Vice-ministro da Defesa Nacional de Moçambique, Patrício José, disse em Maputo que as Forças Armadas de Defesa de Moçambique estão preparadas para cumprir um eventual acordo político sobre a reestruturação do exército.
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O Governo moçambicano e a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO) estão a negociar a integração de oficiais da guerrilha do principal partido da oposição em posições de comando nas Forças Armadas de Defesa de Moçambique (FADM), polícia e serviços de informação, no âmbito dos esforços de busca da paz. "As FADM não acomodam ninguém, mas cumprem e estão preparadas para cumprir ordens do seu Comandante em Chefe [o chefe de Estado]", afirmou esta sexta-feira (16.03) na capital moçambicana Patrício José, Vice-ministro da Defesa Nacional de Moçambique.
Caso o chefe de Estado, Filipe Nyusi, chegue a acordo com o líder da RENAMO, Afonso Dhlakama, sobre um novo formato nas FADM, a instituição está apta a seguir tal entendimento, prosseguiu Patrício José.
O vice-ministro da Defesa Nacional avançou que o país deve ter a capacidade de antecipar focos de instabilidade militar como forma de evitar futuros conflitos. "Estamos a eliminar [os fatores de violência militar], mas precisamos de aprimorar a formação e capacidade de antever os focos de conflito", assinalou Patrício José.Apesar de o Governo da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) e a RENAMO terem assinado em 1992 o Acordo Geral de Paz, o país viveu ciclos de violência militar, provocado por litígios eleitorais.
Descentralização do país
Recorde-se que o Presidente moçambicano submeteu no passado mês de fevereiro uma proposta de revisão pontual da Constituição da República que aprofunda a descentralização do país, na sequência de um entendimento com o líder da Renamo, no quadro das negociações para uma paz duradoura.
A paz "não virá unicamente do pacote de descentralização. Depende do empenho de todos e de outros fatores relacionados", acrescentou na altura o chefe de Estado moçambicano.
Os consensos têm sido também alcançados na comissão de assuntos militares, nomeadamente "quanto ao desarmamento, desmobilização e reintegração dos efetivos da RENAMO", cujo anúncio foi remetido para breve.
Governo aponta pobreza como ameaça à segurança nacional
Patrício José, apontou a pobreza e as assimetrias regionais como grandes ameaças à segurança nacional. "No nosso [de Moçambique] caso concreto, a primeira e maior ameaça é de cariz económico e social e as assimetrias regionais, sobretudo ao nível de infraestruturas, e tudo isso se traduz em pobreza", disse o vice-ministro da Defesa Nacional.Segundo o governante moçambicano a pobreza manifesta-se na privação da maioria da população de bens essenciais como a alimentação, gerando focos de instabilidade política e social.
Patrício José assinalou que a falta de acesso à educação e saúde e o alastramento de doenças endémicas, como a SIDA e tuberculose, também expõem o país a vulnerabilidades. As mudanças ambientais, prosseguiu, colocam desafios à segurança nacional, pois as cheias e seca agravam a pobreza, levando muitas comunidades ao desespero.
"As cheias e seca prolongada vão agravar a situação de pobreza e essas ameaças conjugadas põem em perigo a estabilidade do nosso Estado", afirmou. O país também deve estar preparado para enfrentar a pirataria, devido à sua imensa costa, e as ameaças cibernéticas, acrescentou.
Em declarações aos jornalistas, à margem da abertura do ano letivo no Instituto Superior de Estudos de Defesa (ISEDEF), o vice-ministro da Defesa Nacional assinalou que o país deve aprimorar a sua prontidão contra as ameaças à segurança nacional, considerando complexos os desafios da Defesa. "Claro que estamos preparados [para garantir a segurança nacional], a prova disso é que em mais de 40 anos de independência, Moçambique não perdeu um centímetro do seu território", concluiu.
Moçambique: Guerra civil com pausas de paz
A paz nunca foi uma certeza em Moçambique. Ela apenas tem intercalado confrontos militares desde a independência. Acordos de paz mal concebidos parecem estar na origem dos conflitos. Mas há novos bons sinais à vista.
Foto: Presidencia da Republica de Mocambique
O começo da guerra civil
A guerra entre o Governo da FRELIMO e a RENAMO começou em 1977, isso cerca de dois anos após a proclamação da independência do país. A RENAMO contestava a governação da FRELIMo e queria democracia. Este movimento tinha o apoio da ex-Rodésia e da África do Sul, dois vizinhos de Moçambique. A guerra matou milhões de moçambicanos e quase paralisou a economia do país.
