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FDC desmente números do ministro da Agricultura sobre a fome

Delfim Anacleto
7 de março de 2023

Segundo Celso Correia, "90% da população tem alimentação segura e já consegue ter três refeições por dia". Fundação para o Desenvolvimento da Comunidade diz que 80% dos moçambicanos não conseguem ter uma dieta adequada.

Joaquim Oliveira, coordenador da direção executiva da Fundação para o Desenvolvimento da Comunidade (FDC), critica palavras do ministro da AgriculturaFoto: FDC

"90% da população tem alimentação segura, ou seja, já consegue ter três refeições por dia" e "Moçambique está fora da lista dos países em risco de fome". Foram estas as palavras do ministro da Agricultura e Desenvolvimento Rural de Moçambique, Celso Correia, durante a sua visita à sede da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), em Roma, na semana passada.

A Fundação para o Desenvolvimento da Comunidade (FDC), uma organização que lida diretamente com as populações rurais, desmente as declarações do governante. Em entrevista à DW, Joaquim Oliveira, coordenador da direção executiva da FDC, pede a Celso Correia que explique aos moçambicanos a origem dos dados apresentados à FAO.

DW África: Como reage a Fundação para o Desenvolvimento da Comunidade às declarações do ministro Celso Correia?

FDC rebate estatísticas do ministro da Agricultura

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Joaquim Oliveira (JO): A nossa primeira reação foi de espanto e de indignação. Foi de certa forma desconfortante. Por aquilo que nós sabemos e tomando em consideração as pesquisas e as estatísticas e tudo mais, não há nenhuma indicação que confirme aquilo que o ministro Celso Correia afirmou. Dizer que 90% da população de Moçambique tem três refeições diárias, é obra! Essa obra precisaria de ser celebrada, por ser um feito importante!

DW África: A Fundação para o Desenvolvimento da Comunidade é uma organização bastante presente na sociedade moçambicana e lida diretamente com a população. Qual é, na vossa ótica, a situação das famílias moçambicanas no que diz respeito à segurança alimentar?

JO: Nós temos uma grande parte da população que vive abaixo da linha da pobreza. Os estudos rezam que cerca de 80% dos moçambicanos não conseguem ter uma dieta alimentar adequada. Temos também altos índices de desnutrição crónica entre crianças menores de cinco anos, para além de muitos casos de desnutrição aguda. Os dados indicam que 38% das crianças dos 0 aos 5 anos de idade encontram-se em situação de desnutrição crónica. A desnutrição crónica, de uma forma geral, atinge 30% da população. Ciclicamente, mais de 60% dos moçambicanos não conseguem manter a segurança alimentar. O que acontece ultimamente é que nós temos tido eventos extremos, como ciclones, cheias ou inundações, para além da insegurança e do terrorismo na zona norte de Moçambique. Isto para não falar da pandemia da Covid-19, etc...

Celso Correia, ministro da Agricultura e do Desenvolvimento Rural de MoçambiqueFoto: Roberto Paquete/DW

DW África: Falando do contexto em que as palavras do ministro foram proferidas, na sede da FAO: o que é que isso representa?

JO: Aqui em Moçambique temos programas que são financiados por parceiros internacionais e para o Governo é talvez importante apresentar resultados. Talvez essas palavras tenham sido uma tentativa do Governo de apresentar os tais resultados tão desejados. Para nós, essas palavras têm um alcance político muito grande, pois trata-se de declarações proferidas junto de um organismo das Nações Unidas, que presta um apoio importante ao país.

DW África: As declarações do ministro Celso Correia, na prática, não significam que Moçambique, no futuro, já não vai precisar de apoio internacional, uma vez que, alegadamente, já atingiu níveis aceitáveis no que diz respeito à segurança alimentar?

JO: É preciso ter em consideração as palavras que ele disse. O ministro afirmou que 90% da população já tem uma alimentação segura e consegue ter três refeições por dia. E ele adianta que isto é um grande sucesso dos moçambicanos. E depois diz ainda que temos que ter a certeza de que estes resultados são sustentáveis. São, pois, declarações com dois bicos: por um lado diz que se atingiram grandes sucessos, e por outro diz que é preciso mais apoio para assegurar que os sucessos sejam sustentáveis.                                                            

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