Centenas de mulheres na província de Inhambane, sul de Moçambique, não tem acesso às suas terras. Razões familiares ou expropriação devido a megaprojetos costumam ser os empecilhos.
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Devido a desentendimentos familiares ou expropriações geradas por megaprojetos, mulheres estão a ser privadas do acesso a terras na província de Inhambane, sul de Moçambique. A denúncia foi feita por organizações da sociedade civil, que pedem uma intervenção rápida do Governo.
Rosa Azarias morava na cidade de Maputo. Mas, quando o marido faleceu, há mais de dez anos, regressou à sua terra natal, Maxixe. Ao retornar, um de seus irmãos a proibiu de voltar a morar na terra dos pais e chegou a ameaçá-la. "Não tenho ninguém que me ajude. A única pessoa que me ajudava é o meu irmão que morreu e outra irmã que está doente. Corro o risco de perder tudo”, conta Rosa, que agora mora na cidade de Maxixe numa casa alugada.
Ildetrude Namburete, pesquisadora do Centro Terra Viva em Inhambane, diz que este não é um caso único. A organização não-governamental, que presta assistência jurídica em questões ambientais e das terras, atende muitas mulheres que ficam sem acesso às terras a quais tinham direito na altura da morte dos maridos. "O maior problema é quando ela quer se casar de novo, aí ela pode perder estas terras porque é expulsa ", explica.
Além disso, a pesquisadora lembra que as mulheres são as maiores utilizadoras dos terrenos e por isso ressalta que "é preciso sensibilizar para que elas possam tomar decisões melhores, com práticas de gestão sustentável”.
Expropriações para megaprojetos
Centenas de mulheres não têm acesso às suas terras, de acordo com o Fórum Mulher de Inhambane. Além dos conflitos familiares, outro problema são as expropriações de terras devido à realização de megaprojetos, de acordo com Hortência Rafael, representante da organização.
Moçambique: mulheres perdem acesso à terra na província de Inhambane
Tais expropriações são feitas com o parecer do Governo, que, por sua vez, estaria a reassentar as mulheres em zona sem condições básicas. "Das areias pesadas aqui em Jangamo, temos o Temane com a questão do gás. Aquelas mulheres são tiradas de qualquer maneira e são colocadas em zonas com uma produção baixa, onde não tem água ou escola por perto”, exemplifica Hortência Rafael.
A representante do Fórum Mulher em Inhambane apela ao Governo para promover o desenvolvimento económico das mulheres nas várias comunidades.
A DW África tentou ouvir o diretor provincial da Terra, Ambiente e Desenvolvimento Rural, mas não obteve respostas.
O poder do caniço em Inhambane
Em Inhambane, sul de Moçambique, o caniço tem sido o principal material usado na construção de muitas casas. Os habitantes acreditam assim preservar a cultura dos antepassados. Mas há cada vez menos caniço disponível.
Foto: DW/L. da Conceição
Uma prática com história
O caniço é usado há várias gerações na construção de casas e quintais. Atualmente, também é aproveitado para locais de alojamento turístico ao longo da costa marítima da província de Inhambane. Para obter este material, são vários os perigos a ultrapassar no leito dos rios. Luísa Alberto corta e vende caniço. Com a atividade, consegue fazer o rancho de casa e pagar o dízimo na igreja.
Foto: DW/L. da Conceição
Tudo em caniço
Em Inhambane, o caniço é aproveitado para quase tudo no contexto da construção porque sai mais barato. Até investidores turísticos usam o caniço em edifícios que funcionam como escritórios, entre outras atividades.
Foto: DW/L. da Conceição
"Sou cortador e vendedor de caniço"
Rafael Vilankulo é cortador e vendedor de caniço no rio Furvela, distrito de Morrumbene. Consegue um rendimento mensal razoável e diz que não sente vergonha do seu trabalho. Conta que começou a cortar caniço com apenas dez anos de idade, por não ter conseguido emprego. Agora admite ser este o seu trabalho: "sou cortador e vendedor de caniço".
Foto: DW/L. da Conceição
Estâncias turísticas feitas com caniço
Ao longo da costa marítima de Inhambane, várias estâncias turísticas são feitas com este material local. Os proprietários dizem que desta forma gasta-se menos com a compra de aparelhos de ar condicionado nos quartos, uma vez que o caniço permite uma boa ventilação. Os turistas adoram ficar alojados neste tipo de habitação.
Foto: DW/L. da Conceição
20 anos a sobreviver à base do caniço
José Alexandre vive da venda do caniço que corta no rio Nhanombe, que separa os distritos de Maxixe e Morrumbene. Começou a atividade assim que voltou do serviço militar, na década de 90. Parou durante algum tempo quando foi fazer negócios na cidade de Maputo, mas, em 1998, voltou a Maxixe e à atividade, que exerce até hoje. Casou e tem dois filhos. Diz estar satisfeito com o seu trabalho.
Foto: DW/L. da Conceição
Barracas para toda a família
"Barraca" é o termo usado para as casas em Inhambane, que são construídas no mesmo local para vários membros das famílias. Os filhos, quando crescem ou completam 18 anos, são obrigados a construírem as suas barracas (casas de caniço) no mesmo quintal onde vivem os pais, para melhor acomodarem as suas visitas, como amigos e namorada, preservando, assim, a cultura dos antepassados.
Foto: DW/L. da Conceição
Um templo feito com caniço
Várias seitas religiosas têm igrejas feitas à base do caniço. Uma delas decidiu construir este templo, que será inaugurado brevemente no distrito de Morrumbene. Os crentes contribuíram para a compra do material durante alguns anos.
Foto: DW/L. da Conceição
Negócio familiar
O comércio da venda de caniço para construção tem sido um negócio de família. É possível arrecadar, em média, mais de 5.000 meticais (70 euros) a cada 15 dias. Não é qualquer pessoa que consegue cortar e vender caniço, é uma atividade que vai passando de geração em geração. Os adultos ensinam os mais novos para, quando crescerem, saberem executar o trabalho sem dificuldade.
Foto: DW/L. da Conceição
Escassez do caniço
Devido ao corte excessivo de caniço nos principais rios, já se nota escassez deste material, o que fez com que o preço triplicasse nos últimos dois anos. Os cortadores reclamam da falta do caniço de qualidade e outros perigos associados à atividade, como cobras e outros répteis perigosos. Ainda assim, ninguém parece querer abandonar a atividade, uma vez que ainda garante um bom rendimento.
Foto: DW/L. da Conceição
O gosto pelo caniço
O uso do caniço é tido como bom gosto na construção de casas. Os projetos de construção podem basear-se em diferentes modelos de arquitetura, seguindo estilos mais europeus, asiáticos, americanos ou locais. O aumento da procura contribuiu para a escassez do material.
Foto: DW/L. da Conceição
Uma sombra de caniço
Em residências, estâncias turísticas e restaurantes é comum haver pelo menos uma sombra feita com caniço, pois "o caniço é mais fresco e as pessoas respiram ar puro", dizem os proprietários. Ainda que o preço da venda aumente, pouco se reclama, pois todos gostam de seguir a cultura tradicional e típica de Inhambane.