Moçambique: Presidente defende unidade contra grupos armados
Lusa
30 de novembro de 2020
O Presidente moçambicano defendeu esta segunda-feira (30.11) a unidade do país na luta contra grupos armados que protagonizam ataques em Cabo Delgado, reiterando o compromisso com a consolidação da paz e da democracia.
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"Apelamos aos nossos irmãos [da Resistência Nacional Moçambicana] para ultrapassarem as suas diferenças pela via do diálogo para que o país se possa unir na luta contra os terroristas", sublinhou, esta sexta-feira (30.11), Filipe Nyusi.
O Presidente moçambicano falava em Maputo por ocasião do encerramento de uma conferência promovida pelo Instituto para a Democracia Multipartidária (IMD), alusiva aos 30 anos do multipartidarismo.
A Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), principal partido da oposição, atravessa uma crise interna: conta com uma dissidência armada da sua guerrilha a contestar o presidente da organização, Ossufo Momade, e a protagonizar ataques armados nas províncias de Sofala e Manica, centro do país, contra alvos civis. Ataques já provocaram 30 mortos desde agosto de 2019.
Cabo Delgado: O relato de um sobrevivente do terrorismo
02:18
Desafios à democracia
No seu discurso, o chefe de Estado moçambicano assinalou que a ausência de "paz efetiva" no país é uma ameaça aos direitos e liberdades fundamentais alcançados com a implantação da democracia.
"Constatamos que ao longo destes 30 anos de democracia multipartidária, ainda persistem desafios que devem ser superados para o alcance de uma paz efetiva", frisou Nyusi.
Os atentados aos direitos humanos e as desconfianças em relação aos órgãos de administração eleitoral também são uma mancha à qualidade da democracia moçambicana, acrescentou.
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UE pronta para ajudar
Por seu turno, o embaixador da União Europeia (UE) em Moçambique, António Sánchez-Benedito Gaspar, disse que a organização está empenhada em ajudar o país a consolidar o Estado de Direito democrático.
"Estamos prontos a ajudar Moçambique a reforçar a capacidade de resposta aos múltiplos desafios que enfrenta, incluindo a situação em Cabo Delgado", declarou Gaspar, falando no mesmo evento.
O diplomata assinalou a importância do respeito pelos direitos humanos, enfatizando que o compromisso com os valores fundamentais deve estar no "âmago" da cooperação entre a UE e os seus parceiros.
O embaixador da UE em Moçambique destacou o compromisso do Estado africano com o sufrágio universal, sublinhando que o país nunca falhou eleições gerais de cinco em cinco anos, desde a realização do primeiro escrutínio nacional em 1994.
António Sánchez-Benedito Gaspar reiterou o empenho da UE no apoio ao desenvolvimento social e económico de Moçambique.
Ataques sem fim
A violência armada em Cabo Delgado dura há três anos e está a provocar uma crise humanitária com cerca de 2 mil mortes e cerca de 500 mil pessoas deslocadas, sem habitação, nem alimentos e concentrando-se sobretudo na área da capital provincial, Pemba.
Por outro lado, as províncias de Sofala e Manica, centro do país, são palco de ataques da autoproclamada Junta Militar, uma dissidência armada da RENAMO.
O grupo rejeita a liderança do presidente da RENAMO, Ossufo Momade, acusando-o de trair as posições do seu antecessor Afonso Dhlakama nas negociações que levaram à assinatura do Acordo de Paz e Reconciliação Nacional, a 6 de agosto.
Afonso Dhlakama, homem de causas
O percurso de Afonso Dhlakama enquanto político e militar quase se confunde com a história de Moçambique independente. Em nome da democracia não hesitou em entrar numa guerra. Herói para uns, vilão para outros.
Foto: picture-alliance/dpa
Dhlakama, um começo na FRELIMO que não vingou
Afonso Macacho Marceta Dhlakama nasceu a 1 de janeiro de 1953 em Mangunde, povíncia central de Sofala, Moçambique. Entra para a FRELIMO perto da época da independência em 1975, mas não fica muito tempo. Em 1976 sai do partido que governa o país para co-fundar a RNM (Resistência Nacional de Moçambique), um movimento armado, com o apoio da Rodésia do Zimbabué. O objetivo: por fim a ditadura.
