Nyusi está prestes a terminar o seu primeiro mandato e não se conhecem projetos seus de desenvolvimento. Por outro lado, nos últimos tempos os seus discursos têm sido marcados por alguma inflexibilidade e dureza.
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Só na última semana o Presidente moçambicano causou bastante polémica ao fazer a seguinte afirmação: "Se não estás preparado para viver na capital procura lá outro sítio [para viver]". Essa foi a reação de Filipe Nyusi as manifestações populares à morte de uma criança de uma escola primária por atropelamento na estrada circular em Maputo.
Também na última semana contra-atacou de forma dura os empreiteiros da área da construção civil que pediram medidas para fazer frente as consequências da crise económica, ao exigir o combate à corrupção no setor.
A rispidez no discurso será o reflexo de alguma saturação por parte do Presidente? Eduardo Sitói é cientista político e acredita que sim: "Talvez seja isso, o que quero dizer é: ele provavelmente não tem muito tato para lidar com grandes multidões. Os seus improvisos não têm aquela áurea, aquele carisma dos outros líderes. Mas ele tem sido eficaz no trabalho mais controlado e direto com os seus principais subordinados, portanto, ele tem esses dois lados diferentes."
Nyusi impaciente e frustrado?
Já o sociólogo Elísio Macamo acredita que existam motivos mais profundos na origem da postura de Filipe Nyusi e apresenta justificações para o que chama de deslizes: "Acho que a questão é mais complexa. Ser Presidente de Moçambique, e com todo o respeito que tenho pelos países que vou mencionar agora, não é o mesmo que ser Presidente de Cabo Verde, da Guiné ou do Malawi. Moçambique é um país grande, complexo, com problemas e com desafios extremamente complexos."
E por isso Macamo argumenta que "é normal que quem esteja à frente de um país destes possa uma e outra vez não conseguir camuflar uma certa impaciência, uma certa frustração em relação à forma como as coisas estão a andar, quando ele tem expetativas que as coisas andem bem. Penso que os deslizes que tem tido explicam-se mais por essa via do que pelo facto de estar cansado ou de lhe faltar tato."
Depois das fortes críticas ao "empregado do povo", como é chamado o Presidente no país, Nyusi terá feito um "mea culpa" ao visitar nesta segunda-feira (11.06.) a escola em questão e ter prometido uma ponte aérea e ter apelado para outras medidas para evitar acidentes.
Mea culpa é igual a um pedido de desculpas?
Mas isso exclui um pedido de desculpas do "empregado do povo" ao seu "patrão"? Elísio Macamo começa por reconhecer que "foi uma atitude boa da parte dele, deu-se conta de que, de facto, cometeu um deslize. E ao visitar a escola depois dessa celeuma toda ele revelou uma certa "mea culpa".
E o sociólogo lembra que "isso para um país como o nosso não é coisa de se esperar de um político no lugar onde ele se encontra. Então, ele tem todo o mérito por ter feito isso aí."
Entretanto faz ressalvas: "Mas é claro que eu acho que ele continuou a não ser feliz na forma como reagiu, porque a questão não é só ir visitar a escola. A questão é pedir desculpas, acho que os nossos políticos precisam de ganhar a coragem de pedir desculpas por deslizes. Ele devia ter feito isso, teria sido bom para a sua própria imagem e para o Governo que dirige."
Mais um deslize de Nyusi não vai fazer diferença nas eleições
A rispidez discursiva do Presidente moçambicano exacerba quando o país está à beira de eleições: autárquicas em outubro de 2018 e gerais em outubro de 2019. Filipe Nyusi e o seu partido não correm o risco de saírem penalizados nos próximos escrutínios?
O sociólogo responde: "Eu não acho que os resultados das eleições que se avizinham vá depender do comportamento do Presidente agora, porque o maior problema que a FRELIMO enfrenta neste momento é o da sua impopularidade geral. Então, mais um deslize não vai fazer diferença."