Acabar com a guerra era o obetivo deste acordo, alcançado em 1984. Foi assinado entre os antigos Presidentes de Moçambique e da África do Sul, Samora Machel e Peter Botha, respetivamente. Ficou acordado que Pretória deixava de apoiar a RENAMO e Maputo parava o apoio ao ANC. Este último que lutava contra o Apartheid. Mas ninguém respeitou o acordo.
Foto: Avant Verlag/Birgit Weyhe
Acordo Geral de Paz de Roma
Colocou finalmente fim a guerra em 1992. Foi patrocinado pela Comunidade Santo Egídio, instituição católica italiana. Nessa altura o país já estava devastado e tinha transitado do sistema socialista para o da economia de mercado. Afosno Dhlakama, líder da RENAMO, e Joaquim Chissano, ex-Presidene de Moçambique, assinaram um acordo que pôs fim a uma guerra de 16 anos.
Eleições: nova era de desentendimentos
Em 1994 o país dava os seus primeiros passos rumo a democracia: início do multipartidarismo e realização das primeiras eleições, patrocinadas pela ONU. O primeiro Presidente eleito do país foi Joaquim Chissano. A RENAMO contestou, mas acabou por aceitar os resultados eleitorais.
Foto: Getty Images/AFP/Gianluigi Guercia
Eleições 1999: RENAMO revolta-se
Nas segundas eleições, em 1999, Joaquim Chissano e a FRELIMO voltaram a ganhar. Mas o processo foi novamente marcado por graves irregularidades, a RENAMO diz que houve fraude e contestou com mais veemência. E no ano 2000 apoiantes da RENAMO manifestaram-se em Montepuez província de Cabo Delgado, contra os resultados. Cerca de 700 manifestantes terão sido detidos e mortos por asfixia nas celas.
Foto: Marc Dietrich-Fotolia.com
Rastilho para o barril de pólvora já arde
As sucessivas irregularidades nas eleições, a lei eleitoral desajustada e difícil integração dos ex-guerrilheiros da RENAMO no exército nacional foram os principais pontos que aumentaram a tensão com o Governo. A falta de confiança que caracteriza a relação entre as partes aumentou.
Foto: Gerald Henzinger
As armas falam novamente
Em 2013 a polícia e homens da RENAMO confrontaram-se. Era o início dos conflitos armados. Nesse ano a RENAMO recusa a aprovação da Lei Eleitoral e não participa nas autárquicas. Há um interregno no conflito para a realização de eleições gerais em 2014. A RENAMO perde e acusa a FRELIMO de fraude. O país volta a ser palco de guerra. RENAMO exige governar as seis províncias onde diz ter ganho.
Foto: Fernando Veloso
Guebuza e Dhlakama: o braço de ferro até ao fim
Em setembro de 2014 o Presidente Armando Guebuza e o líder da RENAMO chegam a acordo para por fim ao conflito armado. Abriu-se assim caminho para as eleições gerais, onde a RENAMO participou. Mas as negociações entre os dois homens nunca foram fáceis. Para começar os encontros foram poucos.
Foto: Jinty Jackson/AFP/Getty Images
Na guerra vale tudo
Em Setembro de 2015 Dhlakama sofreu dois atentados. Um deles contra a coluna em que viajava, de Manica a Nampula. Afonso Dhlakama saiu ileso, mas segundo relatos morreram várias pessoas. Mais tarde várias viaturas da comitiva do líder da RENAMO foram queimadas. Dhlakama acusou a FRELIMO pelos atentados.
Foto: DW/A. Sebastião
Cerco a casa de Afonso Dhlakama
Em outubro de 2015 a guarda pessoal do líder da RENAMO foi desarmada pelas forças governamentais durante um cerco à sua residência na cidade da Beira. O Governo pretendia um desarmamento forçado dos homens da RENAMO. O desarmamento da maior força da oposição é um dos pontos controversos nas negociações de paz.
Foto: picture-alliance/dpa/A. Catueira
Diálogo de paz pouco frutífero
Infindáveis rondas marcaram as negociações de paz. E em paralelo as armas falavam nas matas, membros da RENAMO eram assassinados a média de um por mês em 2016. Observadores e mediadores, nacionais e internacionais, entraram e saíram do barulho sem conseguir muito. Houve também adiamentos de rondas e algumas pausas no processo.
Foto: Leonel Matias
Dhlakama e Nyusi: maior proximidade, bons sinais
Em agosto de 2017 o Presidente Nyusi deslocou-se à Gorongosa, bastião da RENAMO, para se encontrar com Dhlakama. Os dois líderes acordaram sobre os próximos passos no processo de paz. Esperavam um acordo de paz até ao final de 2017, mas tal não deverá acontecer. Entretanto, Dhlakama está satisfeito com o andamento das negociações. O sigilo entre os dois parece ser o segredo de um bom entendimento.