Quem paga as despesas da viagem do Presidente de Moçambique e sua comitiva a Portugal, para além dos dois dias que o próprio solicitou? Já há quem exija prestação de contas e lembre em simultâneo das suas salvaguardas.
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Em Moçambique, vozes se erguem contra a visita de Filipe Nyusi a Portugal. É que o estadista, que viaja a convite do seu homólogo Marcelo Rebelo de Sousa, solicitou a Comissão Permanente da Assembleia da República dois dias de visita de Estado, 2 e 3 de julho, mas deverá permanecer no país até 5 de julho.
Em nome da transparência querem saber quem paga as contas dos restantes dias de visita. Lutero Simango é deputado pelo Movimento Democrático de Moçambique (MDM), a segunda maior força da oposição, e esclarece que "quando é uma visita de Estado quem paga geralmente é a contraparte. Acredito que os dois dias vão ser da responsabilidade do Governo português. Agora, a Comissão Permanente o que aprovou foi a visita oficial de acordo com o pedido dele [Nyusi]."
Mas Simango alerta: "Não se esqueça que o Governo português pode ter os seus interesses e pode ter estendido [a viagem] por mais dias. Resta saber se os dias que vão surgir depois da visita de Estado se continuam ainda visita de Estado ou se é oficial."
Prestação de contas
Mas isso continua a ser uma incógnita. E o facto de haver desconfianças exacerbadas de que o Presidente esteja a usar dinheiro do erário público indevidamente ou que esteja a ser despesista não significa que não possa ter recorrido a fontes lícitas para prolongar a sua estadia.
"Atenção, não se esqueça que ele é chefe de Estado e tem o seu budget anual que a Assembleia da República aprovou", lembra o deputado do MDM.
Mas logo de seguida sugere uma prestação de contas: "É preciso saber qual é o saldo do seu budget, se ainda lhe permite isto ou não. E também é preciso saber do Governo português se vai ou não continuar a custear as suas despesas em Portugal. Aqui pode haver interesses económicos. E é ai que se pede a transparência, para sabermos quem vai pagar as despesas."
Mas a prestação de contas é uma cultura que ainda não está enraizada no país. E ao que tudo indica, o cumprimento dos regulamentos também não, a começar pelo próprio Presidente Filipe Nyusi, como se pode depreender das palavras do deputado e chefe da bancada parlamentar do MDM: "De todas as maneiras, é obrigação de Nyusi informar a Assembleia que para além dos dois dias [de visita de Estado] vai ficar mais dias. E a essa informação eu pelo menos não tive acesso."
Menos drama
Mas o jornalista Fernando Gonçalves, que assume ter pouca informação sobre a visita, desdramatiza o cenário de suspeitas e entende que "essas visitas são preparadas com alguma antecedência e, portanto, todos os pormenores terão sido acertados durante os preparativos."
Faltou transparência na viagem de Filipe Nyusi a Portugal?
E Gonçalves prossegue: "Há a visita de Estado, mas também no seguimento da visita há uma cimeira Europa-África e eu penso que deve ter havido um arranjo para que o Presidente Nyusi fizesse a sua visita de dois dias e depois participasse na cimeira."
"Convocatória" com nuances eleitoralistas?
E nesta quarta-feira (03.07.) Nyusi convocou a comunidade moçambicana residente em Portugal para um encontro cuja agenda não foi informada previamente. Uma chamamento com caráter impositivo, que segundo as boas maneiras deveria ter o nome de convite.
E encontros de estadistas com a diáspora nessas visitas normalmente não causam estranheza, a menos que sejam em ano eleitoral e com recurso a meios pouco claros.
Uma agenda eleitoralista estará subjacente a esta reunião? Lutero Simango diz que "é tudo possível, da forma que nos habituaram, nesses últimos três meses temos visto o chefe de Estado a usar os fundos do Estado para fazer contactos partidários. Portanto, não vai ser uma surpresa se ainda hoje (03.07.) na reunião com a comunidade moçambicana possa aproveitar para fazer a sua campanha eleitoral."
Lutero Simango não descarta a possibilidade de Nyusi estar também em busca de financiamento para a sua campanha eleitoral. E vozes mais críticas também não descartam a possibilidade de encontro entre o estadista e os correligionários da FRELIMO em Portugal no contexto das eleições de 15 de outubro próximo.
Moçambique: O que foi feito ao dinheiro destas obras?
É a pergunta de vários cidadãos de Massinga, província moçambicana de Inhambane. Cada vez há mais obras na vila, que nunca chegam ao fim.
