Várias pessoas ganharam muito dinheiro durante os confrontos armados entre as forças governamentais e a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), o maior partido da oposição.
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Enquanto algumas pessoas morriam nos confrontos entre as forças governamentais e a guerrilha da RENAMO, principalmente na zona centro de Moçambique, alguns cidadãos ganhavam muito dinheiro na venda de vários produtos aos viajantes que aguardavam as colunas de escolta militar, a única forma segura de deslocação entre as regiões com segurança. A situação deu azo a negócios lucrativos.
A empresária no distrito de Changara, Odete Kany, disse à DW África que no tempo das escoltas militares o negócio floresceu: "Consegui levantar este bloco de três quartos suítes, coloquei janelas e alumínio, portas, mosaicos, mármore nos quartos. Tínhamos um bom movimento, porque tinha aqui viajantes que aguardavam as colunas militares", pelo que ganhava dinheiro principalmente com as refeições, faturando "diariamente entre 12 e 20 mil meticais" (entre 169 e 283 euros)", conta a empresária.
Mas, atualmente, com o calar das armas, a situação é diferente. Os clientes de outrora não existem e hoje fatura com refeições "entre 3 e 5 mil meticais" (entre 42 e 70 euros)".
No entanto, Odete Kany prefere lucrar menos mas ter mais tranquilidade: "não podemos dizer que a situação era melhor, porque os nossos irmãos morriam nas estradas".
No tempo das colunas faturava-se e bem
Lucas Trindade Lopes, agente económico que trabalha ao longo da Estrada Nacional 7, conta que durante o período do conflito armado conseguiu comprar alguns animais para criação que depois vendia.
"Comprei cabritos, porcos e galinhas que estou a criar lá em casa. No tempo das colunas faturámos e bem. Havia muito movimento de pessoas e vendia, por exemplo, duas caixas de água por dia", recorda Lucas Trindade Lopes. No entanto, "agora levamos uma semana para vender uma caixa", lamenta.
Também Américo João conseguiu emprego, embora de curta duração, durante a fase dos confrontos entre as tropas governamentais e a RENAMO e "estava a faturar mesmo". Américo João vendia recargas de telemóveis para os viajantes na vila Luenha e, por dia, faturava em média 6 mil meticais (cerca de 84 euros). Com o que conseguiu poupar, Américo João construiu duas casas e atualmente não trabalha para terceiros.
MMT / 21.07.17 Comércio fim das escoltas - neu - MP3-Mono
Apesar de tudo, Américo João está "feliz porque a coluna parou" com o fim dos confrontos armados.
Um agente económico na província de Manica, Xadreque Banda, refere que a situação económica era melhor no tempo das escoltas militares. Na altura, conseguiu construir a residência com que sonhava e hoje lamenta ter poucos clientes.
"Andavam a dormir aqui e aproveitava para fazer negócios. Claro que havia muito movimento", mas "no tempo das colunas militares conseguia um lucro maior", o que permitia, por exemplo, construir" casa.
20 Anos de Paz em Moçambique: Uma viagem
A 4 de outubro de 1992, FRELIMO e RENAMO assinaram o Acordo Geral de Paz, pondo fim a 16 anos de guerra civil em Moçambique. Apesar da paz, a guerra civil continua a marcar a vida de muitos moçambicanos.
Foto: Marta Barroso
A guerra presente todos os dias
A 4 de outubro de 1992, FRELIMO e RENAMO assinaram o Acordo Geral de Paz, pondo fim a 16 anos de guerra civil em Moçambique. Apesar da paz, a guerra civil continua a marcar a vida de muitos moçambicanos. Joula estava grávida de oito meses quando uma mina anti-pessoal lhe arrancou um pé em 1991. Na noite anterior, a RENAMO tinha atacado a aldeia e plantado minas em redor.
Foto: Marta Barroso
De armas a enxadas... ou cadeiras
Desde 1996, o projeto "Armas em Enxadas" dá um novo destino ao material bélico que destruiu milhares de vidas durante a guerra civil. O objetivo da iniciativa, lançada pelo Conselho Cristão de Moçambique, é criar, com as armas, obras de arte com mensagens de paz. Muitas peças foram encontradas pelo país, outras foram recolhidas a privados.
Foto: Marta Barroso
Ataques inesperados
São as mesmas armas que há 20 anos eram usadas para atacar seres humanos como estes refugiados em Chamanculo, perto da capital, Maputo, em 1992. Chamanculo nunca recuperou da chegada de milhares de refugiados da guerra civil. Ainda hoje, é um bairro pobre. Foi aqui que nasceram figuras ilustres do país como Maria de Lurdes Mutola.
