Académicos e sociedade civil moçambicana enaltecem os esforços do Presidente Filipe Nyusi em aliviar a tensão entre o Governo e a Igreja Católica, acusada de patrocinar logística militar aos insurgentes em Cabo Delgado.
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Uma certa tensão entre o Governo moçambicano e a Igreja Católica foi sentida até à semana passada. Na origem estariam as denúncias de irregularidades das Forças de Defesa e Segurança (FDS), e não só, no palco da guerra em Cabo Delgado.
Violações dos direitos humanos e outros abusos contra a população foram denunciados pelo bispo de Pemba, dom Luiz Fernando Lisboa. E em jeito de resposta, os defensores do regime acusaram o bispo de "patrocinar logisticamente" os insurgentes.
Contudo, durante a visita do Presidente Filipe Nyusi a Pemba, na segunda-feira (31.08), o Governo "içou a bandeira da paz" ao se aproximar da igreja para dialogar com o bispo sobre a situação em Cabo Delgado.
O académico Teodoro de Abreu elogia os esforços do Presidente Filipe Nyusi e critica "alguns indivíduos" que espalham ódio e violência contra o bispo de Pemba.
Bispo de Pemba: "Estou tranquilo"
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"O Presidente fez um discurso e, sem citar nomes, e logo a seguir houve gente que teve a responsabilidade de atribuir nomes aos bois e começar a acusar o bispo de dar logística militar [aos insurgentes] simplesmente porque não se concorda com o que ele diz e é alguém a abater", afirma.
Diálogo "pressionado" pela sociedade civil
Também o presidente do Parlamento Juvenil, David Fardo, sustenta que o Presidente da República "fez bem" encontrar-se com o bispo de Pemba, mas notou que isso foi resultado de muita pressão da sociedade civil.
"Nós acreditamos que é mais uma resposta às ações da sociedade civil. O facto de o Presidente ter intervindo com o bispo de Pemba, em algum momento poderá amenizar, mas não porque é o suficiente perante as ameaças que o bispo sofre. Há muito que o Presidente deve fazer como o alto magistrado da nação", defende.
O académico Teodoro de Abreu lembra que há um ano, quando chegou para a sua visita a Moçambique, a 4 de setembro, o Papa Francisco pediu a união dos moçambicanos, fator importante para o desenvolvimento, mas respeitando as diferenças em todos os sentidos.
"As únicas diferenças que nós temos de eliminar são as diferenças de oportunidade. Mas as diferenças de opinião e de ver, essas devem ser valorizadas e isso é o que vem no discurso do Presidente da República ao sair do encontro com o bispo", destaca o analista, que cita ainda o que disse Filipe Nysui sobre Luiz Fernando Lisboa: "Ele como bispo da igreja bastante implantada tem outra visão e eu vim partilhar com ele esta visão."
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Desigualdades sociais continuam
Na altura, na sua mensagem aos moçambicanos, o Papa Francisco criticou as desigualdades sociais, lembrando que o país é rico em recursos naturais. Mas aos olhos do Parlamento Juvenil, "os moçambicanos não beneficiam diretamente dos recursos que a sua nação tem.
E a distribuição equitativa dos recursos, acresceneta, ainda vai continuar a ser um desafio, "porque existe a doença da corrupção que apoquenta este punhado de gente", sublinha.
"E nós, sociedade, continuamos sempre naquela expetativa e a juventude moçambicana é aproximada quando estamos em pleitos eleitorais e é instrumentalizada", lamenta o líder do Parlamento Juvenil, David Fardo.
Já o ativista social e jurista Tomás Vieira Mário enaltece que se deve salvaguardar a defesa dos direitos dos cidadãos, sobretudo por causa do momento de conflito que o país vive, sobretudo em Cabo Delgado e no centro.
"Porque os cidadãos não podem gozar os seus direitos e liberdades. Onde há conflitos claramente as liberdades fundamentais são bloqueadas: a livre circulação de pessoas e bens, a discussão de ideias, a liberdade de expressão. Onde há conflitos há sempre bloqueio", lembra.
Esperança, paz e reconciliação na visita do Papa Francisco a Moçambique
O líder da Igreja católica foi recebido em festa pelo país inteiro. Mas houve críticas ao alegado aproveitamento político da visita em vésperas de eleições.
Foto: DW/M. Sampaio
Moçambique em festa
Volvidas mais de três décadas sobre a última visita de um Papa a Moçambique, esta quarta-feira, 4 de setembro, foi a vez do Papa Francisco levar aos moçambicanos uma mensagem de paz, justiça e reconciliação. Por poucos momentos, o país esqueceu as dificuldades políticas, económicas e sociais que atravessa para celebrar o sumo pontífice.
