Movimento de Educação para Todos aplaude a medida adotada pelo Ministério da Educação moçambicano, que quer manter as crianças por mais tempo na escola. Até agora, o ensino básico só ia até à 7ª classe.
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O ensino básico em Moçambique será alargado da 7ª para a 9ª classe. O objetivo, de acordo com o Ministério da Educação, é reter as crianças por mais tempo na escola para que possam assimilar mais conhecimentos. Por outro lado, a instituição diz que o novo modelo visa harmonizar a política educativa do país com as práticas internacionais.
A DW África conversou com Sarmento Preço, do Movimento de Educação para Todos (MEPT), uma plataforma que congrega várias organizações não-governamentais (ONG) que trabalham na área da educação em Moçambique. Para Sarmento Preço, o alargamento do ensino básico é a "solução ideal" no atual contexto económico do país.
Moçambique: Escolaridade obrigatória alargada para 9ª classe
DW África: Esta medida é suficiente para reter as crianças na escola?
Sarmento Preço (SP): Acho que é a solução ideal, por enquanto, porque o que acontecia era que o nosso ensino primário, que era, neste caso, o básico, terminava na 7ª classe. Olhando para o nível de entrada, no qual a criança entra na escola aos seis anos, vai concluir o nível de seis classes aos 12 anos. Ainda é uma criança pequena, que praticamente não pode seguir para o ensino profissional. Então, com essa ideia, se a criança frequentar o ensino secundário do primeiro ciclo que é a 7ª, 8ª e 9ª, dali já pode ir ao ensino profissional. É certo que o nosso país ainda não tem o ensino secundário em todas as zonas, mas esta é uma questão que tem de se discutir.
DW África: Outra justificação do Ministério da Educação para optar por este modelo é estar harmonizado com as práticas internacionais. Entretanto, as realidades são completamente diferentes. É válido este argumento de harmonização?
SP: Ao nível internacional, o que eu conheço em poucos países é que a 10ª classe, que é o ensino secundário do primeiro ciclo, é que tem sido o nível básico. Por isso é que se optou pela 10ª classe, não no ensino primário, mas no ensino secundário do primeiro ciclo. É certo que em alguns países o ensino básico é a 12ª classe, mas olhando para a situação económica do país - porque também para alimentar o ensino básico do ensino secundário da 7ª à 9ª classe não será fácil - seria difícil apostar que o ensino básico seja até à 12ª classe.
DW África: Outro problema preocupante em Moçambique é a fraca qualidade do ensino, que passa também pela fraca formação dos professores. Como acha que este problema deve ser resolvido?
SP: Temos problemas de qualidade, há estudos feitos em 2013 que demonstram isto. Numa média de 100 crianças, as que sabiam ler e escrever somavam pouco mais de 6%. E os estudos de 2016 até baixavam esta média para algo em torno de 4%. Mas não atribuo isto só à questão da qualidade da formação dos professores. Há muitas situações que podem ditar essa má qualidade. Estamos a falar de turmas com uma média de 70 a 80 alunos, por exemplo. O professor dificilmente pode gerir isto. Estamos a falar também das próprias infraestruturas, que é outro problema. Esta baixa qualidade [da educação] não se resume só à qualidade da formação de professores, mas está envolta à situação do próprio país: a pobreza, turmas superlotadas, temos crianças a estudar no chão, temos outras até que não têm salas de aula.
DW África: Os deputados exigiram que o ensino pré-escolar fosse obrigatório. Entretanto, o Governo rejeitou esta proposta, justificando que os seus custos seriam altos. É tão fundamental assim o ensino pré-primário?
SP: O ensino pré-primário é muito fundamental. As crianças, antes de entrar na escola, deveriam passar por este ensino. Temos bons exemplos disto, de que as crianças que passam pelas creches, escolinhas, têm um melhor resultado na 1ª classe [do ensino básico]. Mas, na verdade, na realidade atual, o que estamos a acompanhar é que até as escolinhas, onde estudam as crianças com idade antes do ensino "normal", de facto, são um pouco onerosas.
Ajudando a vestir os pequenos em África
Em Portugal, a ONG "Little Dresses for Africa" confeciona roupas para crianças carenciadas de diversos países africanos. Meninos e meninas de Moçambique, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe estão entre os beneficiados.
