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Moçambique: "FRELIMO precisa de outra estrutura partidária"

3 de outubro de 2017

Em entrevista à DW, o sociólogo moçambicano Elísio Macamo diz que "faltou sensibilidade" ao partido ao convocar comício para segunda-feira (02.10), logo depois do XI Congresso.

Comité Central da FRELIMO (2016)Foto: DW/L. Matias

Depois do XI Congresso da FRELIMO, em que participaram muitos funcionários públicos, o partido no poder em Moçambique convocou um comício popular para a segunda-feira (02.10) - ocupando assim mais um dia de trabalho. Paradoxalmente, durante o Congresso fez-se um apelo a uma maior produção para se acabar com a pobreza no país. Vários casos contraditórios aconteceram em paralelo ao evento. Para o sociólogo moçambicano Elisio Macamo, algumas dessas atitudes revelam falta de sensibilidade. A DW África conversou com ele sobre alguns casos constatados.

DW África: logo depois do término XI Congresso da FRELIMO, o partido convocou um comício para as 15 horas. Para um partido que quer produção para sair da pobreza, não será uma atitudade contraditória?

Sociólogo moçambicano Elísio MacamoFoto: DW/J. Beck

Elísio Macamo: Representa, se, de fato, as pessoas que forem participar nesse comício o façam dentro das suas horas de trabalho. É algo sobre o qual podemos apenas especular. Não sabemos se as pessoas que participaram no Congresso, e que são funcionários públicos, pediram licença ou férias para poderem estar fora do serviço a essa hora. Nessas condições, a gente pode criticar. Entretanto, para qualquer pessoa sensata é fácil depreender que, mesmo que não sejam todas as pessoas, uma boa parte dos que participaram no Congresso faltaram ao serviço, sim.

DW África: Isso pode ser interpretado como um sinal de "descaramento" ou de abuso pelo partido? Sobretudo, pelo fato de se fazer o convite sabendo que a população que trabalha na função pública só termina o trabalho depois das 15 horas?

Presidente de Moçambique e líder da FRELIMO, Filipe NyusiFoto: DW/B. Jequete

EM: Isso depende muito da perspetiva ou do posicionamento político que uma pessoa tenha em relação à própria FRELIMO. Eu não falaria de abuso, mas sim em termos de falta de sensibilidade e de um hábito enraizado - que muita gente tem no seio do partido - de não fazer a distinção entre o partido e o Estado.Infelizmente, isso leva muito tempo para acabar. Mas parece ser essa a situação. De fato, isso releva muita insensibilidade e contradiz um aquilo que se falou no Congresso em relação à necessidade de disciplinar ainda mais o partido, de "expurgar o que é mau dentro do partido", como disse ainda esta madrugada o presidente do partido. Portanto, há essa contradição com o discurso que foi marcante durante o Congresso. É uma grande pena que isso esteja a acontecer.

DW África: Na véspera do Congresso, o partido fez circular um pequeno comunicado, uma espécie de discurso, em que se idolatrava o líder do partido, Filipe Nyusi, ao "estilo Kim Jong-un" (o líder da Coreia do Norte). Faz sentido que nos dias de hoje a FRELIMO ainda continue a optar por este tipo de discurso e de postura?

Moçambique: "FRELIMO precisa de outra estrutura partidária"

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EM: Faz sentido, porque é uma questão de hábito. Muitas pessoas não conhecem outro tipo de estruturação de um partido, não conhecem outra postura política. O país viveu durante muitos anos num sistema de partido único. Muita gente que faz parte da FRELIMO vem de uma socialização política cujo contexto é o de um único partido. E, infelizmente, há coisas que demoram muito tempo para "sair da cabeça" das pessoas. Basta ver a estrutura do partido, que me parece incompatível com o sistema multipartidário, onde o partido não controla o Estado. Só num partido que controla o Estado se permite uma estrutura tão pesada como a da FRELIMO, nos dias de hoje. Não faz sentido, em minha opinião, ter um Comité Central como eles têm. Esse último fazia sentido no tempo em que o partido controlava o Estado, em que era o único partido e podia se beneficiar dos recursos do Estado para alimentar essa gente toda. Agora, a FRELIMO precisa de outra estrutura partidária, mais flexível e menos generosa inclusive para as finanças do próprio partido.

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