Macamo acredita que "se a FRELIMO tem de desenvolver alguma estratégia em relação a este assunto, essa estratégia não pode ser de controlar o que [Nyusi] diz, vai ter de ver como é que a FRELIMO vai lidar com esta perceção de que a FRELIMO está cansada e que não está com vontade de fazer as coisas."
Moçambique: O calcanhar de Aquiles de Filipe Nyusi
Onde estão as propostas de desenvolvimento de Nyusi?
Filipe Nyusi já vai no quarto ano do seu primeiro mandato. Até aqui não se conhecem projetos seus ou do seu Governo focados no desenvolvimento do país, à semelhança, por exemplo, do que aconteceu na Presidência anterior. Armando Guebuza implementou alguns projetos, como é o caso do que visava o desenvolvimento do distrito.
Eduardo Sitói apresenta uma justificação que "muito provavelmente Nyusi esteve muito focado na questão da paz e julgo que por causa desse foco eventualmente não tenha tido a oportunidade e nem espaço para muitas outras iniciativas. Por outro lado, todo este contexto económico e do corte da ajuda internacional criou uma espécie de desaceleração da capacidade do Governo central de fazer investimentos significativos no país."
Filipe Nyusi é o candidato da FRELIMO para as presidenciais de 2019. Se vencer, eventualmente transitará com os mesmos problemas.E a questão que fica é: Continuará ele sem propostas de projetos para Moçambique?
Campanha eleitoral em Moçambique
A 15 de outubro de 2014, Moçambique realiza eleições gerais - presidenciais, legislativas e provinciais -, no território nacional e a 12 de outubro no estrangeiro. A campanha eleitoral teve início a 31 de agosto.
Foto: DW/J. Beck
Principais candidatos
A 15 de outubro próximo, Moçambique realiza eleições gerais no território nacional e a 12 de outubro no estrangeiro. A campanha eleitoral teve início a 31 de agosto. Os principais candidatos à presidência são Filipe Nyusi (foto), indicado à sucessão de Armando Guebuza pelo partido no poder, a FRELIMO; Afonso Dhlakama, líder do maior partido da oposição, a RENAMO; e Daviz Simango, do MDM.
Foto: picture-alliance/dpa
RENAMO entra com atraso
A campanha eleitoral teve início a 31 de agosto. Mas Afonso Dhlakama, o candidato e líder do principal partido da oposição moçambicana, a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), entrou em campanha com um atraso de cinco dias, a 4 de setembro, quando fez o primeiro comício na cidade de Chimoio, capital da província central de Manica. Apoiantes acompanham a caravana no início da viagem a Maputo.
Foto: picture-alliance/dpa
Acordo de paz: condição para a RENAMO
Antes de iniciar a viagem a Maputo para assinar o acordo de paz entre o seu partido e o Governo da FRELIMO, a 5 de setembro, Afonso Dhlakama falou à imprensa (foto). Dhlakama estava refugiado na Gorongosa desde outubro de 2013, depois do seu acampamento em Satunjira, província de Sofala, na região centro, ter sido tomado pelo exército moçambicano.
Foto: picture-alliance/dpa
Dhlakama ovacionado em Maputo
Apoiantes do partido da oposição a caminho do aeroporto da capital, Maputo, para receber Afonso Dlakhama, candidato do maior partido da oposição, RENAMO, à presidência da República. O período tem sido marcado pela violência, mas alguns analistas dizem que em comparação com processos eleitorais anteriores esta campanha decorre melhor.
Foto: DW/L. Matias
Maior aposta é nos cartazes
Uma das maiores apostas de divulgação dos candidatos às eleições de outubro é a propaganda em cartazes. Esta já é uma tradição no país. No entanto, o tamanho dos mesmos varia, de acordo com o orçamento de campanha de cada partido. A propaganda de Daviz Simango, candidato do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), a terceira maior força politica do país, pode ser vista na Ilha de Moçambique.