Foto: LDFA Portugal
Roupa para os mais carenciados
A "Little Dresses for Africa" (LDFA) tem dado cor à vida dos meninos e meninas mais necessitados do continente. Desde 2007, esta organização humanitária com sede nos Estados Unidos junta voluntários em diversos países do mundo que confecionam peças de roupa destinadas a crianças carenciadas em países como Moçambique. Estas meninas da aldeia de Ndivinduane foram vestidas pela LDFA Portugal.
Foto: LDFA Portugal
Os meninos da aldeia de Kibera
Nascida no início de 2016, a delegação LDFA Portugal lançou-se ao trabalho e em três meses enviou mais de 500 peças para vários países africanos. Quénia foi o primeiro a receber ajuda, particularmente as crianças mais pobres de Kibera, a maior favela de África. Aqui, brincam ao lado de um verdadeiro esgoto a céu aberto e depósito de lixo.
Foto: LDFA Portugal
O valor simbólico das roupas
Embora a roupa seja um bem muito necessário, o vestido é muito mais que isso na vida destas crianças apoiadas pelo projeto português. As roupas transportam carinho e esperança, proporcionam autoestima e valorização, sabendo-se que, nestas comunidades, sobretudo as meninas são muito penalizadas por serem vítimas de abusos, gravidezes precoces e abandono escolar.
Foto: LDFA Portugal
O rosto da missão humanitária
Lisa Santos apaixonou-se pelo projeto e decidiu dar a cara por esta causa humanitária, ao criar a LDFA Portugal. A equipa dirigida por esta professora de piano, nascida em Moçambique, ascende a cerca de 150 pessoas. São todas voluntárias, dedicadas a fazer a diferença na vida das crianças fragilizadas, muitas vezes em situação de extrema carência.
Foto: DW/J. Carlos
Identificar necessidades
Antes, a equipa trata de identificar potenciais beneficiários, através de outros projetos que trabalham com crianças, nomeadamente orfanatos, infantários e escolas comunitárias. Ou através de contatos e de missões em Portugal que partem para África com o objetivo de ajudar os menores mais carenciados das aldeias locais.
Foto: LDFA Portugal
Uma roupa para toda a semana
Apesar de ser um país de desenvolvimento médio, Cabo Verde também beneficia da ajuda da LDFA Portugal. "O que é certo é que há muita pobreza escondida", diz Lisa Santos, que visitou vários infantários na Páscoa deste ano (2017). Entre outros exemplos de carência, aponta casos de crianças que usavam a mesma peça de roupa durante a semana "porque não havia mais nada para vestir".
Foto: LDFA Portugal
Comunicar para mobilizar donativos
É preciso sensibilizar as comunidades e envolver a sociedade, usando para isso os meios de comunicação e as redes sociais. Uma das dificuldades é conseguir donativos suficientes para suportar as operações. "Todas as doações são benvindas", afirma a mentora do projeto. "Muitas vezes somos nós, eu e as voluntárias costureiras, a comportar essa parte das despesas".
Foto: LDFA Portugal
Jantar solidário
Através da página no Facebook, há pessoas que se identificam com a causa e doam materiais para confecionar os vestidos. O grupo promove outras iniciativas, como o segundo jantar solidário realizado em meados de novembro (2017), cujo objetivo foi angariar fundos para apoiar a construção de 12 escolas e 12 poços de água em 12 vilas africanas.
Foto: LDFA Portugal
Oficinas de costura
As peças são confecionadas por voluntárias em oficinas de costura da LDFA Portugal e, nalguns casos, em casa em diversos pontos do país. "Temos um grupo residente que oferece mão de obra". O projeto dispõe os moldes e, seguindo os conhecimentos necessários, elas produzem as roupas simples, que nada têm a ver com a alta costura.
Foto: LDFA Portugal
Mais logística para envio de roupa
Além do Quénia, Gana, Moçambique, Guiné-Bissau e Cabo Verde, outro país beneficiado é São Tomé e Príncipe. Na foto, meninos do arquipélago vestem calções da ONG. As peças foram enviadas em contentor, juntamente com brinquedos, materiais escolares, medicamentos e calçados. "Há uma série de bens em falta e não conseguimos fazer mais envios de bens por razões logísticas", explica Lisa Santos.
Foto: LDFA Portugal
Aberto a novos projetos
A próxima missão, em agenda, voltará possivelmente a Moçambique, para um projeto que dá especial apoio a meninas. As crianças das aldeias de Boane e Ndivinduane foram as que receberam roupas anteriormente. "Estamos continuamente em produção e à procura de novos projetos para apoiar, desde que tenhamos intermediários", avisa a dirigente da LDFA Portugal.