O contestado decreto-lei que impõe novas taxas de licença aos órgãos de comunicação social e acreditação dos correspondentes em Moçambique vai entrar em vigor, reiterou o Gabinfo num encontro em Maputo.
Publicidade
A nova lei ( decreto 40/2018), entra mesmo em vigor esta quarta-feira (22.08), apesar das fortes críticas de vários setores que receiam que o decreto possa por em causa o direito do público à informação.
Ainda recentemente um grupo de organizações da sociedade civil submeteu uma petição ao Provedor de Justiça para que solicite ao Conselho Constitucional a declaração de inconstitucionalidade e de ilegalidade do documento.
O decreto impõe o pagamento de uma taxa de 500 mil meticais, o equivalente a cerca de 7.469 euros pela acreditação de um correspondente estrangeiro residente em Moçambique e igual valor pela renovação.
O Governo vai passar a cobrar ainda 200 mil meticais, o equivalente a 2.985 euros, pela acreditação de um correspondente permanente nacional de um órgão de comunicação social estrangeiro e igual valor pela renovação da acreditação
Valores são altos
A diretora de Estudos, Planificação e Cooperação do Gabinete de Informação (Gabinfo), Cecília Gonçalves, reconheceu num encontro esta terça-feira (21.08) com correspondentes de órgãos de comunicação social estrangeiros que os valores previstos são altos mas defendeu que são sustentáveis. Segundo ela, a fixação das novas taxas resulta de estudos realizados, que se escusou a detalhar.
Os participantes ao encontro reiteraram que não estão contra a adoção de novas taxas, mas consideram a tabela recentemente aprovada pelo Governo bastante elevada e incomportável. Lamentam ainda não terem sido consultados antes da sua aprovação.
Aprovação de um regulamentoCecília Gonçalves esclareceu que as novas taxas só serão aplicadas depois de aprovado um regulamento estabelecendo as normas e procedimentos sobre a acreditação e credenciamento no país de jornalistas e correspondentes nacionais estrangeiros e colaboradores autónomos.
Moçambique: Novas taxas aplicadas à comunicação social vão entrar em vigor
Uma equipa de trabalho envolvendo o Gabinete de Informação e representantes das várias partes interessadas, incluindo dos correspondentes, será criada para elaborar este documento, segundo informou a diretora Cecília Gonçalves.
Porém, deixou claro que "isso não significa que o decreto será mexido. O que pode vir a ser mexido é a tabela que fixa as taxas".
Um dos participantes na reunião, Estevão Chavisso, disse a DW África que saía do encontro insatisfeito porque "ainda restam muitas dúvidas no geral, na medida em que há uma lei que entra em vigor e no entanto não há ainda as regras de procedimentos. Mas há aqui abertura para que haja uma discussão desse novo documento que será feito. Isso mostra, de certo modo, uma abertura positiva, mas, no entanto, continua a ser estranho o processo porque começou sem que houvesse esse debate. Isso de certo modo nos assustou".
Insatisfação dos jornalistasOutro correspondente, Alexandre Nhampossa, não escondeu, igualmente, a sua insatisfação.
"Na verdade não estou satisfeito porque as várias questões colocadas eles não conseguiram responder. A questão, por exemplo, das taxas se serão revistas ou não esta questão não ficou esclarecida. Fala-se da revisão de certos procedimentos, mas quais são esses procedimentos? Eles poderiam ter apresentado a proposta dos tais procedimentos e aproveitavam o encontro aqui e discutíamos essa questão".
Por seu turno, José Machiane disse que tinha um sentimento misto porque se por um lado, o decreto torna impossível o exercício da atividade jornalística dos correspondentes por outro, há uma luz no fundo do túnel com a abertura do governo para se revisitar as novas taxas. E sublinhou que "o quadro não está muito claro em relação ao que irá acontecer. A minha expetativa era que o decreto fosse revogado e fossem trabalhadas novas taxas na perspetiva de um novo decreto porque este é claramente repressivo ao exercício da atividade jornalística", concluiu.
Entretanto, o primeiro-ministro de Moçambique, Carlos Agostinho do Rosário, já disse que o seu Governo vai continuar a apostar na consolidação da liberdade de imprensa e de expressão e propôs ainda a criação de um órgão regulador autónomo da comunicação social.
Países africanos que mais violam a liberdade de imprensa
Gana é o país africano mais bem classificado no "<i>Ranking</i> Mundial da Liberdade de Imprensa" dos Repórteres sem Fronteiras. A Eritreia é o pior em África e, a nível mundial, só é melhor que a Coreia do Norte.
