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Morte de Dhlakama provocou crise profunda na RENAMO

Lusa | bd
2 de maio de 2020

Analistas moçambicanos consideram que a morte de Dhlakama deixou a RENAMO numa crise profunda, porque líder da oposição não estava preparado para perder um "líder carismático" que dirigiu o partido como um "messias".

Wahlen Mosambik 15.10.2014 Afonso Dhlakama
Foto: AFP/Getty Images/Gianluigi Guercia

Afonso Dhlakama morreu em 03 de maio de 2018 na Serra da Gorongosa, vítima de doença, encerrando uma liderança que durou 39 anos.

"Ela [a RENAMO] está a afundar-se, mas é importante dizer que o principal responsável da situação da Renamo hoje é o próprio [Afonso] Dhlakama", afirmou o reitor da Universidade de Moçambique (UDM), Severino Ngoenha.

Este filósofo de formação considera que a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO) está dividida em duas alas: uma política, dirigida pelo líder eleito do movimento, Ossufo Momade, e outro militar, comandada pelo líder da autointitulada Junta Militar da RENAMO, Mariano Nhongo, que contesta o presidente da organização.

"Hoje, a RENAMO está claramente dividida, e essa divisão não é só entre Nhongo e Ossufo Momade", acrescentou aquele académico.

Nota-se, prosseguiu, que há um setor do partido que está no parlamento, e um outro que está nas zonas rurais. Ambos não se identificam um com o outro.

"Temos uma RENAMO do parlamento, com vencimentos e privilégios altos, e a Renamo confinada no interior, que está no campo", destacou o reitor da UDM.

RENAMO "deve distanciar-se da guerrilha"

Afonso Dhlakama antigo presidente da RENAMOFoto: António Cascais

Severino Ngoenha referiu que o estilo autocrático com que Afonso Dhlakama dirigiu o partido ao longo de 39 anos em que esteve à frente da organização minou a construção de uma linha de sucessão à altura da projeção nacional do partido e do seu estatuto de alternativa credível à Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO), partido no poder há 44 anos.

"Uma organização política não é uma organização de um individuo, não é de um messias, o chefe de um movimento é um primeiro entre iguais", observou Severino Ngoenha.

Com Ossufo Momade, não se vislumbra na RENAMO uma dinâmica de debate que permita que o partido se assuma como alternativa à FRELIMO, notou Ngoenha.

"E é pena, porque nós precisamos da RENAMO como um movimento forte e não como movimento de guerrilha, não como movimento de antigos combatentes", assinalou.

A solução, continuou, passaria por Ossufo Momade reinventar-se e afirmar o seu poder no partido ou pela emergência de um impulso reformador dado por uma ala jovem.

Mariano Nhongo é o líder da autoproclamada "Junta Militar" da RENAMOFoto: DW/A. Sebastiao

"Nhongo é um problema"

Por seu turno, o fundador e primeiro reitor da Universidade A Politécnica, a primeira privada do país, Lourenço do Rosário, considerou que a RENAMO não conseguiu ultrapassar o "luto" causado pela morte de Afonso Dhlakama, porque prevalecem fortes divergências internas.

"A RENAMO não fez o luto, politicamente, e militarmente tem Nhongo a morder-lhe os calcanhares, é um problema político que a RENAMO tem de resolver", declarou Lourenço do Rosário.

A organização e estruturas de direção da RENAMO assentavam em Afonso Dhlakama e a sua morte trouxe à superfície as fragilidades do partido, frisou Lourenço do Rosário.

O académico salientou que o atual líder da RENAMO não tem o carisma do seu antecessor, não tem autoridade sobre o braço armado do partido e errou ao apressar reformas na estrutura da organização, sem ter consolidado o poder.

"O facto de Ossufo Momade ter ido viver no quartel-general da RENAMO em Gorongosa era para fazer o trajeto propedêutico para poder ganhar a estrutura militar do partido até ao congresso, mas isso, na prática, não aconteceu, porque uma parte dos militares não o aceita como líder", observou Lourenço do Rosário.

O reitor de A Política avançou que alguns setores da RENAMO encararam Ossufo Momade como uma solução transitória até à eleição de um novo líder que iria suceder a Afonso Dhlakama, mas o atual presidente do partido acabou sendo escolhido com grande maioria em congresso.

Oposição forte

Ossufo Momade, atual presidente da RENAMOFoto: Getty Images/AFP/

Face à contestação à sua liderança, Ossufo Momade vai ter de encontrar formas de pacificar o partido, porque o país precisa de uma oposição unida e forte, para apresentar um projeto alternativo de governação.

"O próprio Ossufo Momade que se reinvente, porque ele foi eleito, é legitimo, ganhou o congresso, não fez nenhum golpe", ressalvou Lourenço do Rosário.

Sobre se a derrota expressiva que a RENAMO sofreu nas eleições gerais de outubro do ano passado reduz a legitimidade de Ossufo Momade, Lourenço do Rosário recordou que Afonso Dhlakama perdeu em todas as cinco eleições gerais em que participou, mas conseguiu sobreviver politicamente aos desaires.

O académico apontou a FRELIMO como um exemplo de superação de "luto e orfandade", lembrando que o partido conseguiu manter-se no poder, mesmo após a morte de líderes importantes.

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