Foto: DW/M. Sampaio
Danças e cantares para o Papa
A festa começou logo à chegada do Papa Francisco no fim da tarde. Muitos moçambicanos têm esperança que o chefe da Igreja católica dê um novo ímpeto ao processo de reconciliação, numa altura em que o acordo de paz assinado entre a RENAMO e a FRELIMO há poucas semanas volta a ser posto em causa por milícias armadas.
Foto: DW/M. Sampaio
Aproveitamento político?
O Papa Francisco foi recebido com as devidas honras pelo Presidente da República, Filipe Nyusi, mas dos partidos da oposição choveram críticas ao alegado aproveitamento político da visita pelo partido no poder, a FRELIMO. Tanto mais que o país está em vésperas de eleições gerais, marcadas para 15 de outubro.
Foto: DW/Ricardo Franco
Suspensão da campanha eleitoral
A campanha eleitoral em Maputo foi interrompida pela duração da visita. A decisão não convenceu os partidos da oposição. O porta-voz do MDM, Sande Carmona, levantou mesmo a suspeita de que a visita do Papa "seja uma oportunidade para a lavagem de dinheiro dos cofres do Estado, para financiar a campanha eleitoral da FRELIMO". A visita do Papa terá custado ao Estado o equivalente a 300 mil euros.
Foto: DW/M. Sampaio
Apelo aos direitos humanos
A Amnistia Internacional (AI) pediu ao Papa que na sua deslocação a Moçambique aborde com o Presidente Nyusi a situação da violação dos direitos humanos. Uma carta subscrita pela AI e mais 11 organizações moçambicanas e internacionais expressa enorme preocupação "com a crescente intimidação e perseguição aos defensores dos direitos humanos, ativistas, organizações da sociedade civil e média"
Foto: DW/M. Sampaio
Nação abençoada
"Moçambique é uma nação abençoada e vós especialmente sois convidados a cuidar desta bênção", disse o Papa no seu primeiro discurso em Moçambique. Mas Francisco também frisou que "sem igualdade de oportunidades" não há paz duradoura. Francisco criticou "a pilhagem e espoliação" no país.
Foto: DW/Ricardo Franco
Encontro com os jovens de Moçambique
Jovens de todas as confissões foram convidados a encontrar-se com o Papa no Pavihão de Maxaquene em Maputo. O pavilhão encheu para escutar a mensagem de Francisco. Que foi clara: "Estejam atentos àqueles que querem dividir e fragmentar". Uma alusão também a movimentos obscuros de cariz islamita suspeitos de estarem na origem de violência no norte do país.
Foto: DW/M. Sampaio
Alegria ecuménica
Nas redes sociais circularam apelos de proveniência incerta contra a participação de jovens muçulmanos na festa em torno do Papa. Mas muitos muçulmanos foram ouvir a mensagem de paz e reconciliação que lhes foi igualmente dirigida. "A alegria de viver, como se pode sentir aqui, a alegria partilhada e celebrada, reconcilia", declarou Francisco.
Foto: DW/M. Sampaio
A 47ª visita do Papa ao exterior
Jorge Mário Bergoglio é o segundo Papa a escalar Moçambique depois de João Paulo II em 1988. O lema da visita é "Esperança, Paz e Reconciliação". Moçambique é o sétimo país que Francisco visita em 2018, e o 47° desde que chegou ao Vaticano em 2013. De Moçambique o líder católico segue para o Madagáscar e as Ilhas Maurícias.
Foto: DW/Ricardo Franco
Atentos às palavras do Papa
O Estádio Nacional do Zimpeto encheu na manhã de sexta-feira (06.09) para a celebração da missa e homilía pelo Papa Francisco. A missa, que colocou um ponto final na visita papal, foi celebrada no dia em que se assinala um mês da assinatura de um acordo de paz - o terceiro desde 1992 - entre o Governo e a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO).
Foto: DW/M. Sampaio
Apelo ao combate contra a corrupção e pela paz
Durante a homilía, o Papa Francisco fez um apelo para o combate à corrupção: "Moçambique possui um território cheio de recursos naturais e culturais", disse, mas apesar destas riquezas, "uma quantidade enorme de população vive abaixo do nível de pobreza". Numa alusão à situação de violência armada em Cabo Delgado, o Papa pediu ainda que se amem os inimigos, sem lhes responder com violência.