Ex-trabalhadores da Avicola esperam por salários há 30 anos
Sitoi Lutxeque (Nampula)
21 de dezembro de 2018
Será mais um Natal sem salários. 500 ex-trabalhadores da empresa estatal de criação de aves Avicola, na província moçambicana de Nampula, exigem pagamento de ordenados e indemnizações. A empresa foi privatizada em 1987.
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"Se fosse em Maputo, haviam de nos pagar. Se fosse em Inhambane, haviam de nos pagar", lamentam os antigos trabalhadores da empresa estatal de criação de aves Avicola, na província de Nampula, no norte de Moçambique.
Os ex-trabalhadores, na sua maioria idosos, dizem que o Governo decidiu privatizar a empresa em 1987, sem aviso prévio, por alegada incapacidade financeira. Mais de 30 anos depois, ainda aguardam pelo pagamento de salários em atraso e indemnizações. Começaram a protestar em 2006. Mas, desde o mês passado, cansados de promessas não cumpridas, decidiram levar os protestos, com tachos e panelas, para junto do edifício da Direção Provincial da Agricultura e Segurança Alimentar, instituição que tutelava a empresa.
Acusações de burla
Pereira Travessa, antigo trabalhador e porta-voz dos manifestantes, conta que já foram feitas várias tentativas, desde 2006, para o pagamento dos ordenados, mas os resultados são os mesmos: promessas que nunca são cumpridas.
"O próprio ministro da Agricultura fez duas [cartas com] assinaturas: a primeira que autorizava o pagamento foi em 2013, e já fizemos provas de vida e tudo; a segunda foi no ano passado, onde ele assinou, [ordenando] para se pagar aos que estão nesta situação da extinta empresa Avicola ", afirma em entrevista à DW África.
O porta-voz dos manifestantes assegura que a revindicação vai continuar, acusando o Estado moçambicano de burla.
"Sentimo-nos burlados, porque estamos há muito tempo a reivindicar. O despacho do senhor ministro da Agricultura foi em 2013 e, até agora, não se verifica nada. Já se fez um documento para o ministro das Finanças, em maio [do ano passado], e até hoje não estamos a ter nenhum dia marcado para o pagamento", diz Travessa.
Há trabalhadores que morreram sem sequer ter saboreado os seus ordenados. Inicialmente, os trabalhadores com salários em atraso e sem indemnizações eram mais de 600. Agora já só são 566.
"A demora é demais! Muitos acabam por morrer. Quem vai receber esse dinheiro?", questiona o porta-voz dos manifestantes "Estão à espera de todos nós morrermos, para ficarem com o dinheiro?"
Ex-trabalhadores da Avicola esperam por salários há 30 anos
Promessa do Governo
O Governo moçambicano, através do diretor provincial da Agricultura e Segurança Alimentar, Jaime Chissico, reconhece a situação, que não só afeta os antigos trabalhadores em Nampula, como em outras províncias do país, mas assegura que o Executivo vai pagar e está a trabalhar para o efeito. No entanto, não avança datas.
"Em devido momento, foi solicitado às pessoas para apresentar documentos. Isso é um sinal de que há preocupação por parte do Governo, no sentido de resolver a questão", afirma Chissico. "Nós dizíamos aos trabalhadores que, quando o dinheiro chegar a Nampula, não passarão mais de duas horas sem serem notificados. Ao invés de ficar aqui a tocar latas e a perturbar a ordem do funcionamento - não negamos que eles tenham o direito de se manifestar - mas poderiam estar envolvidos noutras atividades."
Além dos trabalhadores da extinta Avicola, o Ministério da Agricultura e Segurança Alimentar diz que deve dinheiro a trabalhadores de outras três empresas já extintas - ao todo, estima-se que há mais de 1500 trabalhadores com salários em atraso.
Produção de chá em Gurué
As maiores plantações de chá de Moçambique localizam-se em Gurué. Para muitos, apesar da baixa remuneração desta atividade, é a única hipótese de terem um trabalho para sustentar a família.
