Moçambique: Funcionários do Município de Angoche em greve
Sitoi Lutxeque (Nampula)
28 de novembro de 2019
Funcionários do Concelho Autárquico de Angoche, norte de Moçambique, gerido pela RENAMO, de "braços cruzados" desde esta quinta-feira (28.11). Em causa pagamento de salários de quatro meses. Edilidade fala em sabotagem.
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Mais de 400 funcionários do Município de Angoche dizem que não receberam os salários dos meses de janeiro, outubro e novembro de 2019 e décimo terceiro de dezembro de 2018.
Um dos grevistas, que falou na condição de anonimato, disse que a preocupação já é do conhecimento de algumas instituições:
"É do conhecimento do administrador do distrito, nas finanças [Direção Provincial de Economia e Finanças], para poder ter alguma informação, mas não temos nenhuma explicação e assim planificou-se a tal greve que está a acontecer".
Cortes de salários sem justificação
Segundo o trabalhador, o outro problema está relacionado com cortes e descontos sistemáticos dos salários sem justificação por parte das autoridades municipais.
Os funcionários dizem que "sofremos cortes nos salários entre 500 meticais e 900 meticais [o equivalente a sete euros e 10 euros] sem que o município justifique tal atitude. Então, quando fomos ter com o presidente respondeu-nos mal e não há uma boa colaboração".
Os grevistas prometem que não vão parar com os protestos sem antes o município pagar o que deve aos funcionários e com garantias de que não haverá cortes.
Há falta de transparência na alocação de fundos
Já o edil da cidade de Angoche, Ossufo Rajá, considera que a greve é ilegal pelo facto de não ter sido participada ás autoridades municipais.
Entende ainda que a paralisação tem motivações políticas, movidas pelos seus adversários políticos.
O autarca fala de falta de transferência na alocação de verbas por parte do Governo central e assegurou que tem feito pagamentos antecipados, enquanto aguarda pela canalização dos fundos para o efeito.
Moçambique: Funcionários do Município de Angoche em greve
"Eu criei um salário [fundo] que antecipa o salário das finanças. Ele primeiro paga e espero pelas transferências, é assim a minha gestão".
O edil referiu que na sua gestão, desde início do ano a esta parte, nunca ficaram sem salários.
Para Rajá "significa que o objetivo [da greve] não era de [reivindicar] salários, mas de [os grevistas] quererem sabotar vários empreendimentos [em construção] e isso vai ser responsabilizado."
O edil da terceira maior cidade da província nortenha de Nampula diz que já recebeu, nesta quarta-feira (28.11.), verbas, em dívidas referentes ao mês de janeiro, que serão canalizadas aos funcionários.
Nampula: População de Angoche insatisfeita com contributos de mineradora chinesa
Contributos dados pela mineradora Haiyu Mozambique Mining Company não são suficientes, diz a população. Problemas relacionados com serviços básicos mantêm-se, não se antevendo melhorias.
Foto: DW/S. Lutxeque
Poucos benefícios para população
As populações de Angoche, considerada a terceira maior da província de Nampula e onde está instalada a mineradora chinesa Haiyu Mozambique Mining Company, continuam, depois de cerca de oito anos depois do início da exploração das areias pesadas, a enfrentar sérios problemas relacionados com serviços básicos, nomeadamente, acesso a água, corrente eléctrica e maus acessos rodoviários.
Foto: DW/S. Lutxeque
Comunidades pobres em zonas ricas
No distrito, as comunidades de Sangache, Murrua e Namue, são exemplo da pobreza extrema que assola esta região de exploração de minérios. As habitações são, maioritariamente, de construção precária, feitas com base em tijolos menos resistentes, paus e folhas de coqueiros.
Foto: DW/S. Lutxeque
Muita produção para pouco retorno
A mineradora chinesa iniciou a exploração das areias pesadas em Sangache, em 2010. E, até à data, a produção continua em alta, apesar da oscilação dos preços no mercado internacional. No entanto, a população diz continuar a não ver o retorno da exportação dos valiosos minerais explorados nas suas terras, como são o ilmenite e o zircão.
Foto: DW/S. Lutxeque
Défice de água potável
A água potável de qualidade e em quantidade, para consumo humano, é um dos problemas que tira o sossego aos milhares de habitantes destas regiões. Nos populosos bairros de Murrua e Namue, por exemplo, existem poucos furos de água potável, apesar de, nos últimos meses, a mineradora ter construído dois poços.
Foto: DW/S. Lutxeque
Degradação de estradas
Outro dos problemas é a degradação das estradas. No interior do distrito de Angoche, assim como nas suas vias de acesso, desde Nampula, as estradas não estão em boas condições. São todas de terraplanagem e, consoante a estação do ano, apresentam poeira, buracos ou lamas. A população queixa-se de falta de sensibilidade da mineradora na resolução deste problema, que também afeta a sua atividade.
Foto: DW/S. Lutxeque
Reabilitação para benefício próprio
Para além de desiludidos com a empresa chinesa, os citadinos sentem-se também enganados. Enquanto a população se queixa das dificuldades provenientes do mau estado da estrada que liga Angoche a Nampula, a mineradora está a reabilitar um troço - inferior a dez quilómetros - que dá acesso ao porto local, de forma de facilitar o transporte dos produtos da sua fábrica ao porto.
Foto: DW/S. Lutxeque
Armazéns cheios
Nos armazéns da Haiyu Mozambique Mining Company, os produtos continuam a entrar e a capacidade de armazenamento revela-se cada vez mais esgotada. Não há espaço no interior do armazém da empresa, localizado no porto de Angoche. É daqui que saem os recursos que são exportados para o mercado internacional.
Foto: DW/S. Lutxeque
Pressão popular
Apesar das promessas, a contribuição das multinacionais para a população tem sido fraca. Os líderes comunitários dizem-se desapontados. À DW, Lopes Vasco, líder comunitário de Angoche, diz que estas empresas "não estão, até agora, a responder às suas obrigações. Não se justifica que as populações continuem pobres enquanto elas fazem muito dinheiro com os nossos recursos".
Foto: DW/S. Lutxeque
Iluminação
Depois de muita pressão por parte dos líderes comunitários, e depois de uma reunião com o governo, a mineradora celebrou, em setembro de 2018, um memorando para a criação de um plano estratégico de responsabilidade social para o período de 2017-2020. A construção desta Rede de Baixa Tensão, que custou cerca de dez milhões de meticais, cerca de 140 mil euros, foi uma das ações acordadas.
Foto: DW/S. Lutxeque
Mais emprego
Desde 2010, quando iniciou a sua atividade em Sangache, a empresa chinesa tem vindo também a apostar na mão-de-obra nacional, em detrimento da estrangeira, tendo já levado dezenas de moçambicanos para formação técnico-profissional na China. Atualmente, a empresa conta com 500 trabalhadores, dos quais apenas 30 são estrangeiros, na sua maioria de nacionalidade chinesa.
Foto: DW/S. Lutxeque
Melhorias na saúde
Além da abertura de alguns furos de água e expansão da corrente elétrica, a mineradora está também a dar o seu contributo ao setor da saúde. No final do ano passado, a Haiyu Mozambique Mining Company comprou uma ambulância equipada para as comunidades de Angoche, avaliada em mais de quatro milhões de meticais, cerca de 56 mil euros.