Instituições do Estado em Quissanga encerradas após ataques
Lusa
9 de julho de 2020
O administrador de Quissanga, na província de Cabo Delgado, anunciou que as instituições do Estado do distrito estão encerradas devido à violência armada no norte de Moçambique. "O nosso arquivo ficou todo destruído".
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"Tivemos ações de grupos terroristas e por razões óbvias não é possível retomarmos as nossas atividades no distrito", declarou Bartolomeu Muibo, citado pelo canal televisivo STV.
O distrito de Quissanga, cuja vila sede localiza-se a 115 quilómetros de Pemba, capital provincial de Cabo Delgado, está entre os mais afetados pela violência armada que tem sido protagonizada por insurgentes desde outubro de 2017.
O último ataque em Quissanga foi registado na madrugada do dia 25 de março, quando insurgentes invadiram o distrito, obrigando parte da população daquela região costeira a fugir, a pé ou de barco, para o arquipélago das Quirimbas, a 14 quilómetros, enquanto outras procuraram refúgio em Pemba.
Vítimas de ataques em Cabo Delgado em fuga pela vida
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A caminhada a pé é possível na maré baixa, por entre o mangal que separa Ibo de Quissanga, e é no meio do mangal que a população esteve escondida, segundo relatos de fontes locais ouvidas pela Lusa, na ocasião.
Os insurgentes destruíram várias infraestruturas do Estado, incluindo as do governo distrital."O nosso arquivo ficou todo destruído e agora estamos a tentar recuperar a partir das informações que existem ao nível do governo provincial", acrescentou Bartolomeu Muibo.
Ameaças do Estado Islâmico
No mesmo dia em que o ataque foi registado, elementos armados com a bandeira do grupo jihadista Estado Islâmico (EI) distribuíram fotografias na internet em edifícios ocupados da vila de Quissanga e um vídeo em que anunciavam que pretendem impor "a lei islâmica na região".
Quissanga foi invadida 48 horas após os grupos terem estado na vila de Mocímboa da Praia, onde atacaram um quartel e içaram a sua bandeira, tendo permanecido na vila sede por quase um dia.
A região de Quissanga já tinha sido massacrada por ataques no final de janeiro, levando à destruição de parte do Instituto Agrário de Bilibiza, gerido pela Fundação Aga Khan.
Cabo Delgado, província onde avança o maior investimento privado de África para exploração de gás natural, está sob ataque desde outubro de 2017 por insurgentes, classificados desde o início do ano pelas autoridades moçambicanas e internacionais como uma ameaça terrorista.
As incursões de grupos armados nos últimos dois anos e meio naquela província já provocaram a morte de, pelo menos, 700 pessoas.
As Nações Unidas estimam que os ataques armados na província provocaram uma crise humanitária que afeta 211.000 pessoas.
O que é o Estado Islâmico?
As origens do grupo terrorista remontam à invasão americana do Iraque, em 2003. Nasceu como oposição sunita ao domínio xiita. Inicialmente chamou-se "Estado Islâmico do Iraque e do Levante" e virou ameaça internacional.
Foto: picture-alliance/AP Photo
A origem do "Estado Islâmico"
A trajetória do "Estado Islâmico" (EI) começou em 2003, com o derrube do ditador iraquiano Saddam Hussein pelos EUA. O grupo surgiu da união de diversas organizações extremistas sunitas e grupos leais ao antigo regime, que lutavam contra a ocupação americana e contra o domínio dos xiitas no Governo do Iraque.
Foto: picture-alliance/AP Photo
Braço da Al-Qaeda
A insurreição tornou-se cada vez mais radical, à medida que fundamentalistas islâmicos liderados pelo jordaniano Abu Musab al Zarqawi (foto), fundador da Al-Qaeda no Iraque (AQI), infiltraram as suas alas. Os militantes liderados por Zarqawi eram tão cruéis que tribos sunitas no Iraque ocidental se aliaram às forças americanas, no que ficou conhecido como "Despertar Sunita".
