Falta clareza na interpretação da lei relativa às eleições intercalares. Embora o Governo tenha a última palavra sobre a sua realização, a forma como for entendida a Lei 15/2007 pode ser determinante.
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O ponto cinco do Artigo 60 da Lei 15/2007 diz que não se realizam eleições intercalares se o prazo para a conclusão do mandato for igual ou inferior a doze meses. O edil de Nampula, Mahamudo Amurane, recorde-se, foi assassinado no dia 4 de outubro deste ano e as próximas eleições autárquicas estão marcadas para 10 de outubro de 2018.
Então, realizam-se as intercalares? Silvestre Baessa, especialista em boa governação, não está muito convencido: "Acho que a lei tem alguns detalhes que saltam a nossa vista, e um deles é quando é que a Assembleia Municipal declara o impedimento do presidente do Conselho Municipal. Seja impedimento por doença ou morte. E tudo indica que a reunião da Assembleia que assim decidiu realizou-se semana passada. Pelo que eu percebo não é quando ele morre efetivamente, mas quando a Assembleia confirma esse impedimento. E se essa interpretação for correta, então não teremos as intercalares."
A confirmar-se, então torna-se inválida a aplicação do ponto dois do artigo 60, que prevê que o órgão competente deve marcar eleições 30 dias a contar do dia da declaração de impedimento permanente. No caso o impedimento é a morte do edil.
Mesmo assim o Governo já marcou a sua declaração sobre o tema, respeitando a Lei. E ainda sobre o ponto cinco, até para especialistas em matéria de lei falta clareza. Como é o caso de Guilherme Mbilana, docente de Direito eleitoral e contencioso eleitoral.
O especialista diz que "a própria Lei não está clara se a declaração [de impedimento] é feita a partir do dia da declaração de óbito. E estive com pessoas de órgãos eleitorais que também tinham esta dúvida. Então, a CNE vai propor que haja eleições intercalares e caberá ao Governo decidir. Mas em termos de Lei penso que o impedimento do edil de Nampula conta a partir da declaração de óbito."
Fatores que podem impedir a realização das intercalares
O timing entre o assassinato de Mahamudo Amurane e a data de realização das autárquicas em 2018 leva a suspeitar que o assassinato foi bem calculado, justamente para que as intercalares não aconteçam.
Relacionadas a essa hipótese Silvestre Baessa acrescenta ainda: "Sim, tudo indica que sim. Mas depois há outras questões que podemos colocar: a quem iria beneficiar uma situação de eleições intercalares neste momento? Eu acho que não beneficiaria nem ao MDM nem ao partido FRELIMO, porque a opinião do eleitorado de Nampula neste momento divide-se quando se procura apurar as responsabilidades na morte de Amurane."
E a decisão do Governo não depende unicamente da Lei, mas também de outros dois ou três fatores, considera ainda o especialista em boa governação: "Um: é toda a capacidade de organização logística, sobretudo num contexto de crise financeira que o país está a viver. Será que o país está em condições de seguir plenamente a Lei? Dois: em 45 dias, que é o período de preparação das eleições estariam esses partidos, inclusive a RENAMO, preparados para apresentar um candidato que pudesse merecer a confiança do eleitorado?"
Já para Guilherme Mbilana não podem haver impedimentos para realização das intercalares. O especialista argumenta: "Não obstante o país não atravessar um bom momento de saúde financeira, económico e até mesmo político, a realização das eleições integra-se no sistema democrático que o país adotou. Então, para que se realizem, de facto, condições são necessárias para que as funções democráticas também estejam a gozar de boa saúde."
E o especialista em direito eleitoral é categórico: "Daí que se deve tudo fazer para que haja eleições. E penso que o país está em condições de realizar a eleição intercalar conforme dita a lei."
Moçambique: Eleições autárquicas de norte a sul
As eleições autárquicas em Moçambique tiveram lugar na quarta-feira (20.11). Em muitos lugares registou-se uma grande afluência às urnas e um ambiente calmo, apesar do clima de tensão político-militar vivido no país.
