Moçambique: Garimpeiros ameaçam meio ambiente em Manica
Bernardo Jequete (Manica)
7 de junho de 2019
Aumento de garimpeiros artesanais é a principal causa dos problemas ambientais na província de Manica. As consequências já são visíveis, mas as autoridades e associações estão empenhadas em promover boas práticas.
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As atividades tem ocorrido principalmente nos distritos de Manica, Sussundenga, Guro, Báruè e Macossa, onde abundam minérios preciosos com destaque para o ouro e turmalinas.
A prática preocupa as autoridades e ambientalistas que se esforçam para reduzir os problemas ambientais.
A Associação para Gestão de biodiversidade em Manica, constituída por jovens estudantes do curso superior de Ecoturismo e Gestão de Fauna Bravia, tem estado a desenvolver trabalhos nas comunidades rurais plantando mudas de árvores de frutas com vista ao reflorestamento.
Danos
José Pedro Zunguza é o presidente da Associação e conta: "Estamos a sensibilizar as comunidades visando consciencializa-las sobre as boas práticas de gestão da biodiversidade sem por em risco a própria natureza. As práticas que elas usam não são benéficas ao ambiente e nem as próprias comunidades."
Moçambique: Garimpeiros ameaçam meio ambiente em Manica
O líder da associação exemplifica: "Se formos ver há muitos rios e cursos de água que estão poluídos, devido a esta atividade de exploração mineira que acaba devastando tudo. Então, é algo a lamentar quanto a questão de exploração". E sobre medidas entende que "se calhar o que devia ser feito é uma maior fiscalização dessas áreas."
E Zunguza explica o ciclo da poluição: "A poluição das águas dos rios para além de afetar as espécies que vivem lá no rio, até mesmo as próprias comunidades acabam ficando afetadas, porque aquela água é usada para vários fins, consumo das pessoas, machambas [campos agrícolas] e quando a água contém mercúrio proveniente da prática do garimpo ela torna-se imprópria para o consumo..."
As consequências
Jone Samissone Njanje é ambientalista especializado em recursos hídricos e explica o seguinte: "Quando as pessoas exploram ouro duma forma insustentável estão também a perigar o nosso ambiente tal como vimos, com o ciclone Idai."
O ambientalista conta que "os resíduos sólidos resultantes da exploração ilegal de ouro foram depositados nos rios Mussapa e Lucite, onde a população ficou sem os seus campos de produção agrícola, porque o lodo foi transportado e foi depositado no rio, o que provocou assoreamento dos rios."
Já as autoridades dizem estar em curso trabalhos de fiscalização para os operadores de pequena escala assim como para os ligados à mineração artesanal.
Lamentações e apelos das autoridades
O diretor provincial dos Recursos Minerais e Energia em Manica, Silva Manuel, lamenta que alguns cidadãos pratiquem o garimpo à noite, logo depois da retirada dos fiscais: "O que nós estamos a dizer [aos garimpeiros artesanais] é que devem estar organizados, formando grupos associados e esse grupo depois transforma-se em sociedade ou cooperativa mineira."
Silva Manuel explica que "quando se transformam em cooperativa mineira, tem possibilidades de mudar a situação da pá e picareta para o uso de pequenas maquinarias e assim tem a possibilidade de trabalhar de forma organizada, abrindo bacias de decantação onde irão lavar o seu minério para não poluir os rios."
Em Manica existem 22 associações mineiras e nos primeiros três meses de 2019 que registaram a extração de 75 kg de ouro. Normalmente elas registam pouco mais de 400 kg de ouro por ano.
Os filhos perdidos de Chimanimani
Todos os dias há jovens a subir. São eles que alimentam os garimpeiros em Chimanimani, a reserva natural que separa Moçambique do Zimbabué. Quando descem, trazem pepitas de ouro nos bolsos.
Foto: DW/M.Barroso
O ouro de Chimanimani
Em 2006, conta-se, a produção diária em Chimanimani era de 5g por garimpeiro por dia. Hoje, queixam-se, não passa de 3g por garimpeiro por dia.
Foto: DW/M.Barroso
Preciosidades em notas sem valor
É em notas de milhões de dólares zimbabueanos que se transporta o ouro por aqui. Papel não é seguro, porque, quando molha, rasga. A nota é mais fiável: dobra-se uma e outra vez, dobra-se umas quantas vezes e prende-se com um fio de ráfia. E as notas do Zimbabué há muito que não valem os milhões que prometem na figura.
Foto: DW/M.Barroso
Matzundzo, o régulo
Toda a zona que se estende até ao mercado do ouro de Baco Ramambo se encontra sob a autoridade do régulo Matzundzo.
Foto: DW/M.Barroso
Ao almoço, uma pausa
Mateus tem 24 anos. Há três ganha a vida a carregar produtos em Chimanimani. Para conseguir chegar a Baco Ramambo, é preciso fumar, conta. Para ter "power".
Foto: DW/M.Barroso
Para lá dos montes
Por aqui, todos dizem que o caminho até ao mercado demora "duas horas de relógio". Na realidade, o percurso toma dias. Pausas são luxo raro.
Foto: DW/M.Barroso
Quem passa, leva ensopadas as calças
Em Chimanimani, os rios não têm pontes. Os rapazes seguem em frente, água dentro, sem grandes paragens, sem hesitações, vestidos, calçados, a mercadoria a balançar nas cabeças.
Foto: DW/M.Barroso
Neto, o negocianteNeto, o negociante
António Neto Coco com a sua balança de ouro. Desde que foi agredido por bandidos, tem regularmente três rapazes a vender produtos na zona do mercado de Baco Ramambo.
Foto: DW/M.Barroso
Vida sob camuflagem
Muitos em Chimanimani vêm do Zimbabué. Por 600 meticais, nem 14 euros, compram identidade moçambicana. Assim, se forem descobertos com ouro, evitam ser deportados para o país do lado, um país sem futuro.
Foto: DW/M.Barroso
Entre o fumo
Carregadores e garimpeiros moram em cavernas. Aqui cozinham, aqui se aquecem com lenha do mato e aqui dormem. A fuligem que sobe do lume pinta as paredes da rocha, crava-se nos pulmões, queima os olhos.
Foto: DW/M.Barroso
Natureza em erosão
Desde que os fiscais do parque sobem ao planalto para escurraçar os infratores da lei, os garimpeiros dispersam ao longo de vários rios. Assim, a vegetação ribeirinha é destruída, a erosão dos solos espalha-se e os sedimentos são transportados pela corrente, causando turvação das águas.
Foto: DW/M.Barroso
Baco Ramambo, o mercado
Em dias de chuva como hoje, cada um se refugia na sua caverna e o mercado de Baco Ramambo adquire um ar triste. Das negociatas que aqui se fazem em dias bons não há sinal.
Foto: DW/M.Barroso
A camarata do mercado...
Poucos são os que se aventuram a pernoitar na zona de Baco Ramambo com medo dos fiscais. Ainda assim, esta camarata serve de abrigo aos que por aqui ficam.
Foto: DW/M.Barroso
... e a cozinha
O rádio que traz música na caverna da cozinha de Baco Ramambo foi vendido num dia húmido como o de hoje. Em dias assim, só os carregadores faturam, já que poucos garimpeiros ousam entrar nos riachos – nestas condições impiedosas, a água provoca febres.
Foto: DW/M.Barroso
Chimanimani - um El Dorado
É aos americanos, aos sul-africanos e aos libaneses que carregadores e garimpeiros vendem o seu ouro. São eles que fazem as verdadeiras fortunas vindas de Baco Ramambo.