Os ataques armados estão a ter um impacto negativo no investimento estrangeiro, reconhece o representante da Câmara de Comércio da Alemanha em Maputo. Mas Friedrich Kaufmann espera que a situação não dure muito tempo.
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O representante da Câmara de Comércio da Alemanha para a África Austral em Maputo recorda que a Anadarko, petrolífera que opera no setor do gás na Bacia do Zambeze, província nortenha de Cabo Delgado, já anunciou a retirada de parte do seu pessoal, porque já é um lugar perigoso. Há empresas alemãs que fornecem equipamentos à Anadarko. Por isso, os ataques deixam os investimentos germânicos parcialmente comprometidos.
Na última semana, em Chemnitz, no leste da Alemanha, conversámos sobre o tema com Friedrich Kaufmann à margem de um seminário sobre recursos minerais em Moçambique. Falámos ainda sobre o empresariado alemão em Moçambique e os entraves relativos ao ambiente de negócios.
DW África: Uma das queixas dos investidores em Moçambique, não só dos estrangeiros, é sobre o ambiente de negócios. Queixam-se de dificuldades para abrir negócios, da corrupção, entre outros problemas. Membros da sua organização já experimentaram esses problemas?
Moçambique: Investidores alemães afetados pelos ataques
Friedrich Kaufmann (FK): A minha organização não, mas as empresas sim. E nós, como câmara, como lobby do setor privado, estamos em contacto com a Câmara da Indústria e Comércio, que atualmente está a trabalhar numa estratégia de melhoramento de negócios. Estamos a fornecer inputs, comentários, [e a apresentar] problemas, para contribuir para a sua solução. Outra iniciativa que me parece muito importante para Moçambique, juntamente com a nossa Câmara da Alemanha, é que formamos uma plataforma de trabalho a nível europeu, com suíços, italianos, espanhóis, etc., e gostaríamos de criar uma task force sob liderança do MIC [Ministério da Indústria e Comércio] em Maputo, que se reúne para resolver problemas de investidores que estão em Moçambique e que têm problemas com o ambiente de negócios, corrupção ou falta de coordenação. E antes de viajar para a Alemanha, para Chemnitz, tivemos um encontro com o ministro da Indústria e Comércio, Ragendra de Sousa, para lançar a ideia da task force. Depois vamos reunir-nos para concretizar as coisas.
DW África: Na sua opinião, quais são os desafios que o mercado moçambicano ainda tem de ultrapassar para atingir os níveis desejados no que se refere ao ambiente de negócios e a relação com outros investidores?
FK: A questão é bem complexa, porque se podem discutir vários pontos. Mas, para além da infraestrutura e do pessoal técnico, são logicamente problemas de ambiente de negócios, para além da crise financeira atual. Então, o ambiente de negócios é um tema muito importante, porque sobretudo as pequenas e médias empresas estão a sofrer bastante devido a um ambiente menos favorável.
DW África: E desde que está em Moçambique (há cerca de três anos) já viu alguma evolução?
FK: Sim, há sempre pontos fortes e mais fracos, mas, lamentavelmente, se virmos os indicadores que todo o mundo conhece, como o Doing Business e outros, lamentavelmente não havia uma tendência positiva, era mais um up and down [altos e baixos]. Mas, em geral, os problemas que já conhecemos há mais de vinte anos ainda continuam.
DW África: Relativamente a instabilidade que se vive no norte de Moçambique, acredita que isso pode influenciar negativamente o interesse do empresariado alemão em arriscar no país?
FK: O alemão, como disse, [é afetado] indiretamente como fornecedor [das petrolíferas que lá operam]. Por exemplo, a Anadarko, uma das empresas que está no lead [na dianteira] para a exploração já anunciou que retirou algum pessoal da zona onde eles vão trabalhar, porque já é perigoso e é a zona onde há aquele problema de terrorismo. Isso vai atrasar e até parar os trabalhos e os investimentos. Não vamos esperar que seja por muito tempo, mas para já é um impacto negativo.
Um olhar lusófono sobre "a cidade" em exposição na Alemanha
Exposição "O Estado das Coisas" apresenta obras de artistas lusófonos no Instituto Camões, em Berlim. Em foco, a relação entre aspetos económicos e artísticos urbanos.
