A oposição moçambicana vê mais retrocessos que avanços no desenvolvimento do país em 2021. A RENAMO e o MDM acusam o Governo de inação no combate ao terrorismo e de cumplicidade na corrupção.
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A Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), o maior partido da oposição, destaca que os serviços secretos que deviam ter agido em prol da defesa da pátria não cumpriram o seu papel de reconhecer a tempo a ameaça de terrorismo ao país.
Para o presidente da RENAMO, Ossufo Momade, a inação dos serviços de inteligência colocou o país numa situação de vulnerabilidade e perigo iminente, demonstrados pelo terrorismo que grassa em Cabo Delgado e, mais recentemente, no Niassa.
Ossufo foi mais longe ao dizer: "A este propósito, vale recordar o recente comportamento irresponsável assumido pelos agentes dos serviços de informação e segurança do Estado no endividamento do país".
O político considerou a atuação dos quadros seniores destes órgãos "chocante e repugnante" e acrescentou que as chefias do SISE foram "autênticos lesa-pátrias, avaliando pelos pronunciamentos dos réus e declarantes em julgamento", - uma referência aos processos que correm no âmbito das chamadas dívidas ocultas.
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Impunidade para os criminosos?
O presidente do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), Lutero Simango, secundou o seu rival político ao entender que: "Nestes últimos anos, os nossos serviços secretos adoeceram". Para Simango também, em vez de trabalhar no sentido de assegurar as suas responsabilidades na defesa da pátria, o SISE meteu-se em negócios e corrupção "ignorando as suas responsabilidades".
A falta de solução para uma onda de raptos que assola Moçambique também gerou críticas. Ossufo Momade lamentou a impunidade dos criminosos "... e a falta de identificação dos mandantes", que, a seu ver, abalam a confiança e a segurança da população. "Vezes sem conta os raptos têm sido em plena luz do dia e estranhamente nunca há esclarecimentos", rematou.
Momade acusou ainda o Governo e o partido no poder, a FRELIMO, de não estarem preocupados em combater a corrupção, afirmando que eles estão serenos face aos descalabros que resultaram nas dividas ocultas.
"É nosso entendimento que o Presidente da República devia ser a reserva moral do país", salientou o presidente da RENAMO.
A importância da paz
A paz foi outro tema central das comunicações dos líderes da oposição. Momade garantiu que está comprometido com a paz e quer que o processo de Desmobilização, Desmilitarização e Reintegração (DDR) prossiga e termine com maior rapidez.
"Finalmente, foram formados 36 oficiais vindos da nossa força residual a serem integrados na Polícia da República de Moçambique. É nossa expetativa que o processo de enquadramento nas Forças de Defesa e Segurança não seja interrompido e não conheça recuos em respeito aos entendimentos alcançados”" acrescentou.
O presidente do MDM, Lutero Simango disse que a paz e reconciliação nacional devem permanecer na agenda nacional, pois dizem respeito a todos os moçambicanos. "Pelo que não devem ser monopolizados. As janelas de diálogo devem ser abertas para engajar os nacionais para a sua libertação da instrumentalização", disse Simango.
Julgamento das dívidas Ocultas: "Outras coisas..."
O julgamento do caso das dívidas ocultas revela aos poucos mais informações sobre o que muitos consideram o maior escândalo de corrupção de Moçambique. Conheça as peculiaridades do caso e dos seus personagens.
Foto: Fotolia/Carlson
O caso
O escândalo das dívidas ocultas veio ao de cima entre 2013 e 2014. É a maior fraude financeira de Moçambique e prejudicou a nação e a imagem do país. Em causa estão cerca de 2 mil milhões de euros. O esquema tem como "cabeças" altos funcionários do Estado e trabalhadores de bancos como o Credit Suisse. O julgamento começou a 23 de agosto e conta com 19 arguidos, 70 testemunhas e 69 declarantes.
Foto: Roberto Paquete/DW
Julgamento nas instalações de uma cadeia
A falta de capacidade para albergar muita gente terá levado o Tribunal Judicial da Cidade de Maputo a optar pelo Estabelecimento Penitenciário Especial de Máxima Segurança da Machava para o julgamento. E é na B.O., como é conhecida a cadeia, onde estão detidos a maioria dos envolvidos no caso. Alguns dos julgamentos mais mediatizados do país costumam acontecer aqui.
Foto: Romeu da Silva/DW
Juiz da causa é de índole duvidosa?
