Ex-guerrilheiros da RENAMO sem subsídios há três meses
Arcénio Sebastião (Beira)
10 de junho de 2021
Há três meses que 400 guerrilheiros desmobilizados da RENAMO não recebem subsídios, denuncia o líder do maior partido da oposição. Ossufo Momade espera que a situação possa ser resolvida em breve.
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Os antigos militares da Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO) passaram à vida civil em meados do ano passado, vindos das bases de Savane e Muxúngue na província de Sofala. Há três meses que não estão a receber subsídios, segundo o presidente da RENAMO, Ossufo Momade. Embora se diga preocupado com a situação, Momade adianta: "Dentro de dias vão ter os seus salários em dia. É um processo. Tivemos este problema, mas vai ser resolvido".
Os ex-combatentes recusaram prestar declarações à reportagem da DW África por não terem autorização do partido para falar sobre o assunto. Sublinharam apenas que estão descontentes com o não pagamento dos subsídios e pediram uma intervenção urgente do Governo e do partido RENAMO.
Segundo o Governo, o atraso nos pagamentos terá sido por falta de fundos. Mas o problema já foi ultrapassado, assegurou Ossufo Momade na quarta-feira (09.06). "Neste momento já se reuniu os fundos e o próprio processo de DDR vai continuar, para que possamos alcançar outras bases."
Atrasos na execução do DDR
O processo de DDR prevê desarmar, desmobilizar e reintegrar na sociedade perto de 5.200 ex-combatentes da RENAMO, que por vários anos lutaram contra o Governo central. Até ao momento, foram abrangidos perto de mil e trezentos homens armados do partido.
O embaixador da União Europeia em Moçambique, António Gaspar, acredita que o DDR deverá terminar no mais tardar até ao final do próximo ano, mais de um ano depois do prazo estipulado.
Para Nelson Moda, da Comunidade de Sant’Egidio, o atraso é normal.
"Estipular um prazo para um processo de DDR como este pode ser um desejo. Mas em todo os processos como estes, os prazos muitas vezes não se coadunam com a praticidade."
Moçambique sem armas
Acerca do não pagamento de subsídios aos perto de 400 guerrilheiros da RENAMO desmobilizados, Nelson Moda considera que se trata de uma "dinâmica" decorrente "do tempo que o processo leva"
Em declarações à DW África, Moda sublinha que é do interesse de todos os moçambicanos que o DDR seja levado a bom termo: "É preciso continuarmos a encorajar este processo, quer os financiadores, para continuarem a ter a confiança e a investir no processo, quer os homens que estão desmobilizados, para poderem encorajar os outros a aderirem ao processo. Nós gostaríamos de construir um Moçambique livre das armas."
Afonso Dhlakama, homem de causas
O percurso de Afonso Dhlakama enquanto político e militar quase se confunde com a história de Moçambique independente. Em nome da democracia não hesitou em entrar numa guerra. Herói para uns, vilão para outros.
Foto: picture-alliance/dpa
Dhlakama, um começo na FRELIMO que não vingou
Afonso Macacho Marceta Dhlakama nasceu a 1 de janeiro de 1953 em Mangunde, povíncia central de Sofala, Moçambique. Entra para a FRELIMO perto da época da independência em 1975, mas não fica muito tempo. Em 1976 sai do partido que governa o país para co-fundar a RNM (Resistência Nacional de Moçambique), um movimento armado, com o apoio da Rodésia do Zimbabué. O objetivo: por fim a ditadura.
Foto: Imago/photothek
Dhlakama: Desde cedo líder da RENAMO
A guerra civil entre a RNM, depois denominada RENAMO, Resistência Nacional de Moçambique, e o Governo começou em 1976. Dhlakama assume a liderança da RNM depois da morte de André Matsangaíssa em combate em 1979. Já era líder quando o primeiro acordo que visava por fim a guerra foi assinado entre o Governo e o regime do apartheid na África do Sul em 1984. Mas o Acordo de Inkomati fracassou.