Foto: DW/Cristina Krippahl
Ruas desertas em Maputo
A guerra, que se arrastou por 16 anos, atrasou o desenvolvimento do país. Também a vida social sofreu, até mesmo na capital. Engarrafamentos eram, durante a guerra e nos primeiros anos seguintes, algo raro como se pode ver nesta fotografia do centro de Maputo de 1992.
Foto: DW/Cristina Krippahl
Filhos da guerra
Em 1990, Moçambique era considerado o país mais pobre do mundo. Em 2011, ocupava o lugar 184 entre 187 Estados no Índice de Desenvolvimento Humano do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, PNUD. 20 anos depois de assinada a paz, os moçambicanos continuam a viver, em média, 50 anos.
Foto: DW/Cristina Krippahl
Filhos da paz
20 anos depois do Acordo Geral de Paz, ainda há muito que fazer no combate à pobreza em Moçambique. As províncias do Niassa, de Maputo, Cabo Delgado e Tete (na imagem) são, segundo o Programa da ONU para o Desenvolvimento, PNUD, as que têm maior incidência de pobreza no país.
Foto: Marta Barroso
Casa de Espera
Iniciativas como esta na aldeia de Vinho, no Parque Nacional da Gorongosa, província de Sofala, contribuem para diminuir a mortalidade infantil e materna. Atualmente, em Moçambique cerca de 500 mães morrem por cada 100 mil crianças nascidas vivas. Para evitar que isso aconteça na aldeia de Vinho, a Casa de Espera assiste as mulheres grávidas das redondezas na preparação dos partos.
Foto: Marta Barroso
Economia dominada por megaprojetos
A paz possibilitou megaprojetos, como o da exploração de carvão em Moatize, Tete. De futuro, a esperança é de que os rendimentos destes projetos beneficiem mais a população. Devido aos incentivos fiscais de que gozam as multinacionais ligadas a eles, o Estado moçambicano deixa de ganhar mais de 200 milhões de dólares por ano, segundo o Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE).
Foto: Marta Barroso
Carvão, a euforia de Tete
74 toneladas de carvão já estão carregadas nesta transportadora que pode levar até 400 toneladas. O carvão da província central de Tete tem vindo a atrair investidores nacionais e internacionais à procura do "El Dorado" que tem limitado a diversificação da economia nacional na segunda década de paz em Moçambique.
Foto: Marta Barroso
Cahora Bassa...
Durante a guerra civil, as linhas de transmissão de Cahora Bassa foram alvo de ataques da RENAMO. Hoje, a barragem funciona em pleno. Cahora Bassa tem uma capacidade instalada de 2.075 megawatts, a maior parte da energia é exportada para os países da região: 70% para a África do Sul e 5% para o Zimbabué. Apenas um quarto da eletricidade aqui produzida é consumida em Moçambique.
Foto: DW/M. Barroso
... um elefante branco para esta área do país?
Ainda há poucas casas em redor de Cahora Bassa com acesso regular à eletricidade. Para o economista moçambicano Carlos Castel-Branco do IESE, dever-se-iam estender as bases do desenvolvimento do país às aldeias e vilas em torno da barragem para que também aqui a vida económica se transformasse num elemento de estímulo para o investimento.
Foto: Marta Barroso
Gentes ligadas
A reabilitação das infraestruturas permite agora uma maior mobilidade e fomenta o comércio interno. A linha férrea de Sena liga a província de Tete, no interior de Moçambique, à cidade portuária da Beira. No tempo da guerra civil, foi encerrada e acabou por ser completamente destruída. Nos últimos anos, o corredor ferroviário foi reabilitado para escoar sobretudo o carvão da região de Tete.
Foto: Marta Barroso
Gentes apertadas
O comboio é um dos meios de transporte mais baratos em Moçambique. Em fevereiro de 2012, a Linha de Sena abriu a passageiros em toda a sua extensão. A reconstrução foi feita por troços e acabou por tomar muito mais tempo que o previsto, porque o consórcio indiano responsável pelas obras não cumpriu diversos prazos. Grande parte do dinheiro veio do Banco Mundial.
Foto: Marta Barroso
Há esperança em Moçambique
Idalina Melesse viajou de comboio pela primeira vez em 2012. Durante a guerra civil, os ataques impediram-na de se mover dentro do país. Desde então e até à reabertura da Linha de Sena, não tinha tido dinheiro para longas viagens. A Linha de Sena e outras infraestruturas não só unem moçambicanos, mas devolvem-lhes a liberdade de movimento e a facilidade de comunicação confiscadas pela guerra.