Foto: Imago/photothek
Dhlakama: Desde cedo líder da RENAMO
A guerra civil entre a RNM, depois denominada RENAMO, Resistência Nacional de Moçambique, e o Governo começou em 1976. Dhlakama assume a liderança da RNM depois da morte de André Matsangaíssa em combate em 1979. Já era líder quando o primeiro acordo que visava por fim a guerra foi assinado entre o Governo e o regime do apartheid na África do Sul em 1984. Mas o Acordo de Inkomati fracassou.
Foto: Jinty Jackson/AFP/Getty Images
AGP: Democracia entra no vocabulário com Dhlakama
Depois de 16 anos de guerra Dhlakama assina com o Governo o Acordo Geral de Paz de Roma em 1992 no contexto do fim da guerra fria e do apartheid na África do Sul. Começa uma nova era para o país, depois de uma guerra que fez perto de um milhão de mortos e milhões de refugiados. A democracia passa então a fazer parte do vocabulário dos moçambicanos, com Dhlakama a auto-intitular-se o seu pai.
Foto: picture-alliance/dpa
O começo das derrotas de Dhlakama nas eleições
Moçambique entra para a era do multipartidarismo e realiza as suas primeiras eleições em 1994. Dhlakama e o seu partido perdem as eleições. As segundas eleições acontecem em 1999 e Dhlakama volta a perder, mas rejeita a derrota. E desde então não parou de perder, facto que provocou descontentamento ao partido de Dhlakama. Reclamava de fraudes e injustiças. E nasceram assim as crises com o Governo.
Foto: Reuters/Grant Lee Neuenburg
Dhlakama: O regresso às matas como estratégia de pressão
O regresso do líder da RENAMO à Serra da Gorongosa em 2013, um dos seus bastiões militares, foi uma mensagem inequívoca ao Governo da FRELIMO. Dhlakama queria mudanças reais, que passavam pelo respeito integral do AGP, principalmente a integração dos militares da RENAMO no exército nacional, e mudança da legislação eleitoral. Assim o país voltou a guerra depois de mais de vinte anos.
Foto: Jinty Jackson/AFP/Getty Images
Armando Guebuza e Dhlakama em braço de ferro permanente
A 5 de agosto de 2014 o então Presidente Armando Guebuza e Afonso Dhlakama assinaram um cessar-fogo. Estavam criadas as condições para o líder da RENAMO participar nas eleições gerais de outubro de 2014. Dhlakama e o seu partido participam nas eleições e voltam a perder. As crise volta ao rubro e Dhlakama regressa às matas da Gorongosa.
Foto: Jinty Jackson/AFP/Getty Images
Emboscada contra Afonso Dhlakama
A 12 de setembro de 2015 a caravana em que seguia Afonso Dhlakama foi atacada na província de Manica. Ate hoje não se sabe quem foram os atacantes. A RENAMO considerou a emboscada como uma tentativa de assassinato do seu líder. A comunidade internacional condenou o uso da violência.
Foto: DW/A. Sebastião
Aperto ao cerco contra Afonso Dhlakama
No dia 9 de outubro de 2015, a polícia cercou e invadiu a casa de Afonso Dhlakama na cidade da Beira. As forças governamentais pretendiam desarmar a força a guarda do líder da RENAMO. Os homens da RENAMO que se encontravam no local foram detidos. A população da Beira, bastião da RENAMO, juntou-se diante da casa de Dhlakama manifestando o seu apoio ao líder.
Foto: picture-alliance/dpa/A. Catueira
Dhlakama e Nyusi: Menos mãos melhores resultados
O líder da RENAMO e o Presidente da República decidiram prescindir de mediadores e passaram a negociar o acordo pessoalmente. Desde então consensos têm sido alcançados, um deles relativo à revisão pontual da Constituição, no âmbito do processo de descentralização em fevereiro de 2018. A aprovação da proposta pelo Parlamento é urgente, pois as próximas eleições de 2018 e 2019 dependem dele.
Foto: Presidencia da Republica de Mocambique
Dhlakama: Não foi a bala que ditou o seu fim
Na manhã de 3 de maio o maior líder da oposição em Moçambique perdeu a vida vítima de doença. Deixa aos seus correlegionários a tarefa de negociar outro ponto controverso na crise com o Governo: a desmilitarização ou integração dos homens armados da RENAMO no exército nacional. Há quase 40 anos à frente da liderança da RENAMO teve de negociar com todos os Presidentes de Moçambique independente.