Foto: DW/M. Mueia
Colheita matutina inicia o processo
A colheita de folhas de chá é feita pela madrugada, entre as 4 e as 7 horas. Depois, as folhas seguem para a fábrica, onde serão colocadas em máquinas para a secagem, antes de serem trituradas e transformadas em cascas de chá - o produto final. Diariamente, os trabalhadores têm a meta de colher quantidades de folhas equivalentes a 50 quilos. Se não conseguirem, o salário será ainda mais “magro”.
Foto: DW/M. Mueia
Clima favorável
Devido à zona montanhosa, as temperaturas ficam abaixo dos 20 graus em Gurué. No período de inverno, entre maio e junho, as plantas de chá produzem menos folhas. Em consequência, há menos mão-de-obra sazonal a produção é menor, segundo os gestores e especialistas desta cultura.
Foto: DW/M. Mueia
Baixa remuneração
A maior parte da mão-de-obra contratada para a colheita de folhas de chá é composta por pessoas mais velhas. Os jovens não abraçam a atividade devido aos salários que não são sustentáveis. Em média, o salário diário varia entre 100 a 120 meticais (cerca de 1,50€), dependendo do esforço individual - quem colher mais quantidade recebe mais.
Foto: DW/M. Mueia
Chazeiras de Moçambique - Gurué
A fábrica tem a capacidade industrial de 50 toneladas de folhas verde de chá, equivalente a 10 toneladas de chá ensacado. Entre principais mercados de exportação estão o Dubai, a Alemanha, a Polónia, os Estados Unidos e Índia. A empresa tem 200 trabalhadores efetivos e 2000 trabalhadores locais sazonais.
Foto: DW/M. Mueia
Segurança no trabalho
A segurança é rigorosa na fábrica, para operários e visitas. As medidas de precaução estão escritas na porta principal da indústria e nas paredes que dão acesso direto às máquinas de processamento do chá.
Foto: DW/M. Mueia
Colher chá: opção de recurso
Baptista Alexandre Ricardo, de 55 anos. Trabalha na colheita de folhas de chá há quinze anos. É o trabalhador sazonal com mais tempo de casa na empresa "Chazeiras de Gurué". Para ele, foi a alternativa possível. Quando era jovem, sonhava com um bom emprego, que nunca conseguiu. Como alternativa, acabou por ir para a fábrica onde se habituou à atividade que exerce há mais de uma década.
Foto: DW/M. Mueia
Várias empresas chazeiras
A Sociedade de Desenvolvimento da Zambézia é uma das companhias produtoras de chá. Localiza-se no Bairro Murece, nome derivado da cadeia montanhosa que está nas imediações. A companhia produz, processa e exporta o chá. Um dos países para onde exporta é o Quénia. A nível nacional, o chá desta companhia é mais consumido na província de Sofala, Manica e na cidade de Quelimane.
Foto: DW/M. Mueia
Sacrifícios pela família
Galhardo Gemusse (esquerda) e Estefânio Janeiro (direita), são dois companheiros incansáveis. Caminham até ao depositário das folhas do chá. Trabalham na colheita do chá há 7 anos, para poderem sustentar as famílias. Desesperado com a vida económica e profissional, Estefânio, de 24 anos, não teve muita escolha. Casou-se cedo e tem uma família para cuidar.
Foto: DW/M. Mueia
Lenha é essencial na secagem das folhas
Além da energia elétrica, a lenha é fundamental para a preparação das folhas verdes de chá. Os troncos das árvores são postos em fogueiras, para secagem das folhas. Nesta área, os trabalhadores, na sua maioria, são jovens. A sua função é carregar manualmente os troncos até à fogueira. Este setor funciona 24 horas por dia, em turnos rotativos.
Foto: DW/M. Mueia
Faltam oportunidades para mulheres em Gurué
Alura Jorge é uma das poucas mulheres sazonais na colheita na companhia Chazeiras de Moçambique. Está há um mês neste trabalho. Segundo explica, a Cidade de Gurué é desprovida de oportunidades de empregos para mulheres solteiras.