Justiça começa a julgar suspeitos de desvio milionário
Leonel Matias (Maputo)
12 de setembro de 2017
Em Moçambique, 28 pessoas são acusadas de desviar 170 milhões de meticais (2,3 milhões de euros) do Fundo de Desenvolvimento Agrário (FDA), no processo com mais réus da história do país.
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Teve início nesta terça-feira (12.09.), em Moçambique, o julgamento do caso de desfalque de verba do Fundo de Desenvolvimento Agrário. O Ministério público pediu indemnização cível e confisco dos bens dos acusados.
No total, 28 acusados estão a ser julgados no Tribunal Judicial da Cidade de Maputo. Eles são indiciados de envolvimento no caso de desfalque de cerca de 170 milhões de meticais (2,3 milhões de euros) destinados à agricultura. Posteriormente, outros dois réus devem ser julgados e mais outros dois foram despronunciados.
Segundo o despacho de acusação apresentado pelo Ministério Público, os acusados vão responder por mais de 330 infrações. Os crimes arrolados estão relacionados com corrupção, burla por defraudação, abuso de cargo ou função, pagamento de remunerações indevidas, branqueamento de capitais, peculato e associação para delinquir de forma continuada.
A audição dos réus começa nesta quarta-feira
Setina Titosse, ex-Presidente do Fundo de Desenvolvimento Agrário (FDA), é considerada a arquiteta do caso de desfalque. Sobre ela recaem um total de 80 crimes. Titosse afirma, no entanto, ser inocente. "Está tudo bem. Espero que eles provem tudo que estão a dizer. Ainda gozo de inocência. Sinto-me inocente, bastante. Não estão reunidas as provas", falou a acusada num encontro com jornalistas, à entrada da sala de julgamento.
Em Moçambique, milhões são desviados do Fundo de Desenvolvimento Agrário
São ainda indiciados de envolvimento no caso de desfalque alguns antigos gestores da instituição, contabilistas, engenheiros agrónomos, um técnico aduaneiro, empresários e um cidadão do Uganda. Parte considerável dos fundos provenientes do desfalque teriam sido aplicados no ramo imobiliário, sobretudo em zonas turísticas.
A sessão desta terça-feira foi dedicada à leitura da acusação, com o Ministério Público a acusar os réus de terem simulado financiamentos a projetos agropecuários forjados para beneficiarem das verbas desviadas. Num documento com 64 páginas, a acusação visou principalmente a ex-presidente da FDA, entidade tutelada pelo Ministério da Agricultura, acusando-a de ter mobilizado familiares, amigos e terceiros para a abertura de contas bancárias usadas para drenar o dinheiro.
Os acusados respondem em liberdade, após serem beneficiados com "habeas corpus". Eles também pagaram caução e assinaram termo de identidade e residência, modalidades previstas no Código Penal e na Constituição da República.
Moçambique: centenas de pessoas marcham contra a situação política e económica
Centenas de moçambicanos marcharam no dia 18 de junho de 2016 em Maputo contra a situação política e económica do país. A manifestação foi convocada pela sociedade civil para exigir esclarecimentos ao Governo.
Foto: picture alliance/dpa/A. Silva
Pela Avenida Eduardo Mondlane rumo à Praça da Independência
"Pelo direito à esperança" foi o mote da manifestação que reuniu centenas de pessoas no centro de Maputo, no sábado dia 18 de junho de 2016. Os manifestantes exigem o fim do conflito político-militar entre o Governo da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) e a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), o esclarecimento da dívida pública e mais liberdade de expressão.
Foto: picture alliance/dpa/A. Silva
"A intolerância política mata a democracia"
Em entrevista à DW África, Nzira de Deus, do Fórum Mulher, uma das organizações envolvidas, afirma que a liberdade dos moçambicanos tem sido muito limitada nos últimos meses. "É preciso deixar de intimidar as pessoas, deixarem as pessoas se expressarem de maneira diferente, porque eu acho que é isso que constrói o país. Não pode haver ameaças, não pode haver atentados", diz Nzira.
Foto: DW/L. Matias
De preto ou branco, manifestantes pedem paz
Com camisolas pretas e brancas e cartazes com mensagens de protesto, centenas de moçambicanos mostram o seu repúdio à guerra entre o Governo e a RENAMO, às dívidas ocultas e às valas comuns descobertas no centro do país. Num percurso de mais de dois quilómetros, entoaram cânticos pela liberdade e pela transparência.
Foto: DW/L. Matias
"Valas comuns são vergonha nacional"
Recentemente, foram descobertas valas comuns na zona central de Moçambique. Uma comissão parlamentar enviada ao local para averiguações nega a sua existência. Alguns dos corpos encontrados foram sepultados sem ter sido feita uma autópsia, o que dificulta o conhecimento das causas das suas mortes.
Foto: DW/L. Matias
"É necessário haver um diálogo político honesto e sincero"
Nzira de Deus considera que a crise política que Moçambique enfrenta prejudica a situação do país e defende que “haja um diálogo político honesto e sincero e que se digam quais são as questões que estão em causa". Para além da questão da dívida e da crise política, os manifestantes estão preocupados com as liberdades de expressão e imprensa.
Foto: DW/L. Matias
Ameaças não vão amedrontar o povo
No manifesto distribuído ao público e lido na estátua de Samora Machel, na Praça da Independência, as organizações da sociedade civil exigiram à Procuradoria-Geral da República uma auditoria forense à dívida pública. "Nós queremos que o ex-Presidente [Armando Guebuza] e o seu Governo respondam por estas dívidas", declarou Alice Mabota, acrescentando que as ameaças não vão "amedrontar o povo".
Foto: DW/L. Matias
Sociedade Civil presente
A manifestação foi convocada por onze organizações da sociedade civil moçambicana. Entre as ONGs que organizaram a marcha encontram-se a Liga dos Direitos Humanos (LDH), o Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE), o Observatório do Meio Rural, o Fórum Mulher e a Rede HOPEM.