Desde que o país adotou o multipartidarismo, em 1994, os períodos pré-eleitorais são caracterizados por conflitos armados. O Conselho de Religiões de Moçambique quer uma solução para o problema.
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Congregações religiosas moçambicanas unem-se para prevenir conflitos pré-eleitorais que têm estado a acontecer desde 1994, altura da implantação do multipartidarismo.
Os religiosos são a favor da reconciliação nacional em vez de pronunciamentos e atos belicistas que muitas vezes são característicos dos períodos pré e pós-eleitorais.
Há dias, Afonso Dhlakama, líder da Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), o principal partido da oposição, reiterou que o acordo de descentralização será já em março. Mas avisou que, case não se concretize, "não gostaria de ser chamado belicista".
Dhlakama fora das matas
Por isso mesmo, a presidente do Conselho de Religiões de Moçambique, Artimiza Franco, defende a saída de Dhlakama das matas da Gorongosa, em Sofala, centro de Moçambique. "Ele precisa sair das matas para fazermos uma reconciliação e bem feita", afirma.
Moçambique: Conselho de Religiões preocupado com conflitos
Afonso Dhlakama encontra-se nas matas de Gorongosa desde 2015 e reclama vitória nas eleições gerais desse ano.
Este ano, o país vai a votos em outubro para as municipais e em 2019 os moçambicanos vão escolher um novo Presidente da República e um novo Parlamento.
A oposição moçambicana tem acusado o partido no poder, a Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), de fraude, tanto antes como depois dos processos eleitorais, facto que provoca conflitos armados. "E se estes dois processos não forem bem geridos vamos outra vez cair em conflitos armados", avisa Artimisa Franco.
Bandidos vs religiosos no norte
A província de Cabo Delgado, no norte do país, tem sido alvo de ataques de homens armados. Os atacantes dizem ser religiosos, mas aos olhos do reverendo Albino Mussei, secretário-geral do Conselho de Religiões de Moçambique, a realidade é outra. "Os tais bandidos dizem-se religiosos muçulmanos. Entram nas mesquitas com sapatos, inaceitável na fé islâmica, levam consigo sacolas que só eles é que sabem explicar, matam e perseguem chés, destroem mesquistas e matam as forças de defesa e segurança. Esses são bandidos e não religiosos", sublinha.
Os religiosos querem uma paz efetiva. Para tal, Artimiza Franco, do Conselho de Religiões, anunciou a realização de uma cimeira no final deste mês na Beira, centro do país. Trata-se da cimeira de paz e reconciliação nacional que contará com a presença de peritos da União Africana (UA).
Segundo Franco, "a UA vai mandar um especialista em assuntos políticos e eleitorais. Ele vai ser orador de um dos temas na cimeira porque o nosso país tem andado num ciclo de guerra por causa das eleições."
Gonçalo Mabunda: a arte pacífica das armas
O artista moçambicano Gonçalo Mabunda transforma armas em objetos de arte para promover a paz no país. Mabunda recolhe as armas usadas em 16 anos de guerra civil para criar máscaras e cadeiras.
Foto: R. da Silva
Artista universal
Gonçalo Mabunda começou a trabalhar no meio artístico da capital moçambicana, Maputo em 1992. Na altura colaborava no Núcleo de Arte como assistente de galeria. Hoje expõe a sua arte em todo o mundo, tendo passado com as suas obras por cidades como Tóquio, Londres e Düsseldorf. Por onde passo,: “as pessoas quando vêem estes trabalhos ficam curiosas" e entusiasmadas, conta.
Foto: R. da Silva
Tronos irónicos
A oficina está cheia de restos de espingardas, AK-47, rockets e cadeiras feitas com recurso a estes artefatos. No seu site online, Mabunda diz que os tronos - uma das suas imagens de marca - funcionam como atributos do poder, símbolos tribais e peças tradicionais de arte étnica africana. São ainda um comentário irónico à experiência de violência que viveu em criança na guerra civil moçambicana.
Foto: R. da Silva
Recolha de material
Em 1995, o Conselho Cristão de Moçambique lançou o projecto "Transformar Armas em Enxadas". O projeto continua a ser um dos fornecedores do material de que o artista precisa para criar as suas peças. Mas hoje em dia, contou Mabunda à DW África "também consigo comprar artefactos de guerra já destruídos" na sucata.
Foto: R. da Silva
Arte com assistência
Gonçalo Mabunda precisa de assistentes para completar as suas obras. O material bélico desativado exige um tratamento especial para poder ser trabalhado artisticamente. Mabundo orienta os seus ajudantes. Mas acrescenta que também troca ideias com eles, criando uma obra conjunta. Algo que, na sua opinião, os políticos também deviam fazer.
Foto: R. da Silva
A cara da guerra
O artista conta que muitas pessoas ficam impressionadas com a capacidade de transformar em arte positiva material usado para semear a morte e a miséria. Como ainda acontece em Moçambique hoje. Mabunda não poupa críticas aos governantes: "Estamos perante uma situação em que apenas um grupinho de pessoas é que decide sobre como é que queremos viver.”
Foto: R. da Silva
A cara da guerra
A situação de conflito que o país atravessa novamente preocupa o artista: “Foram 16 anos de guerra e 22 de paz. Quem nasceu em 1992 vivia em liberdade. E agora nem sei explicar como voltámos a esta situação.” Talvez por isso as máscaras que produz com o material de guerra tenham um ar mais assustado do que assustador.
Foto: R. da Silva
As armas falam de paz
As armas também podem falar de paz. Pelo menos aquelas que passaram pelas mãos de Mabunda. As máscaras que cria exprimem o horror da matança. O percurso de Mabunda passou pela África do Sul, mais precisamente Durban, graças à ajuda do artista sul-africano, Andreies Botha. Aos 18 anos, Mabunda teve a possibilidade de ali fazer um curso de metal e bronze, como contou ao semanário português Expresso.
Foto: R. da Silva
Reconhecimento internacional
Nascido em 1975, Mabunda trabalha como artista a tempo inteiro desde 1997. Optando por reciclar material bélico criou um estilo muito próprio, hoje reconhecido em todo o mundo. Sobreposta à arte está a mensagem de promoção da paz, num país em que as armas que falam da guerra ainda não se calaram.