dívida, o zimbabueano Tiringai Mutazu, destacou que a prevenção deste tipo de casos no futuro depende de quão fortes forem as leis e instituições nacionais. Segundo Tiringai Mutazu é necessário reforçar essas instituições em matérias como capacitação e monitorização.
"É importante que tenhamos mecanismos internos fortes que previnam por exemplo a corrupção e a concessão de garantias de empréstimos sem a aprovação do Parlamento. Os responsáveis pelas violações que forem detectadas devem ser punidos".
Moçambique: Cheias em Tete deixam rasto de destruição
Pelo menos, seis pessoas morreram vítimas das inundações na província moçambicana de Tete, nos últimos dias. Dezenas de casas ficaram destruídas. Centenas de famílias procuram refúgio em centros de acolhimento.
Foto: DW/A. Zacarias
Mortes e destruição em Tete
As cheias dos últimos dias na província de Tete, centro de Moçambique, fizeram pelo menos seis mortos. Entre as vítimas mortais está um elemento do Serviço Nacional de Salvação Pública, que perdeu a vida em serviço. As enxurradas destruíram 49 casas, segundo o último balanço das autoridades.
Foto: DW/A. Zacarias
Cheias fazem milhares de desalojados
Há muitas habitações que continuam submersas. O rio Rovubué, um afluente do Zambeze, um dos maiores rios de África, transbordou na madrugada de sexta-feira. Milhares de pessoas da cidade de Tete e do distrito de Moatize ficaram desalojadas. Neste momento, os níveis de água nas zonas afetadas estão a baixar e as autoridades temem encontrar mais corpos.
Foto: DW/A. Zacarias
Famílias aguardam tendas
As cheias afetaram mais de 900 famílias. 600 foram acolhidas neste centro de acomodação, no Instituto Industrial e Comercial de Matundo, em Tete. Aqui, as dificuldades são enormes. Faltam tendas. E, enquanto as tendas não chegam, as famílias juntam os seus pertences debaixo de árvores.
Foto: DW/A. Zacarias
Falta comida
Judite Chipala é mãe de cinco crianças. Ela e os filhos procuraram refúgio no centro de acolhimento. Mas ela queixa-se da falta de comida: "Estamos a passar mal. Não estamos a comer como deve ser", afirma.
Foto: DW/A. Zacarias
Pedido de donativos
Muitos dos desalojados são crianças. As autoridades dizem estar cientes das dificuldades no centro de acolhimento, no Instituto Industrial e Comercial de Matundo, e lançaram um apelo à solidariedade para com as vítimas das enxurradas.
Foto: DW/A. Zacarias
Voluntários
No centro de acolhimento, várias voluntárias ajudam na confeção da comida e na sua distribuição. À chegada ao centro, técnicos do Instituto Nacional de Gestão de Calamidades Naturais (INGC) registam os desalojados. Mas quem chega aqui quer sair o mais depressa possível.
Foto: DW/A. Zacarias
À espera de solução
"Aqui não há condições. Eu prefiro voltar a minha casa", queixa-se Sousa Mabore, um dos desalojados no centro de acomodação no Instituto Industrial e Comercial de Matundo. Já Telma Feliciano quer sair do local onde mora e pede às autoridades para lhe darem alojamento fora de zonas propensas a inundações. "Se tivermos ajuda, para nos porem num sítio seguro, não vamos voltar."
Foto: DW/A. Zacarias
Bairros afetados
Muitas das pessoas que ficaram sem casas vêm dos bairros Francisco Manyanga, Filipe Magaia, Samora Machel, Mpádue e Chingodzi, afetados pelas cheias. O Governo provincial e o INGC estão a analisar as condições de segurança no terreno.
Foto: DW/A. Zacarias
Realojamentos?
Richard Baulene, porta-voz do Governo provincial de Tete, diz que as autoridades estão a investigar os pedidos de várias famílias para serem realojadas noutros locais. "Terá que se estudar qual o tratamento a dar às pessoas que vivem nas zonas que forem declaradas propensas a inundações", diz. No terreno, as equipas do Governo continuam à procura de desaparecidos.
Foto: DW/A. Zacarias
Grandes prejuízos
Vários habitantes tentam recuperar alguns dos seus pertences. Assifa Pedro é uma mãe de 35 anos que a DW África encontrou no bairro Chingodzi, em Tete, a tentar recuperar cadeiras que perdeu com as enxurradas. Os prejuízos são muitos. "Não tem uma casa que não caiu. Toda a roupa, o congelador, foi embora… Eu estava a dormir e ouvi água. E consegui tirar as crianças."
Foto: DW/A. Zacarias
Enxurradas incomuns
Artur Chipenhu tenta recuperar as chapas da sua casa, que saíram do lugar com as chuvas. Vários habitantes dizem que não se lembram de enxurradas como estas, nesta zona. Além das casas destruídas, a ponte sobre o rio Rovubué, que separa a cidade de Tete e a vila de Moatize, também ficou danificada.
Foto: DW/A. Zacarias
Ponte interditada a veículos
Na ponte, a circulação de veículos foi interditada. Um dos tabuleiros saiu do lugar. Por enquanto, não se sabe quando os automóveis poderão voltar a circular. A alternativa é a segunda ponte sobre o rio Zambeze (Kassuende). Aqui, no rio Rovubué, os transportadores semicoletivos estão a levar os passageiros até à ponte e estes atravessam-na a pé, apanhando transporte na outra margem.
Foto: DW/A. Zacarias
Mais desalojados
Depois da cidade de Tete e do distrito de Moatize, as cheias atingiram os distritos de Doa e Mutarara. Em Doa, já há registo de mais de 1.400 famílias afetadas e 1 morte. O Instituto Nacional de Gestão de Calamidades Naturais (INGC) garante estar a monitorar a situação.