Moçambique: Exploração de recursos gera aumento de violações
Sitoi Lutxeque (Nampula)
21 de abril de 2023
Aumenta a exploração dos recursos naturais, um pouco por todo o país, mas também cresce a onda de violações dos direitos humanos, segundo as organizações da sociedade civil. Governador de Nampula desconhece abusos.
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A sociedade civil denuncia o aumento de violações dos direitos humanos nas comunidades em que estão instaladas indústrias de exploração de recursos naturais. As organizações de defesa dos direitos humanos querem que as autoridades de Moçambique ponham fim a este cenário.
De acordo com Adriano Nuvunga, presidente da Rede Moçambicana dos Defensores dos Direitos Humanos e diretor do Centro para a Democracia e Desenvolvimento (CDD), as violações ocorrem em dois níveis: "O primeiro nível é a negação das comunidades no seu direito ao desenvolvimento e o segundo são os abusos e violações que envolvem ações até da polícia e dos meios securitários utilizados pelos mega-projetos que repelem as comunidades à força, incluindo naqueles casos onde as comunidades procuram fazer o garimpo ilegal", explica.
Sem citar casos concretos, Adriano Nuvunga refere ainda que "os defensores dos direitos humanos e líderes sociais" não escapam às violações. As pessoas que "procuram advogar pelos direitos das comunidades ao desenvolvimento junto das empresas nacionais e internacionais que exploram os recursos naturais são ameaçados, perseguidos e, nalguns casos, assassinados", denuncia.
Para acabar com essas situações, Nuvunga diz que "há necessidade de se fortalecer o poder judiciário para este continuar, e sem corrupção, a receber e a tratar com urgência os casos de abuso e violação dos direitos humanos, no contexto dos negócios [de exploração de recursos naturais] em Moçambique".
Autoridades desconhecem casos em Nampula
Na província e Nampula, há duas multinacionais que exploram áreas pesadas: a mineradora chinesa Haiyu Mozambique Mining, que se dedica à exploração de ilmenite e zircão em Angoche, e a irlandesa Kenmare, que explora areias pesadas em Larde e Moma. Esta última foi acusada de violações contra as comunidades locais no passado.
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Sobre as recentes denúncias, o governador de Nampula diz desconhecer casos de violação dos direitos humanos a nível das empresas que operam na província.
"Não tenho conhecimento da violação de quaisquer direitos humanos na nossa província de Nampula, portanto precisarei de me informar se este fenómeno ocorre", afirma. "Mas é de se condenar se é que de facto ocorre na nossa província. Os direitos humanos devem ser preservados e respeitados, aliás todo o cidadão quando nasce deve ser protegido. Caso haja, vamos trabalhar para combater de forma enérgica e punirmos os que estão a querer perpetuar este mal a nível da província", assegura o governador.
A Polícia de Nampula, através do porta-voz Zacarias Nacute, que não quis gravar entrevista, nega o envolvimento das autoridades em qualquer violação dos direitos humanos, sobretudo agressões às populações residentes nas imediações das empresas que exploram recursos naturais.
Faces de Tete e do carvão de Moçambique
A vida mudou na província de Tete desde a chegada de empresas multinacionais para explorarem o carvão. Os ventos da mudança trouxeram, para alguns, oportunidades para melhorar de vida; para outros, novas preocupações.
Foto: DW/Marta Barroso
Coque, o trabalhador
Coque tem 28 anos. Trabalha há quatro anos na empresa mineira britânica Beacon Hill. Lá, amarra lonas nos camiões que transportam o carvão até ao vizinho Malawi. Tal como muitos jovens na região, dantes Coque fabricava tijolos que vendia no mercado local. Mas hoje, diz, vive melhor. Por camião recebe 800 meticais, cerca de 20 euros, que divide com o colega que estiver com ele no turno.