Foto: Jinty Jackson/AFP/Getty Images
AGP: Democracia entra no vocabulário com Dhlakama
Depois de 16 anos de guerra Dhlakama assina com o Governo o Acordo Geral de Paz de Roma em 1992 no contexto do fim da guerra fria e do apartheid na África do Sul. Começa uma nova era para o país, depois de uma guerra que fez perto de um milhão de mortos e milhões de refugiados. A democracia passa então a fazer parte do vocabulário dos moçambicanos, com Dhlakama a auto-intitular-se o seu pai.
Foto: picture-alliance/dpa
O começo das derrotas de Dhlakama nas eleições
Moçambique entra para a era do multipartidarismo e realiza as suas primeiras eleições em 1994. Dhlakama e o seu partido perdem as eleições. As segundas eleições acontecem em 1999 e Dhlakama volta a perder, mas rejeita a derrota. E desde então não parou de perder, facto que provocou descontentamento ao partido de Dhlakama. Reclamava de fraudes e injustiças. E nasceram assim as crises com o Governo.
Foto: Reuters/Grant Lee Neuenburg
Dhlakama: O regresso às matas como estratégia de pressão
O regresso do líder da RENAMO à Serra da Gorongosa em 2013, um dos seus bastiões militares, foi uma mensagem inequívoca ao Governo da FRELIMO. Dhlakama queria mudanças reais, que passavam pelo respeito integral do AGP, principalmente a integração dos militares da RENAMO no exército nacional, e mudança da legislação eleitoral. Assim o país voltou a guerra depois de mais de vinte anos.
Foto: Jinty Jackson/AFP/Getty Images
Armando Guebuza e Dhlakama em braço de ferro permanente
A 5 de agosto de 2014 o então Presidente Armando Guebuza e Afonso Dhlakama assinaram um cessar-fogo. Estavam criadas as condições para o líder da RENAMO participar nas eleições gerais de outubro de 2014. Dhlakama e o seu partido participam nas eleições e voltam a perder. As crise volta ao rubro e Dhlakama regressa às matas da Gorongosa.
Foto: Jinty Jackson/AFP/Getty Images
Emboscada contra Afonso Dhlakama
A 12 de setembro de 2015 a caravana em que seguia Afonso Dhlakama foi atacada na província de Manica. Ate hoje não se sabe quem foram os atacantes. A RENAMO considerou a emboscada como uma tentativa de assassinato do seu líder. A comunidade internacional condenou o uso da violência.
Foto: DW/A. Sebastião
Aperto ao cerco contra Afonso Dhlakama
No dia 9 de outubro de 2015, a polícia cercou e invadiu a casa de Afonso Dhlakama na cidade da Beira. As forças governamentais pretendiam desarmar a força a guarda do líder da RENAMO. Os homens da RENAMO que se encontravam no local foram detidos. A população da Beira, bastião da RENAMO, juntou-se diante da casa de Dhlakama manifestando o seu apoio ao líder.
Foto: picture-alliance/dpa/A. Catueira
Dhlakama e Nyusi: Menos mãos melhores resultados
O líder da RENAMO e o Presidente da República decidiram prescindir de mediadores e passaram a negociar o acordo pessoalmente. Desde então consensos têm sido alcançados, um deles relativo à revisão pontual da Constituição, no âmbito do processo de descentralização em fevereiro de 2018. A aprovação da proposta pelo Parlamento é urgente, pois as próximas eleições de 2018 e 2019 dependem dele.
Foto: Presidencia da Republica de Mocambique
Dhlakama: Não foi a bala que ditou o seu fim
Na manhã de 3 de maio o maior líder da oposição em Moçambique perdeu a vida vítima de doença. Deixa aos seus correlegionários a tarefa de negociar outro ponto controverso na crise com o Governo: a desmilitarização ou integração dos homens armados da RENAMO no exército nacional. Há quase 40 anos à frente da liderança da RENAMO teve de negociar com todos os Presidentes de Moçambique independente.