Foto: picture-alliance/dpa
Aparente contenção
Em junho de 2006, as Forças Armadas dos EUA mataram Zarqawi numa ofensiva aérea. Foi então sucedido por Abu Ayyub al-Masri e Abu Abdullah ar-Raschid al-Baghdadi (ambos mortos em 2010). A Al-Qaeda no Iraque (AQI) mudou de nome para Estado Islâmico do Iraque (EII). Nos anos seguintes, Washington intensificou a sua presença militar no país.
Foto: picture-alliance/Photoshot
Regresso dos jihadistas
Após a retirada das tropas dos EUA do Iraque, efetuada entre junho de 2009 e dezembro de 2011, os jihadistas começaram a reagrupar-se, tendo como novo líder Abu Bakr al-Bagdadi, que teria convivido e atuado com Zarqawi no Afeganistão. Ele rebatizou o grupo militante sunita como Estado Islâmico do Iraque e do Levante (EIIL).
Foto: picture alliance/dpa
Ruptura com Al-Qaeda
Em 2011, quando a Síria mergulhou na guerra civil, o Estado Islâmico atravessou a fronteira para participar da luta contra o Presidente Bashar al-Assad. Os jihadistas tentaram uma fusão com a Frente Al Nusrah, outro grupo da Síria associado à Al-Qaeda. Isso provocou uma ruptura entre o EI e a central da Al-Qaeda no Paquistão, pois o líder desta, Ayman al-Zawahiri, rejeitou a manobra.
Foto: dapd
Ascensão do "Estado Islâmico"
Apesar do desentendimento com a Al-Qaeda, o EI fez conquistas significativas na Síria, combatendo tanto as forças de Assad quanto rebeldes moderados. Após estabelecer uma base militar no nordeste do país, lançou uma ofensiva contra o Iraque, tomando a sua segunda maior cidade, Mossul, a 10 de junho de 2014. Nesse momento o grupo já tinha sido novamente rebatizado, desta vez como "Estado Islâmico".
Foto: picture alliance / AP Photo
Importância de Mossul
A tomada da metrópole iraquiana de Mossul foi significativa, tanto do ponto de vista estratégico quanto económico. Ela é um importante ponto de convergência dos caminhos para a Síria. Com a tomada de Mossul, o EI também conquistou 429 milhões de dólares na filial local do Banco Central do Iraque. Assim sendo, o Daesh - como é conhecido em árabe - tornou-se um dos grupos terroristas mais ricos.
Foto: Getty Images
O califado do EI
Além das áreas atingidas pela guerra civil na Síria, o EI avançou continuamente pelo norte e oeste iraquianos, enquanto as forças federais de segurança entravam em colapso. No fim de junho de 2014, a organização declarou um califado, um estado islâmico que atravessa a fronteira sírio-iraquiana e faz lembrar os califados muçulmanos históricos. Abu Bakr al-Bagdadi foi apresentado como "califa".
Foto: Reuters
As leis do "califado"
Abu Bakr al-Bagdadi impôs uma forma implacável da sharia, a lei tradicional islâmica, com penas que incluem mutilações e execuções públicas. Membros de minorias religiosas, como cristãos e yazidis, deixaram a região do "califado". Muitos foram executados, mulheres violadas e vendidas como escravas a jihadistas do EI. Os xiitas também têm sido alvo de perseguição.
Foto: Reuters
Guerra contra o património histórico
O EI já destruiu tesouros arqueológicos milenares em cidades como Palmira (foto), na Síria, ou Mossul, Hatra e Nínive, no Iraque. O EI diz que as esculturas antigas entram em contradição com a sua interpretação radical dos princípios do Islão. Especialistas afirmam, porém, que o grupo vende ilegalmente estátuas pequenas no mercado internacional, enquanto as maiores são destruídas.
Foto: Fotolia/bbbar
Ameaça terrorista
Nas suas ofensivas armadas, o grupo tem saqueado centenas de milhões de dólares em dinheiro e ocupado diversos campos petrolíferos no Iraque e na Síria. Os seus militantes também se apoderaram de armamento militar de fabrico americano das forças governamentais iraquianas, obtendo, assim, poder de fogo adicional. Seguidores da ideologia do EI perpetraram vários atentados terroristas na Europa.