Foto: Marta Barroso
Paulo, o diretor de operações da Vale
Apesar dos enormes incentivos fiscais de que gozam as empresas dos megaprojetos em Moçambique, como a brasileira Vale, Paulo Horta diz que um projeto de mineração como o de Moatize gera uma cadeia produtiva tão grande que a população local beneficia em grande medida com a sua vinda para Tete: através da criação de outras empresas, serviços, tributos gerados por terceiros e criação de empregos.
Foto: DW/Marta Barroso
Gomes António, vítima de maus tratos
Gomes António Sopa foi espancado e detido pela polícia na sequência da manifestação de 10 de janeiro de 2012, quando os habitantes de Cateme bloquearam a passagem do comboio que transportava carvão das minas até ao porto da cidade da Beira. Muitas das promessas feitas pela Vale, responsável pelo reassentamento de centenas de famílias, continuam por cumprir. Ainda hoje, Gomes António sente dores.
Foto: Marta Barroso
Duzéria, a curandeira
Os habitantes do Centro de Reassentamento de 25 de Setembro, no distrito de Moatize, queixam-se de que muitos aspetos culturais não foram respeitados durante o processo de reassentamento pelas empresas mineiras. A curandeira do bairro, por exemplo, diz que no planeamento do complexo não se teve em conta a construção de uma casa para o seu espírito.
Foto: Marta Barroso
Lória, a rainha
Provavelmente Lória Macanjo e a sua comunidade deverão ser reassentadas brevemente: a multinacional Rio Tinto está já a operar um mina de carvão em Benga, perto da sua aldeia, Capanga. Também aqui, debaixo da terra que herdou do pai, a empresa mineira descobriu carvão. Mas a rainha sabe do destino dos que já se mudaram e recusa-se a deixar a sua casa.
Foto: DW/Marta Barroso
Olivia, a cabeleireira
Olivia (esq.) tem 29 anos e veio em 2008 do seu país, o Zimbabué, fugindo à crise financeira que lá se vive. Tete é agora a terra das grandes oportunidades, tinham-lhe dito. Hoje, é cabeleireira no Mercado Primeiro de Maio e, tal como a amiga Faith (dir.) faz trabalhos de manicure. Diz que, por dia, consegue 500 a 1000 meticais, entre 15 e 25 euros. Com esse dinheiro consegue sustentar-se.
Foto: DW/Marta Barroso
Guta, o empresário
Ao todo, Guta emprega 130 homens nas áreas de carpintaria e construção civil na cidade de Tete. Diz que desde a chegada das grandes empresas à região não sentiu grandes alterações no seu negócio. Os projetos de mineração requerem quantidades às quais não consegue responder. Uma vez, conta, a Vale pediu que fornecesse, juntamente com outra carpintaria da cidade, 5000 portas em 60 dias.
Foto: DW/Marta Barroso
Canelo, o vendedor de amendoins
Canelo diz que tem 11 anos. E diz também que frequenta a segunda classe. Todas as tardes vende amendoins no centro de Tete. "Para ajudar a mãe que não tem trabalho." O pai também está desempregado. Canelo é uma de muitas crianças que vendem amendoins na cidade. Um saco pequeno fica por dois meticais, cerca de cinco cêntimos de euro, o maior custa cinco meticais, treze cêntimos de euro.
Foto: DW/Marta Barroso
Catequeta, o ativista
Manuel Catequeta mudou-se para Tete em 2001. O ativista dos direitos humanos sabe o que custa viver com a subida constante do custo de vida. O seu salário não lhe permite luxos. A sala de sua casa "de dia é sala, de noite vira quarto". Mas mudar de casa, para já, está fora de questão. Hoje em dia, uma boa casa na capital provincial passa dos 5.000 dólares, cerca de 4.000 euros, por mês.
Foto: DW/Marta Barroso
Júlio, o otimista
O músico Júlio Calengo vê oportunidades de negócio, agora que em Tete há tantas empresas novas. O seu objetivo é, em breve, montar uma empresa de limpeza: tanto nos escritórios das empresas mineiras como nos das firmas que entretanto apareceram na cidade. Interessados não vão faltar, diz Júlio. O que é preciso é ter criatividade e, claro, dinheiro.