O Ministério da Economia e Finanças de Moçambique diz que os municípios são parcialmente responsáveis pelos cortes orçamentais. Maputo acusa as autarquias de falharem na coleta e gestão das receitas locais.
Publicidade
Pode não ter fim à vista a crise financeira que se vive em alguns municípios - principalmente na província de Nampula - maioritariamente geridos pela Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO). Em causa está o corte dos orçamentos dos Fundos de Investimento Autárquico (FIA) e de Compensação Autárquica (FCA).
A vice-ministra moçambicana da Economia e Finanças, Carla Louveira, disse nesta sexta-feira (90.07) que a canalização dos fundos para o funcionamento dos municípios também depende do desempenho dos mesmos na coleta de receitas locais e no envio ao Governo central para redistribuição.
"A canalização depende também do ciclo orçamental, portanto, da coleta dos fundos proveniente das receitas por parte daqueles (municípios) que devem canalizar o fundo e consequentemente a sua canalização aos beneficiários (redistribuição aos municípios), portanto, é um processo", explicou a ministra numa deslocação a Nampula.
Nenhuma explicação para os cortes
Carla Louveira admitiu que o Governo central cortou fundos aos municípios, mas não explicou, em concreto, as motivações que levaram à redução das verbas, limitando-se a adiantar que os cortes estão previstos no Orçamento de Estado. A ministra também não revelou se estão a ser tomadas medidas para ultrapassar a crise financeira das autarquias.
Publicidade
O analista financeiro Miguel Teodósio considera que os problemas das autarquias resultam da falta de domínio de instrumentos legais de finanças públicas. "As pessoas que estão adstritas a essas instituições pensam que as receitas que são canalizadas pelo órgão central e finanças caem do céu", disse Teodósio à DW África. "Mas esses recursos financeiros que são canalizados aos municípios e para todas as instituições do Estado são fruto de coleta feita pelas instituições que arrecadam algumas receitas financeira. Por outras palavras: as receitas arrecadadas pelo município devem ser canalizadas para o órgão central, para serem redistribuídos para outros órgãos".
Crise financeira das autarquias perpetua-se
O analista antevê um futuro financeiramente difícil para as autarquias: "Acredito que a situação pode piorar, pois o Ministério das Finanças já tem uma justificação clara. Basta dizer que não consegue canalizar esses recursos por causa da pandemia e o assunto logo fica justificado", disse.
Apesar de apurar responsabilidades junto das autarquias, o analista estranha o facto de a crise financeira estar a ocorrer maioritariamente nos municípios geridos pela oposição e quase num silêncio absoluto aos pertencente do governo da FRELIMO. Realça que quando há reclamações, geralmente provêm de municípios geridos pela RENAMO. "Não sei se os municípios que estão do lado do partido no poder não reclamam simplesmente por simpatia, ou porque não estão a ser drenados valores para o seu funcionamento", concluiu.
A DW África tentou, sem sucesso, contactar as autoridades municipais de Nampula.
Custo de vida aumenta em Inhambane
Em Moçambique, a crise económica afetou a vida de comerciantes e clientes, que reclamam dos altos preços. Saiba como os moçambicanos na província de Inhambane, no sul do país, sobrevivem apesar da crise.
Foto: DW/L. da Conceição
"Estamos cansados"
Os moçambicanos e, em particular, os residentes da província de Inhambane, estão ansiosos para ver o fim da crise financeira que o país atravessa, também relacionada com a desvalorização do metical, a moeda local. Manuel Santos, um vendedor de chinelos femininos nas ruas da cidade de Maxixe, conta-nos que está cansado de passar horas a trabalhar debaixo do sol, exposto a vários perigos.
Foto: DW/L. da Conceição
Buscar sustento para a família
António Macicame, residente de Inhambane, fabrica cestos de palha para conseguir algum dinheiro que o permita sustentar a sua família. São ao todo cinco pessoas. Ele diz que não tem sido fácil conseguir vender os seus cestos e por isso circula nas ruas e avenidas para conquistar os clientes.
Foto: DW/L. da Conceição
Onde estão os clientes dos supermercados?
Os clientes desapareceram das lojas e supermercados nestes últimos anos devido ao elevado custo de vida. As compras diminuíram consideralvemente e os supermercados são apenas frequentados pelas famílias quando fazem compras para cerimónias especiais. Muitos preferem comprar nas ruas.
Foto: DW/L. da Conceição
Roupas em segunda mão
Em várias partes da cidade, nos passeios e nas calçadas, há roupas em segunda mão à venda. Por causa do aumento dos preços das roupas importadas da Europa e Ásia, os habitantes de Inhambane passaram a frequentar menos as boutiques modernas, comprando mais roupas usadas. Uma peça usada pode ser vendida por menos de um euro. Já nas boutiques, o preço mínimo é de 10 euros.
Foto: DW/L. da Conceição
Menos pão na mesa
Também várias padarias estão vazias e sem clientes nos balcões. Muitas famílias têm optado por consumir produtos mais frescos e nutritivos, como a mandioca e a batata doce, substituindo o pão na mesa, por estar cada vez mais caro.
Foto: DW/L. da Conceição
Os vários preços do frango
O frango ainda é o prato preferido de muitas pessoas na província de Inhambane, mas os preços variam. O preço mínimo é de cerca de 280 meticais e nas zonas rurais chega a custar 400 meticais, ainda vivo. Preparado nos restaurantes, um prato de frango custa no mínimo 500 meticais. Jovens e senhoras viram uma oportunidade de negócio em vender frangos vivos para terceiros nas ruas e quintais.
Foto: DW/L. da Conceição
Compra-se menos
Devido à crise, compra-se menos produtos de primeira necessidade nas várias comunidades circunvizinhas às cidades. Antes, as viaturas que partiam voltavam cheias, mas atualmente poucos comerciantes vão até às cidades para fazer grandes compras.
Foto: DW/L. da Conceição
Crise na hotelaria e turismo
A hotelaria e o turismo têm sido fundamentais para o desenvolvimento. O Governo moçambicano afirma que houve melhoras nos últimos dois anos. Mas, na realidade, o cenário que se nota é de um fraco número de clientes. Há hotéis que não recebem mais de dez hóspedes no período de um mês - mesmo oferecendo preços promocionais. Por isso, acabam por demitir muitos dos seus trabalhadores.
Foto: DW/L. da Conceição
Crise nos transportes
Muitas pessoas já não viajam com regularidade. Hoje, delega-se alguém de confiança até mesmo para se receber os salários nos distritos onde não há bancos. O objetivo é poupar o dinheiro dos transportes. Os transportadores, por sua vez, dizem que as suas receitas diárias baixaram em 50%.
Foto: DW/L. da Conceição
Salões de beleza vazios
Salões de beleza tem sido caraterizados pelo fraco movimento de clientes. O aumento do custo de vida - e também dos preços de produtos de beleza - afetou a vida de muitas mulheres. Elas poupam dinheiro para comprar produtos da primeira necessidade e já não frequentam salões de beleza como antes. Para essas mulheres o dilema é: comer ou viver de beleza?
Foto: DW/L. da Conceição
"Não é tempo de cruzar os braços"
Cecília Jasse vende bolinhos e pão, juntamente com outras senhoras no mercado central na cidade de Maxixe. Enquanto o seu marido é trabalhador sazonal numa empresa, ela compra pão numa das padarias locais para revender. Acorda de madrugada para fritar bolinhos e diz que não quer ficar em casa à espera do marido. Para ela, "não é tempo de cruzar os braços".