Foto: DW/ER. da Silva
Longas filas para votar
As eleições autárquicas em Moçambique tiveram lugar no dia 20 de novembro. Em muitos lugares registou-se uma grande afluência às urnas e um ambiente calmo, apesar do clima de tensão político-militar vivido no país. Esta assembleia de voto na Gorongosa, no centro do país, é o exemplo mais marcante. Pois, foi neste município que a RENAMO teve a sua base, que foi tomada pelas forças governamentais.
Foto: Reuters
À espera desde a madrugada
Eleitores fazem fila para votar em assembleia de voto em Pemba, Cabo Delgado. Em muitos lugares, formaram-se filas antes das 05h00. Em todo o país, alguma lentidão e realização de campanha junto às filas são alguns dos incidentes registados. No escrutínio participam 18 partidos, grupos de cidadãos e associações, para a eleição de edis e membros das assembleias municipais.
Foto: DW/E. Silvestre
Identificação à entrada
Funcionário eleitoral confere listas à entrada de uma assembleia de voto em Maputo, a capital moçambicana. Em alguns locais, houve problemas nos livros de registo de algumas assembleias de voto, onde os números não correspondiam exactamente aos nomes das listas.
Foto: picture-alliance/dpa
CNE garante condições do sufrágio
Biombo com o símbolo da Comissão Nacional de Eleições (CNE) protege a privacidade dos eleitores nesta escola em Pemba, Cabo Delgado. De acordo com a CNE, a afluência da população às eleições municipais é "muito grande". Nas últimas eleições, em 2008, a taxa de abstenção foi de 53,6%. Na altura, participaram apenas 43 municípios. Este ano, as eleições abrangem mais dez municípios (um total de 53).
Foto: DW/E. Silvestre
Como votar?
Funcionário eleitoral mostra o boletim de voto a um eleitor numa assembleia, em Maputo. Na cidade de Nampula, registou-se uma irregularidade: Filomena Mutoropa, candidata a presidente do município pelo Partido Humanitário de Moçambique (PAHUMO), foi deixada de fora do boletim de voto.
Foto: picture-alliance/dpa
Guebuza vota e apela ao voto
Um dos primeiros votantes foi o Presidente da República de Moçambique. Armando Guebuza votou na escola secundária Josina Machel, no centro da capital moçambicana. Guebuza exortou todos os moçambicanos a votaram nas eleições municipais, apelando ao eleitorado para exercer o seu direito da "melhor forma". A FRELIMO, o partido do Governo de Guebuza, tem sido o partido dominante nos últimos pleitos.
Foto: picture-alliance/dpa
Oposição tenta aumentar número de autarquias
Nas últimas eleições de 2008, a FRELIMO ganhou 42 dos 43 municípios. O MDM – Movimento Democrático de Moçambique ganhou na cidade da Beira. Depois da renúncia do edil da cidade de Quelimane, houve eleições intercalares em 2011, que acabaram com a vitória de Manuel de Araújo do MDM (na foto). Ele conquistou a segunda autarquia para o MDM e tenta defender a sua maioria nas eleições de 2013.
Foto: picture-alliance/dpa
O receio de votar num dos bastiões da RENAMO
Um eleitor vota na Gorongosa, um dos focos de tensão da crise político-militar moçambicana. À tarde, homens armados, alegadamente da RENAMO, atacaram a vila de Gorongosa, em Sofala, centro de Moçambique, "sem criar distúrbios" aos eleitores, de acordo com uma fonte do governo. O receio de ir votar é significativo, nesta região que tem sido palco de confrontos entre FRELIMO e RENAMO.
Foto: Reuters
Fraca participação em Metangula
Secretária de uma mesa de voto em Metangula, na província do Niassa no norte de Moçambique, espera por eleitores à entrada da assembleia de voto. Nesta região a afluência às urnas era baixa depois do pico das primeiras horas da manhã. A maior parte das assembleias de voto estão vazias, chegando a registar-se períodos de 10 a 15 minutos sem que um eleitor apareça.
Foto: DW/E. Saul
Ambiente de calma um pouco por todo o país
Um eleitor posa para a fotografia numa assembleia de voto da capital moçambicana. O ambiente de tranquilidade contrasta com o atual clima de tensão político-militar que se vive em Moçambique. Estas são as quartas eleições do género na história do país, ensombradas pelo boicote da RENAMO, o principal partido da oposição em Moçambique.