Foto: Esdras Ndikumana/AFP/Getty Images
Eritreia - posição 179º lugar
A liberdade de imprensa é considerada "não existente". Em 2001, uma série de medidas repressivas contra <i>media</i> independentes levaram a uma onda de detenções. O Presidente Isaias Afeworki é visto como um “predador” da liberdade de imprensa e usa os meios de comunicação nacionais como seus porta-vozes. Escritores, locutores e artistas são censurados e a informação é escondida dos cidadãos.
Foto: picture-alliance
Sudão - 174º lugar
Na capital Cartum, pratica-se a chamada “censura pré-publicação". O Governo detém jornalistas arbitrariamente e interfere abertamente na produção de notícias. A "Lei da Liberdade de Informação de 2015" é vista como uma outra forma de exercer controlo governamental sobre a informação pública. Os jornalistas têm de passar por um teste e obter uma permissão para trabalhar.
Foto: Getty Images/AFP/A. Shazly
Burundi - 159º lugar
Repressão estatal contra a liberdade de imprensa e intimidação de jornalistas é comum no país. <i>Media </i> controlados pelo Estado substituem cada vez mais estações de rádio independentes, depois de a maior parte delas ter sido forçada a fechar, após uma tentativa de golpe de estado há três anos. Centenas de jornalistas fugiram do país desde 2015. Na foto, protesto de jornalistas no país.
Foto: Esdras Ndikumana/AFP/Getty Images
República Democrática do Congo - 154º lugar
Defensores dos <i>media</i> falam em jornalistas mortos, agredidos, detidos e ameaçados desde que Joseph Kabila sucedeu ao pai na presidência do país em 2001. Orgãos de comunicação internacionais queixam-se que o Governo interfere nos sinais de rádio ou corta mesmo a transmissão. Protestos da oposição levaram as autoridades a interromper ou cortar o acesso à Internet.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Kappeler
Suazilândia - 152º lugar
Esta monarquia absoluta tem a reputação de obstruir o acesso à informação e impedir os jornalistas de fazerem o seu trabalho. Os <i>media</i> estão sujeitos a leis restritivas e repórteres são frequentemente chamados a tribunal pelo seu trabalho. Auto-censura é comum. Um editor saiu recentemente do país depois de fazer uma reportagem sobre negócios obscuros ligados ao Rei Mswati III (na foto).
Foto: picture-alliance/dpa
Etiópia - 150º lugar
O Governo tem uma mordaça sobre os órgãos de comunicação e os jornalistas trabalham sobre condições muito restritivas. Com a Eritreia, este país tem uma das mais altas taxas de jornalistas detidos na África subsariana. Na foto, o jornalista etíope Getachew Shiferaw, que foi condenado a 18 meses de prisão por ter falado com um dissidente.
Foto: Blue Party Ethiopia
Sudão do Sul - 144º lugar
Os jornalistas são obrigados pelo Governo a evitar fazer cobertura do conflito. Órgãos de comunicação internacionais denuciaram casos de assédio e foram banidos deste jovem país, onde pelo menos 10 jornalistas foram mortos desde 2011. Na foto, dois jornalistas do Uganda que tinham sido detidos por autoridades no Sudão do Sul.
Foto: Getty Images/AFP/W. Wudu
Camarões - 129º lugar
O Governo chamou às redes sociais uma “nova forma de terrorismo”, e bloqueia frequentemente o acesso às mesmas. Emissões de rádio e televisão foram bloqueadas duas semanas em março, durante o período eleitoral. Jornais que publicam conteúdos que desagradam políticos no poder são banidos e jornalistas e editores são detidos.
Foto: picture alliance/abaca/E. Blondet
Chade - 123º lugar
Os jornalistas arriscam-se a detenções arbitrárias, agressões e intimidações. Nos últimos meses, o Governo tem vindo a reprimir plataformas de <i>social media</i> e ciber-ativistas. A Internet tem estado bloqueada no país desde 28 de março, no seguimento de um “apagão” da Internet devido a manifestações da sociedade civil e protestos dos órgãos de comunicação num chamado “dia sem imprensa”.
Foto: UImago/Xinhua/C. Yichen
Tanzânia - 93º lugar
Críticos dizem que o Presidente John Magufuli tem vindo a atacar a liberdade de expressão deliberadamente, desde que tomou posse em 2015. Jornalistas foram presos ou dados como desaparecidos. Orgãos de comunicação social foram fechados ou impedidos de publicar durante longos períodos de tempo. Leis que podem ser usadas contra os <i>media</i> foram apertadas.