Moçambique Governo medidas contra incumprimento financeiro
Lusa | tms
10 de abril de 2020
Adriano Maleiane, ministro da Economia e Finanças, disse que o Governo só vai prestar garantias ao financiamento de empresas públicas que assegurarem o reembolso dos empréstimos, para evitar situações do passado.
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"É preciso que se prove que o projeto [empresarial] que está sendo financiado é viável e tem capacidade para reembolsar o crédito", declarou Adriano Maleiane, respondendo a perguntas dos deputados da Comissão do Plano e Orçamento (CPO) da Assembleia da República (AR) de Moçambique, esta sexta-feira (10.04).
As condições em que o executivo moçambicano avaliza o endividamento de empresas públicas centraram a audição parlamentar com Adriano Maleiane, com os deputados preocupados em assegurar que não se vão repetir situações como a das dívidas ocultas.
O governante avançou que o processo de emissão de garantias vai seguir a obrigação legal de autorização pelo Conselho de Ministros e pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
"Só podemos passar a garantia quando tivermos a certeza de que o empréstimo vai ter o rendimento e produtividade que se espera", acrescentou.
A ida do ministro da Economia e Finanças à Assembleia da República decorreu no âmbito de audições de vários membros do Governo a propósito das propostas do Orçamento de Estado (OE) e Plano Económico e Social (PES) para 2020.
Medidas mais restritivas
Na sequência do escândalo das dívidas ocultas, o Governo moçambicano aprovou em 2017 um decreto com regras mais restritivas para a emissão de garantias de Estado.
O escândalo das dívidas ocultas foi desencadeado por denúncias de que o então Governo moçambicano emitiu secretamente avales a empréstimos no valor de 2,2 mil milhões de dólares (dois mil milhões de euros) a favor de três empresas estatais ligadas à pesca e segurança marítima.
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Moçambique entrou em incumprimento em relação a essas dívidas, sendo obrigado a reestruturar a parcela convertida em 'eurobonds', e viu os seus parceiros de cooperação suspenderem o apoio ao OE em 2016.
Impactos da pandemia
Entretanto, para aliviar "pressões fiscais", agravadas pelo impacto da pandemia da Covid-19, o ministro da Economia e Finanças anunciou que Governo moçambicano vai usar um saldo de 190,8 milhões de euros de mais-valias que obteve em 2019.
"Vamos tirar os 14 mil milhões de meticais [190,8 milhões de euros] para fazer face a pressões fiscais", afirmou o ministro Adriano Maleiane.
Esse valor é parte de um montante de 880 milhões de dólares (803,9 milhões de euros) que o Executivo moçambicano arrecadou no final de 2019 com a venda das participações que a Anadarko detinha nos blocos de gás natural da Área 1 da bacia do Rovuma, Norte de Moçambique, à Occidental, que depois alienou essa parcela à francesa Total.
Moçambique: O abecedário das dívidas ocultas
A auditoria independente de 2017 às dívidas ocultas não revela nomes. As letras do abecedário foram usadas para os substituir. Mas pelas funções chega-se aos possíveis nomes. Apresentamos parte deles e as suas ações.
Foto: Fotolia/Africa Studio
Indivíduo "A"
Supõe-se que Carlos Rosário seja o indivíduo "A" do relatório da Kroll. Na altura um alto quadro da secreta moçambicana que se teria recusado a fornecer as informações solicitadas pelos auditores da Kroll alegando que eram "confidenciais" e não estavam disponíveis. Rosário foi detido em meados de fevereiro no âmbito das dívidas ocultas. Há inconsistências nas informações fornecidas pelo indivíduo.
Foto: L. Meneses
Indivíduo "B"
Andrew Pearse é ex-diretor do banco Credit Suisse, um dos dois bancos que concedeu os empréstimos. No relatório da Kroll é apontado como um dos envolvidos nos contratos de empréstimos originais entre a ProIndicus e o Credit Suisse. De acordo com a justiça dos EUA, terá recebido, juntamente com outros dois ex-colegas, mais de 50 milhões de dólares em subornos e comissões irregulares.