Foto: DW/C. Vieira Teixeira
Ironia moçambicana
Esta é uma das obras na exposição "O Estado das Coisas". É do moçambicano Jorge Dias e consiste numa montagem de cartões de telemóvel e insetos em arame, "feitos segundo uma técnica quase popular de Moçambique", diz o curador João Silvério. "A peça tem uma ironia muito especial. 'Bem vindo' a este mundo do consumo. Mas, ao mesmo tempo, há dois insetos que parecem estar ali a roer alguma coisa."
Foto: DW/C. Vieira Teixeira
Espírito revolucionário
A fotografia "Hotel da Praia Grande (O Estado das Coisas)", de Ângela Ferreira, cujo subtítulo dá nome à exposição, refere-se ao filme do diretor alemão Wim Wenders, de 1982. A foto, de 2003, é uma metáfora do mais representativo ícone da Revolução dos Cravos, "numa altura em que o espírito revolucionário do 25 de Abril está a começar a dissipar-se e a ser esquecido na sociedade portuguesa."
Foto: Ângela Ferreira
Crítica ao pós-revolução
Nascida em Moçambique, Ângela Ferreira é portuguesa e sul-africana. "Estou a fazer um comentário irónico, porque se anunciava já um desgaste do processo revolucionário em Portugal", diz. De lá para cá, o desgaste "veio a agravar-se". "Com a entrada de Portugal na UE, transforma-se num país neoliberal, com um capitalismo furioso e que se tem vindo a agravar mais nos últimos cinco anos", considera.
Foto: DW/C. V. Teixeira
Sem Nome
Um corpo caído na galeria. A escultura "Sr. Central", do artista português Noé Sendas faz parte da série intitulada "Nameless" ("Sem Nome", em português). Sendas considera "natural" a exposição conjunta de obras de artistas lusófonos, porque tem "uma relação pessoal e temporal com os autores que estão aqui. Vivemos todos na mesma época. Vivemos coisas em comum. Expusemos muito em comum".
Foto: DW/C. V. Teixeira
Desconforto e inquietação
Para Noé Sendas, a cena que a presença de sua escultura cria "não é automaticamente entendida como obra" pelo público. "Quando entra aqui, não sabe se é uma escultura, se é uma pessoa, o que é. Essa inquietação interessa-me. Mais do que criar uma peça, é criar uma relação com o expetador," revela.
Foto: DW/C. V. Teixeira
Espaços urbanos, espaços de transição
A série de gravuras do artista Julião Sarmento "traz consigo, não só, a figura feminina, mas uma série de relações espaciais em que a própria noção de casa, de corpo e de transcrição estão presentes", relata o curador da exposição. As obras reunidas na exposição têm como língua comum "os espaços habitados, que são espaços de transição, que são espaços urbanos. Sejam grandes ou pequenas cidades".
Foto: DW/C. Vieira Teixeira
Arte e economia
A ideia da exposição é abordar aspetos económicos e artísticos urbanos a partir de obras de artistas lusófonos do acervo da Fundação portuguesa PMLJ. "Simbolicamente, o contexto económico é uma imagem não só do mundo da arte, como do mundo da economia e das trocas sociais", avalia o curador João Silvério. Assim, tentou-se "dar um 'ar do tempo' em que vivemos e tentar abrir um campo de reflexão".
Foto: DW/C. Vieira Teixeira
Sociedade em foco
A exposição apresenta ainda obras de Ana Rito, Cecília Costa, Isabel Carvalho, Pedro Barateiro e Filipa César, autora da foto "Marlboro Triumph" ("O Triunfo da Malboro", em português), feita em Berlim, em que se vê uma propaganda dos cigarros Marlboro ao lado de uma propaganda de soutiens da marca Triumph. "Faço uma relação com os cowboys [e uma sociedade] machista e colonizadora", relata Filipa.
Foto: DW/C. Vieira Teixeira
O olhar do público
Visitantes interagem durante a abertura da exposição "O Estado das Coisas", em Berlim. A visitante espanhola Amparo Rapela diz que gostou das fotografias e "mais especialmente das gravuras" de Julião Sarmento. "Vou para casa com uma impressão positiva," finaliza. A exposição está patente no Instituto Camões, em Berlim, até 14 de setembro de 2018 e tem entrada livre.