Chume e Massingue são escolhas que "poderão trazer mais conforto para os militares e polícias", diz Dércio Alfazema. Investigador do IMD suspeita que remodelação governamental tenha origem em reclamações internas.
Em entrevista à DW África, o analista político Dércio Alfazema, diretor de projetos do Instituto para a Democracia Multipartidária (IMD), organização não-governamental, descarta "que as mexidas no governo tenham a ver com Cabo Delgado".
DW África: A remodelação no Governo pode ser parte de uma nova estratégia de combate ao terrorismo?
Dércio Alfazema (DA): Acredito que não tenha a ver com o combate ao terrorismo, até porque a estratégia de intervenção no âmbito do combate ao terrorismo e conflito na zona centro do país é uma questão que está centrada no próprio Presidente da República. Denota-se que o Presidente da República tem interesses particulares na componente das Forças de Defesa e Segurança. Ele conhece-as por dentro e por fora. Foi ministro da Defesa, dirigiu o comando de operações conjuntas, agora dirigiu o comando operativo, portanto é um setor em que ele tem estado bastante atento. É das mãos dele que vieram os ruandeses, as tropas da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) e da União Europeia (UE).
DW África: Há outras razões por trás destas exonerações?
DA: Recentemente o Presidente da República visitou o comando geral da polícia, o comando das Forças Armadas e tem estado a andar nos quartéis e a acompanhar os processos de formação de polícias e militares. Pode ser que ele tenha uma outra informação que não é acessível ao público e em função dessa informação – do tipo reclamações – pode ser que ele tenha tomado essa decisão. Sustento isso pelo facto de recorrer à prata da casa, tanta nas Forças Armadas como também na polícia.
DW África: Cristóvão Artur Chume é o novo ministro da Defesa Nacional e Arsénia Felicidade Félix Massingue a nova ministra do Interior. Que balanço faz destas nomeações?
DA: São nomes claramente bem acertados. Há muito tempo que não tínhamos [nestas pastas] pessoas que cresceram a fazer carreira nestes setores. Na Defesa, Cristóvão Chume foi crescendo pelas mãos do próprio Nyusi. Foi ele que o nomeou como diretor da academia [militar] em Nampula. Foi ele que o trouxe para comandante do exército e que completa o ciclo e o nomeia para ministro. Chume era um dos principais operativos que estava a comandar o Exército que está a combater o terrorismo em Cabo Delgado.
No Ministério do Interior, acontece o mesmo. Arsénia Massingue é uma polícia de longa data. Conhece o setor, cresceu lá, já ocupou vários cargos e agora ascende à carreira de topo. Penso que essas escolhas poderão trazer mais conforto para os militares e polícias, no sentido de que eles vão reconhecer a liderança que está ligada às suas respetivas áreas.
Terrorismo em Cabo Delgado: As marcas da destruição e a crise humanitária
Edifícios vandalizados, presença de militares nas ruas e promessas de soluções por parte de políticos contrastam com a tentativa das populações de levar a vida adiante.
Foto: Roberto Paquete/DW
Infraestruturas vandalizadas
O conflito armado em Cabo Delgado deixou um número de infraestruturas destruídas na província nortenha de Moçambique. Em Macomia, os insurgentes não pouparam nem a Direção Nacional de Identificação Civil. Os danos no prédio do órgão deixaram milhares de pessoas sem documentos. E carro da polícia incendiado.
Foto: Roberto Paquete/DW
Feridas abertas até na sede da Polícia
O edifício da Polícia da República de Moçambique (PRM) em Macomia ainda carrega as marcas de um ataque em 2020. O tanzaniano Abu Yasir Hassan – também conhecido como Yasser Hassan e Abur Qasim - é reconhecido pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos e pelo Governo moçambicano como líder do Estado Islâmico em Cabo Delgado. Não está claro se o grupo é responsável pelos ataques na província.
Foto: Roberto Paquete/DW
"Eliminar todo o tipo de ameaça"
Joaquim Rivas Mangrasse (à esquerda) foi empossado chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas a 16 e março. "É missão das Forças Armadas eliminar todo o tipo de ameaça à nossa soberania, incluindo o terrorismo e os seus mentores, que não devem ter sossego e devem se arrepender de ter ousado atacar Moçambique", declarou o Presidente Filipe Nyusi (centro) na cerimónia de posse, em Maputo.
Foto: Roberto Paquete/DW
Missões constantes para conter os terroristas
Soldados das Forças Armadas de Defesa de Moçambique preparam-se para mais uma missão contra terroristas em Palma. A vila foi alvo de ataques, esta quarta-feira (24.03), segundo fontes ouvidas pela agência Lusa e segundo a imprensa moçambicana. Neste mesmo dia, as autoridades moçambicanas e a petrolífera Total anunciaram, para abril, o retorno das obras do projeto de gás, suspensas desde dezembro.
Foto: Roberto Paquete/DW
Defender o gás natural da península de Afungi
A península de Afungi, distrito de Palma, foi designada como área de segurança especial pelo Governo de Moçambique para proteger o projeto de exploração de gás da Total. O controlo é feito pelas forças de segurança designadas pelos ministérios da Defesa e do Interior. Esta quinta-feira (25.03), o Ministério da Defesa confirmou o ataque junto ao projeto de gás, na quarta-feira (24.03).
Foto: Roberto Paquete/DW
Proteger os deslocados
Soldados das FADM protegem um campo para os desolocados internos na vila de Palma. A violência armada está a provocar uma crise humanitária que já resultou em quase 700 mil deslocados e mais de duas mil mortes.
Foto: Roberto Paquete/DW
Apoiar os deslocados
De acordo com as agências humanitárias, mais de 90% dos deslocados estão hospedados "com familiares e amigos". Muitos refugiaram-se em Palma. Com as estradas bloqueadas pelos insurgentes em fevereiro e março deste ano, faltaram alimentos. A ajuda chegou de navio.
Foto: Roberto Paquete/DW
Defender a própria comunidade
Soldados das Forças Armadas de Defesa de Moçambqiue estão presentes também no distrito de Mueda. Entretanto, cansados de sofrer nas mãos dos teroristas, antigos militares decidiram proteger eles mesmos a sua comunidade e formaram uma milícia chamada "força local".
Foto: Roberto Paquete/DW
Levar a vida adiante
No mercado no centro da vida de Palma, a população tenta seguir com a vida normal quando a situação está calma. Apesar da ameaça constante imposta pela possibilidade de um novo ataque, quando "a poeira abaixa", a normalidade parece regressar pelo menos momentaneamente...
Foto: Roberto Paquete/DW
Aprender a ter esperança com as crianças
Apesar de todo o caos que se instalou um pouco por todo o lado em Cabo Delgado, a esperança por um vida normal continua entre as poulações. Na imagem, crianças de famílias deslocadas que deixaram as suas casas, fugindo dos terroristas, e foram para a cidade de Pemba. Vivem no bairro de Paquitequete e sonham com um futuro próspero, sem ter de depender da ajuda humanitária e longe da violência.