Foto: dw
Indivíduo "C"
Manuel Chang, ex-ministro das Finanças, assinou as garantias de empréstimo em nome do Governo moçambicano. Admitiu à auditoria que violou conscientemente as leis do orçamento ao aprovar as garantias para as empresas moçambicanas. Alega que funcionários do SISE convenceram-no a fazê-lo, alegando razões de segurança nacional. Hoje é acusado pela justiça dos EUA de ter cometido crimes financeiros.
Foto: Getty Images/AFP/W. de Wet
Indivíduo "D"
Maria Isaltina de Sales Lucas, na altura diretora nacional do Tesouro, terá coadjuvado o ministro das Finanças Manuel Chang, ou indivíduo "C", na arquitetura das dívidas ocultas. No Governo de Filipe Nyusi foi vice-ministra da Economia e Finanças, mas exonerada em fevereiro de 2019. Segundo o relatório, terá recebido 95 mil dólares pelo seu papel entre agosto de 2013 e julho de 2014 pela Ematum.
Foto: P. Manjate
Indivíduo "E"
Gregório Leão foi o número um do SISE, os Serviços de Informação e Segurança do Estado. O seu nome é apontado no relatório da Kroll e foi detido em fevereiro passado em conexão com o caso das dívidas ocultas.
Foto: Ferhat Momad
Indivíduo "F"
Acredita-se que Lagos Lidimo, diretor do SISE, Serviços de Informação e Segurança do Estado, desde janeiro de 2017, seja o indivíduo "F". Substituiu Gregório Leão, o indivíduo "E". Na altura disse que não tinha recebido "qualquer registo relacionado as empresas de Moçambique desde que assumiu o cargo." A ONG CIP acredita que assumiu essa posição para proteger Filipe Nyusi, hoje chefe de Estado.
Foto: Ferhat Momad
Indivíduo "K"
Salvador Ntumuke é ministro da Defesa desde de 2015. Diz que não recebeu qualquer registo relacionado com as empresas moçambicanas desde que assumiu o cargo. O relatório da Kroll diz que informações fornecidas pelo Ministério da Defesa, Ematum e a fornecedores de material militar não coincidem. Em jogo estariam 500 milhões de dólares. O ministro garante que não recebeu dinheiro nem equipamento.
Foto: Ferhat Momad
Indivíduo "L"
Víctor Bernardo foi vice-ministro da Planificação e Desenvolvimento no Governo de Armando Guebuza. E na qualidade de presidente do conselho de administração da ProIndicus, terá assinado os termos e condições financeiras para a contratação do primeiro empréstimo da ProIndicus ao banco Credit Suisse, juntamente com Maria Isaltina de Sales Lucas.
Foto: Ferhat Momade
Indivíduo "R"
Alberto Ricardo Mondlane, ex-ministro do Interior, terá assinado em nome do Estado o contrato de concessão da ProIndicus, juntamente com Nyusi, Chang e Rosário. Um email citado pela justiça dos EUA deixa a entender que titulares de alguns ministérios moçambicanos envolvidos no caso, entre eles o do Interior, iriam querer a sua "fatia de bolo" enquanto estivessem no Governo.
Foto: DW/B . Jaquete
Indivíduo "Q"
Filipe Nyusi, na altura ministro da Defesa, seria identificado como indivíduo "Q" no relatório. Uma carta publicada em 2019 pela imprensa moçambicana revela que Nyusi terá instruído os responsáveis da Ematum, MAM e ProIndicus a fazerem o empréstimo. Afinal, parte dessas empresas estavam sob tutela do seu ministério. Hoje Presidente da República, Nyusi nunca esclareceu a sua participação no caso.
Foto: picture-alliance/Anadolu Agency/M. Yalcin
Indivíduo "U"
Supõe-se que Ernesto Gove, ex-governador do Banco de Moçambique, seja o indivíduo "U". Terá sido uma das entidades que autorizou a contração dos empréstimos. E neste contexto, em abril de 2019 foi constituído arguido no processo judicial sobre as dívidas ocultas. Entretanto, em 2016 Gove terá dito que não tinha conhecimento do caso das dívidas. (galeria em atualização)