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Moçambique deve pagar ou não as dívidas ocultas?

30 de novembro de 2018

Em Berlim, analistas moçambicanos e alemães debateram alternativas para o pagamento da dívida. Grupo Moçambicano da Dívida (GMD) alerta para efeitos sociais "drásticos" do endividamento.

Diskussion Schuldenkrise Mosambik
Palestrantes durante o evento em Berlim Foto: DW/T. Mansani

Moçambique está a enfrentar efeitos drásticos da crise da dívida e quem está a arcar com os custos do endividamento é a população. Cortes no orçamento do Estado em gastos públicos estão a afetar áreas básicas. Diante deste cenário, analistas moçambicanos e alemães debateram nesta quinta-feira (29.11), na capital alemã, alternativas justas para o pagamento da dívida moçambicana.

Especialistas ouvidos pela DW África concordam que a alternativa viável, neste momento, é rejeitar as dívidas ocultas contraídas sem aval do Parlamento. Segundo Eufrigínia dos Reis Manoela, membro do Grupo Moçambicano da Dívida (GMD), a organização repudia "qualquer responsabilidade do Governo para o pagamento destas dívidas".

"O Governo está a tomar medidas de restrição muito severas, retirando subsídios sociais em todas as áreas básicas. Já retirou o subsídio do pão para o pobre, que está proibido de comer o pão. O transporte tinha subsídio, que já foi retirado. Está-se a atacar justamente aquelas áreas que dizem respeitos à sobrevivência mínima", disse a coordenadora do GMD.

Quais alternativas?

Kristina Rehbein, da organização alemã erlassjahr.de Foto: DW/Johannes Beck

Para Kristina Rehbein, membro da organização alemã erlassjahr.de, que reúne mais de 600 instituições políticas, religiosas e da sociedade civil alemã, as dívidas moçambicanas devem ser rejeitadas sob o argumento de que foram contraídas ilegalmente.

"É possível rejeitar estas dívidas de outra maneira: considerando-as ilegítimas. Primeiro, porque os créditos não beneficiam a sociedade civil. Segundo, porque elas também não foram obtidas democraticamente, com aval do Parlamento ou da população".

Dados apresentados pelo GMD durante o evento em Berlim apontam que a dívida pública externa total de Moçambique cresceu exponencialmente entre 2014 e 2017. E a situação agravou-se com as dívidas ocultas, considera o GMD. "Neste momento, o endividamento do país é impagável. Nem que a gente produza daqui a dez, vinte ou trinta anos. É impagável, a situação está muito crítica", acrescentou a coordenadora do GMD.

Por outro lado, Eufrigínia dos Reis Manoela acredita que a alternativa de indexar receitas do gás para o pagamento da dívida, a partir de 2019, não servirá às necessidades básicas do país, que passará apenas a "exportar" as receitas. "Para nós, do ponto de vista económico e social, é um erro muito grande do Governo", explicou.

CreditSuisse e VTB Bank

Moçambique deve pagar ou não as dívidas ocultas?

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No âmbito da reestruturação da dívida da Empresa Moçambicana de Atum (EMATUM),  por exemplo, o Estado moçambicano foi chamado a prestar contas por ter assumido a dívida da empresa, perante da incapacidade de ela a pagar.

O papel dos bancos CreditSuisse e VTB Bank, da Rússia, já foi questionado por terem concedido empréstimos sem terem a informação necessária sobre os riscos. Segundo Eufrigínia dos Reis Manoela, do GMD, é preciso mais colaboração internacional para também responsabilizar os bancos envolvidos."A investigação nestes países [onde estão os bancos] deve colaborar no sentido de fornecer a informação, para poderem também criminalizar".

Para a coordenadora do GMD, o Governo moçambicano já está a se abrir para investigações, "a Procuradoria-Geral da República é a instituição que pode, por direito, seguir os trâmites legais. Mas, neste momento, não pode agir sozinha porque precisa de informações de fora - dos países que têm esses bancos - e que, entretanto, não estão a colaborar".

Colaboração internacional

Público na sede do jornal alemão TAZ, em BerlimFoto: DW/T. Mansani

Eufrigínia dos Reis Manoela insiste na colaboração internacional para evitar que apenas a população moçambicana pague os custos do endividamento do país: "Esta é uma posição que neste momento está na mesa do conselho constitucional [do GMD]. Nós continuamos a fazer uma advocacia muito forte e esta é uma das razões pelas quais estou aqui, na Alemanha. Para buscar mais solidariedade internacional e para que os países onde estão estes bancos também sejam responsabilizados".

Além do GMD, participou do evento em Berlim o agrônomo moçambicano Felisberto Baûque, da organização ASDA. Ele chamou atenção para os efeitos negativos do endividamento de Moçambique para a agricultura e para o setor familiar, ao passo em que se reduzem investimentos internos para pagar os credores. "A dívida tem um efeito bastante forte no setor produtivo e o setor familiar não dispõe de meios. Na situação em que o país está, a situação para a produção torna-se ainda mais grave", explicou.

"O setor familiar carece de insumos agrícolas. Ressalte-se que as famílias já não têm capital para comprar, por exemplo, fertilizantes e pesticidas. E ainda há a dificuldade de obter tecnologias. As condições impostas para aquisição de créditos são insustentáveis para o setor familiar", acrescentou o agrônomo.

O evento "Crise da Dívida em Moçambique: Desenvolvimento precisa de alívio da dívida - como criar iniciativas solidárias?" aconteceu na sede do periódico alemão TAZ. Foi uma cooperação das organizações alemãs Solidaritätsdienst International (SODI), erlassjahr.de e Fundação Rosa Luxemburgo, com o apoio financeiro da União Europeia.

 

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