Em meio a contestações começa nesta terça-feira (05.12) em Nampula o II Congresso do MDM. Manuel de Araújo reconhece que há crise no MDM e discorda da sua estratégia, mas garante que a sua relação com o MDM "é boa".
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O II Congresso da segunda maior força da oposição em Moçambique, o Movimento Democrático de Moçambique (MDM), acontece em meio a contestação por parte de alguns munícipes de Nampula, na sequência do assassinato do edil da cidade, Mahamudo Amurane, em outubro passado. É que aquando da sua morte o edil estava de relações cortadas com o MDM. Como vai ser gerida essa tensão no Congresso? Manuel de Araújo é edil de Quelimane e membro do partido e espera ver essa e outras crises do MDM debatidas em Nampula
DW África:O que espera do II Congresso do MDM nesta fase delicada para o partido?
Manuel de Araújo (MA): Acho que os membros do MDM vão ter a oportunidade de discutir estes e outros assuntos e adotar uma estratégia sobre como gerir conflitos e que MDM nós queremos.
DW África: Acha que o MDM minimizou...
MA: Não foi o MDM que minimizou, foi a direção do MDM, porque no MDM há muita gente. E há muita gente que não concorda com a estratégia da direção como em qualquer partido democrático. Acho que onde há democracia não pode haver unicidade de pensamento. Não é o MDM, mas digo que é a direção e mesmo dentro dela são algumas pessoas. Também conhecemos outras pessoas que até fazem parte da comissão política que não concordam.
DW África: Como qualificaria a sua relação com o MDM, é uma relação saudável?
MA: É uma relação saudável, é uma relação boa, diria que é ótima. Mas há um ponto, é que as pessoas não estão habituadas a pessoas com ideias divergentes. E eu digo em público e em privado, discutimos e criamos o MDM e não foi por acaso que colocamos a letra D no meio, de democrático, que a FRELIMO não tem e nem os outros partidos. E o MDM deve ser um exemplo de democracia e nós vamos lutar para isso independentemente do preço que venhamos a pagar a curto, médio e longo prazo, incluindo...
DW África: Incluindo?
MA: Incluindo o que aconteceu [assassinatos] ou que está a acontecer com várias pessoas em Moçambique.
DW África: O MDM vai realizar o seu II Congresso em Nampula, um lugar onde há fortes contestações por parte de alguns munícipes. Como se sentem a ter de realizar o evento a contra-gosto de alguns?
MA: Eu sinto-me bem. Quem não deve estar a sentir-se bem é aquele que decidiu que o Congresso devia ser em Nampula. Nós tivemos uma reunião do conselho nacional [do MDM] no Chimoio e a comissão estabeleceu regras de candidatura, as províncias podiam candidatar-se para receber o Congresso. E nós até ao fim do prazo oficial estabelecido pela comissão política só uma província, que é a província da Zambézia, tinha apresentado a candidatura. Mas houve pessoas que não viram de bom tom que esse Congresso se realizasse [na Zambézia] e fizeram de tudo para que o Congresso fosse em Nampula. E o resultado é esse. Então, essas pessoas é que devem estar preocupadas. Eu estou tranquilíssimo.
04.12.17. Manuel Auarujo MDM Crise Congresso - MP3-Mono
DW África: Neste momento de relativa tensão como avaliaria a coesão no MDM?
MA: Já tinha dito na última entrevista que dei a DW que se tratava de uma crise de crescimento dentro do MDM e que era uma prova para a direção do MDM, era um desafio e era preciso que a direção mostrasse que sabe gerir conflitos. Infelizmente não concordei com a estratégia que a direção adotou, fiz uma carta que enderecei ao presidente Daviz Simango, com cópia para todos os membros da comissão política e para todos os membros do secretariado e para o presidente da mesa do conselho nacional, informando que me distanciava da estratégia que a direção do partido estava a tomar no caso Nampula e Mahamudo Amurane. Acho que se tivessem tomado em consideração os meus conselhos o MDM hoje não estaria onde está hoje, com uma crise clara no Município de Nampula onde foi assassinado o presidente, onde o substituto, o senhor Tocova acaba de ser afastado por causa de algumas atitudes tocovistas e hoje estamos numa situação em que há incerteza total e completa. Isso para mim é um indício de que ainda estamos na fase de crescimento, ainda temos muito que aprender em termos de gestão de conflitos, mas eu estou satisfeito porque isso tudo aconteceu antes do Congresso.