Foto: DW/J. Beck
Tamanho e poder
Outdoor anunciando a candidatura de Filipe Nyusi, candidato do partido no poder, FRELIMO, à sucessão do atual Presidente, Armando Guebuza, em Namialo, no norte de Moçambique. A aldeia fica numa encruzilhada estratégica entre as cidades de Nacala, Pemba e Nampula, o maior círculo eleitoral do país. Os altos investimentos em propaganda refletem a força da FRELIMO na campanha eleitoral.
Foto: DW/J. Beck
Ponto estratégico
Os partidos menores investem nos cartazes, apesar de consideravelmente menores e mais difíceis de serem encontrados. O Partido Independente de Moçambique (PIMO), da oposição, que até 2014 não tinha assentos no Parlamento, escolheu um ponto estratégico para se divulgar: a Avenida Eduardo Mondlane, centro de Nampula, a terceira maior cidade do país. Yaqub Sibind é o candidato do PIMO à presidência.
Foto: DW/J. Beck
Nampula, o maior círculo eleitoral do país
Com mais de dois milhões de potenciais eleitores, a província de Nampula, o maior círculo eleitoral do país, espera eleger 47 deputados e 92 membros para a Assembleia Provincial. Para os candidatos das três maiores forças políticas que concorrem às presidenciais, a região é estratégica para vencer as eleições. Na foto, apoiantes da RENAMO a caminho de um comício de Afonso Dhlakama em Lumbo.
Foto: DW/J. Beck
Comité da FRELIMO em Nampula
Também a FRELIMO investe no maior círculo eleitoral do país. O edifício da sede regional da campanha do partido no poder, localizado no centro de Nampula, tem a fachada coberta por cartazes publicitários do partido no poder e do seu candidato à sucessão presidencial, Filipe Nyusi.
Foto: DW/J. Beck
A propaganda móvel da RENAMO
Outra aposta da RENAMO é na propaganda móvel. Motociclistas com bandeiras do maior partido de oposição de Moçambique circulam pelas principais cidades dos país. Este locomoveu-se no centro de Nampula – um dia antes de o líder e candidato à presidência da RENAMO, Afonso Dhlakama, voltar à terceira maior cidade de Moçambique, após mais de dois anos de ausência.
Foto: DW/J. Beck
Apoiantes da FRELIMO nas ruas
Pelas ruas de todo o país, podem ser vistos também os apoiantes da FRELIMO, o partido no poder. Vendedores ambulantes, no cais do barco que faz a travessia ligando Maputo a Catembe, mostram cartazes e faixas com propaganda do partido e do seu candidato à sucessão de Armando Guebuza, Filipe Nyusi. É notável a supremacia da FRELIMO na propaganda eleitoral em Moçambique.
Foto: DW/J. Beck
Amplo alcance da FRELIMO
As bandeiras da FRELIMO espalham-se até mesmo nos locais mais remotos do país, como neste mercado em Namialo, Nampula, no norte. Onze candidatos presidenciais e 30 partidos, coligações e grupos de cidadãos concorrem às eleições gerais moçambicanas que serão realizadas a 15 de outubro no território nacional e a 12 de outubro no estrangeiro.
Foto: DW/J. Beck
Campanha não está a ser pacífica
Multiplicam-se as denúncias de ilícitos eleitorais, desde a destruição de panfletos a ameaças à população e ofensas aos partidos. O MDM acusou o partido no poder, a FRELIMO, de inviabilizar um comício do seu candidato, Daviz Simango, nos arredores de Maputo, em 24 de setembro. Já a RENAMO queixa-se de estar a ser atacada pelo facto de ter armas. A FRELIMO não respondeu às acusações.
Foto: DW/J. Beck
Denúncias de tortura e violações em Nampula
A Comissão Nacional de Eleições (CNE) apelou à contenção da violência. No entanto, a 25 de setembro, após confrontos com apoiantes da FRELIMO, sete membros do MDM foram detidos. Dois dias depois, seis deles foram libertados e denunciaram terem sido torturados e violados sexualmente por outros prisioneiros, a mando dos agentes da Polícia da República de Moçambique (PRM), que negou as acusações.