Efigénio Baptista não tem percurso profissional imaculado, foi julgado e condenado duas vezes por ameaças e ofensas corporais num caso de abuso de poder em Manica. Também terá sido alvo de contestação popular em Sofala, que culminou com a queima da sua casa. Alguns setores questionam a escolha do juiz, defendem que deveria ter sido escolhido um juiz sénior para o caso. O "juiz júnior" tem 42 anos.
Foto: Romeu da Silva/DW
"Alérgico a corrupção" e sujeito a pressão
Sobre as condenações, o juiz Efigénio Baptista, numa entrevista ao "O País" esclareceu: "Mas eu recorri da decisão e o Tribunal de Recurso da Beira anulou-a. Por isso, eu não tenho cadastro criminal". Baptista terá estado ainda sob pressão por ser o juiz do caso mais "cabeludo" do momento. A imprensa moçambicana chegou a noticiar sobre possíveis ameaças ao juiz.
Foto: Romeu da Silva/DW
Ordem dos Advogados em representação do povo
A Ordem dos Advoagados de Moçambique (AOM) intervém no julgamento na qualidade de assistente e pretende auxiliar o Ministério Público. O objetivo é assegurar que o povo moçambicano seja informado, atualizado e esclarecido sobre os contornos do processo. São sete representantes, entre eles os ex-bastonários Gilberto Correia e Flávio Menete.
Foto: Romeu da Silva/DW
Bendita seja a mulher entre os homens...
Ana Sheila Marrengula é representante do Ministério Público no julgamento. É a única mulher entre o jurado, o que desencadeou queixas de falta de inclusão. É apreciada pelas suas questões consideradas pertinentes, mas igualmente criticada pelos seus modos pouco profissionais de questionar os réus. Pede indemnização civil ao Estado de cerca de três mil milhões de dólares acrescidos de juros.
Foto: Christoph Hardt/picture-alliance/Geisler-Fotopress
O uniforme da discórdia
No primeiro dia do julgamento os réus não se apresentaram de uniforme prisional, como é prática no país e conforme solicitação do juiz. A defesa contestou a exigência, alegando que a lei não obriga a isso, mas no final valeu a ordem de Efigénio Baptista que defende "tratamento igual" entre os presos. Na terça-feira (24.08) a cor laranja dominava a sala de audiências na B.O.
Foto: Romeu da Silva/DW
Alexandre Chivale, um advogado (in)suspeito?
Advogado da família Guebuza é a "sensação" entre os causídicos. Para além da sua postura destemida, e até entendida como de afronta, Chivale marcou o primeiro dia do julgamento. É que é administrador da Txopela, empresa suspeita do seu constituinte, Carlos do Rosário. E mais: ocupa uma das casas supostamente adquiridas com o dinheiro do calote. Tribunal deu-lhe 72 horas para deixar o imóvel.
Foto: privat
A memória curta de Cipriano Mutota
Foi a estreia do banco dos réus. Mutota revela que foi traído pelos seus parceiros do negócio na partilha dos "lucros" e não ficou contente. E não se lembra do destino dado a cerca de 656 milhões de euros que terá recebido como "luvas". O ex-diretor do Gabinete de Estudos da secreta praticamente confirmou a acusação do Ministério Público. Diz que Nyusi e Guebuza aprovaram o projeto.
Foto: Romeu da Silva/DW
Manuel Chang regressa no momento "H"
Justamente no dia do arranque do julgamento, a África do Sul anunciou a tão esperada extradição de uma das peças chave do crime, Manuel Chang. O juiz decidiu que o ex-ministro das Finanças será ouvido "na qualidade de declarante, quando estiver no território nacional", em resposta ao pedido da Ordem dos Advogados de Moçambique e reafirmado pelo Ministério Público e pelos advogados dos 19 arguidos.
Foto: Getty Images/AFP/W. de Wet
O "massagista" do sistema
Foi o lobista do negócio entre o Estado e a Privinvest, identifica-se como facilitador. Num dos emails trocado com a Privinvest mencionou uma "massagem ao sistema", mas no julgamento negou. Recebeu de Jean Boustani cerca de 8,5 milhões de dólares e recusa-se a devolver o valor, alegando que é resultante do seu trabalho. É visto como astuto, embora se tenha destacado por contradições no tribunal.
Foto: Romeu da Silva/DW
A amnésia da "cinderela"
É o terceiro réu a sentar-se no banco. Ndambi é filho do ex-Presidente Armando Guebuza é foi apelidado de cinderela pelos seus parceiros de negócios por ser lento a agir. Terá recebido 33 milhões de dólares de luvas de Jean Boustani, negociador da Privinvest. Não se recorda de quase nada que é questionado pelo juiz, diz que não tem memória de elefante. Foi um dos pivôs no tráfico de influência.