Moçambique: Assassinato de figuras incómodas é uma moda que veio para ficar
O preço de fazer valer a verdade, justiça, conhecimento ou até posições diferentes costuma ser a vida em Moçambique. A RENAMO é prova disso, no pico da tensão com o Governo da FRELIMO perdeu dezenas de membros.
Foto: BilderBox
Mahamudo Amurane: Silenciada uma voz contra corrupção e má governação
O edil da cidade de Nampula foi morto a tiros no dia 4 de outubro de 2017. Insurgia-se contra a má gestão da coisa pública e corrupção no seu Município. Foi eleito para o cargo de edil através do partido MDM. Embora mais de sessenta pessoas já estejam a ser ouvidas pela justiça não se conhecem os autores do crime.
Foto: DW/Nelson Carvalho Miguel
Jeremias Pondeca: Uma voz forte nas negociações de paz que foi emudecida
Foi alvejado mortalmente a tiro por homens desconhecidos no dia 8 de setembro de 2016 em Maputo quando fazia os seus exercícios matinais. O assassinato aconteceu numa altura delicada das negociações de paz. Pondeca era membro da Comissão Mista do diálogo de paz, membro do Conselho de Estado, membro sénior da RENAMO e antigo parlamentar. Até hoje a polícia não encontrou os autores do crime.
Foto: DW/L. Matias
Manuel Bissopo: O homem da RENAMO que escapou por um triz
No dia 4 de janeiro de 2016 foi baleado depois de uma conferência de imprensa do seu partido na Beira. Bissopo tinha acabado de denunciar alegados raptos e assassinatos de membros do seu partido e preparava-se para se deslocar para uma reunião da força de oposição quando foi baleado. A polícia moçambicana até hoje não encontrou os atiradores.
Foto: Nelson Carvalho
José Manuel: Uma das caras da ala militar da RENAMO que se apagou
Em abril de 2016 este membro do Conselho Nacional de Defesa e Segurança em representação da RENAMO e membro da ala militar do principal partido da oposição foi morto a tiro por desconhecidos à saída do aeroporto internacional da Beira. A questão militar é um dos pontos sensíveis nas negociações de paz. Os assassinos continuam a monte.
Foto: DW/J. Beck
Marcelino Vilanculos: Assassinado quando investigava raptos
Era procurador foi baleado no dia 11 de abril de 2016 à entrada da sua casa, na Matola. Marcelino Vilanculos investigava casos de rapto de empresários que agitavam o país na altura. O julgamento deste assassinato começou em outubro de 2017.
Foto: picture-alliance/Ulrich Baumgarten
Gilles Cistac: A morte foi preço pelo conhecimento divulgado?
O especialista em assuntos constitucionais de Moçambique foi baleado por desconhecidos no dia 3 de março de 2015 na capital Maputo. O assassinato aconteceu após uma declaração que fortaleceu a posição da RENAMO de gestão autónoma na sua querela com o Governo da FRELIMO. Volvidos mais de dois anos a sua morte continua por esclarecer.
Foto: A Verdade
Dinis Silica: Assassinado em circunstâncias estranhas
O juiz Dinis Silica também foi morto a tiro por desconhecidos, em 2014, em plena luz do dia, quando conduzia o seu carro na capital moçambicana. Na altura transportava uma avultada quantia de dinheiro, cuja proveniência é desconhecida. O juiz da Secção Criminal do Tribunal Judicial da Cidade de Maputo investigava igualmente casos de raptos. Os assassinos continuam a monte.
Foto: picture-alliance/dpa/U. Deck
Siba Siba Macuacua: Uma morte brutal em nome da verdade
O economista do Banco de Moçambique foi atirado de um dos andares do prédio sede do Banco Austral no dia 11 de agosto de 2001. Na altura investigava um caso de corrupção na gestão do Banco Austral. Siba Siba trabalhava na recuperação da dívida de milhões de meticais, resultante da má gestão do banco. Embora tenha sido aberta uma investigação sobre esta morte ainda não há esclarecimentos até hoje.
Foto: DW/M. Sampaio
Carlos Cardoso: O começo da onda de assassinatos
Considerado o símbolo do jornalismo investigativo em Moçambique, Carlos Cardoso foi assassinado a tiros a 22 de novembro de 2000. Na altura investigava a maior fraude bancária de Moçambique. O seu assassinato foi interpretado como um aviso claro aos jornalistas moçambicanos para que não interferissem nos interesses dos poderosos. Devido a pressões internacionais o caso chegou a justiça.