Foto: DW/L. da Conceição
Obras atrasadas
As obras arrastam-se no município de Massinga, sul de Moçambique, e os cidadãos querem saber porquê. Os empreiteiros ganham obras de construção civil na região, mas muitas são abandonadas após ser pago 50% do dinheiro para a sua execução, segundo o Conselho Municipal. A Justiça já notificou alguns empreiteiros para explicarem os atrasos, mas as estradas e avenidas continuam em péssimas condições.
Foto: DW/L. da Conceição
Mercado por construir
A União Europeia e a Suécia financiaram a construção de um mercado grossista em Massinga. Segundo a placa de identificação, as obras começaram a 28 de setembro de 2017 e deviam ter terminado a 28 de janeiro, mas até agora estão assim. O município remete as responsabilidades para o empreiteiro; contactada pela DW, a empresa negou explicar o motivo do atraso nas obras.
Foto: DW/L. da Conceição
Jardim perdido
O Conselho Municipal de Massinga gastou mais de 1,5 milhões de meticais (20.000 euros) para construir aqui um jardim etnobotânico - um projeto com a participação do Governo central e da Universidade Eduardo Mondlane. Mas as plantas colocadas aqui desapareceram e o terreno está abandonado. O Município promete que o jardim voltará a funcionar em breve, embora falte água para regar as plantas.
Foto: DW/L. da Conceição
Estrada sem fim à vista
Os trabalhos neste troço de cinco quilómetros duram há mais de três anos. O município de Massinga culpa o empreiteiro pela demora; a DW tentou contactar a empresa, sem sucesso. Segundo o município, aos 4,8 milhões de meticais (63 mil euros) pagos inicialmente ao empreiteiro foram acrescentados outros 3,9 milhões (51 mil euros) para continuar as obras, que deviam ter terminado em outubro.
Foto: DW/L. da Conceição
Estrada acabada?
25 de setembro de 2017 era a data de "entrega" desta estrada, segundo a placa de identificação. Mas a via, que parte da EN1 até ao povoado de Mangonha, continua em estado crítico. A obra está orçada em cerca de 1,9 milhões de meticais (quase 25 mil euros). Tanto a Administração Nacional de Estradas, delegação de Inhambane, como o Conselho Municipal recusaram comentar este assunto.
Foto: DW/L. da Conceição
Mais obras por acabar
Os trabalhos da pavimentação desta avenida também já deviam ter terminado, mas as obras continuam. O custo: cerca de 3,9 milhões de meticais (cerca de 51 mil euros). Mas a avenida continua por pavimentar. A DW tentou perguntar o motivo da demora à empresa Garmutti, Lda, responsável pela execução da obra, sem sucesso.
Foto: DW/L. da Conceição
Falta transparência
Segundo o regulamento de contratação de empreitadas de obras públicas, nos locais de construção devem constar as datas de início e do término dos trabalhos. Mas não é isso que acontece aqui. Segundo um relatório do governo local, um ano depois desta obra começar, só 30% dos trabalhos foram concluídos. O empreiteiro está incontactável; a empresa não tem escritório em Inhambane.
Foto: DW/L. da Conceição
Fatura sobre fatura
O orçamento inicial para os trabalhos de reabilitação no Hospital Distrital de Massinga rondava os dois milhões de meticais (cerca de 26 mil euros), mas, meses depois, o custo aumentou 600 mil meticais (8.000 euros).
Foto: DW/L. da Conceição
Edifício milionário
Este edifício custou à edilidade mais de 40 milhões de meticais (acima de 500 mil euros), sem contar com os equipamentos novos - cadeiras, secretárias ou computadores. Alguns empreiteiros acham estranho que tenha custado tanto dinheiro, porque o material de construção foi adquirido na região. Em resposta, o município justifica os custos com a necessidade de garantir o conforto dos funcionários.
Foto: DW/L. da Conceição
Adjudicações continuam
O município de Massinga continua a adjudicar novas empreitadas apesar de muitas obras não terem terminado. Vários residentes dizem-se enganados pelo edil, Clemente Boca, por não cumprir as promessas eleitorais.
Foto: DW/L. da Conceição
Campo por melhorar
Todos os anos, a Assembleia Municipal de Massinga aprova dinheiro para melhorar este campo de futebol, mas o campo continua a degradar-se. Segundo membros da assembleia, o dinheiro "sai" dos cofres públicos, mas nada muda e os jogadores "sempre reclamam". Em cinco anos, terão sido gastos 30 mil meticais (cerca de 400 euros). Nem o edil, nem os gestores do campo dizem o que foi feito ao dinheiro.
Foto: DW/L. da Conceição
"Fazemos sozinhos"
Devido à demora na construção de mercados e bancas, os residentes da vila de Massinga têm feito melhorias por conta própria, para manterem os seus produtos em boas condições. Questionados pela DW, os vendedores disseram que preferem "fazer sozinhos", porque se esperarem pelo município nunca sairão "do sol, da chuva e da poeira".