Não, protesta o CDD, que considera o gesto um pagamento e uma forma de limitar o espaço de ação da procuradora Sheila Marrengula. Filipe Nyusi atribuiu um certificado de mérito à procuradora do caso das dívidas ocultas.
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Nesta terça-feira (01.02), na abertura do ano judicial 2022, a procuradora do caso das dívidas ocultas Sheila Marrengula recebeu por via do Presidente de Moçambique um certificado de mérito pelo trabalho num julgamento ainda em curso. A atribuicao do certificado é uma iniciativa da magistratura que acontece anualmente. Mesmo assim, o gesto indignou alguns setores da sociedade moçambicana, como por exemplo o Centro para Democracia e Desenvolvimento (CDD)
O seu diretor, Adriano Nuvunga, criticou: "Esse assunto é uma agressão à sociedade, ao estado de direito democrático e uma forma de aprofundar o fechamento do espaço cívico, limitando a atuação do poder judicial através de prebendas".
Objetivo: Pagamento e limitação de atuação
O mais constrangedor é o facto de o reconhecimento vir do Presidente da República, Filipe Nyusi, parte envolvida no caso, mas que não será ouvido nem como declarante porque a agraciada procuradora Sheila Marrengula se opõe a esse pedido de outras partes do caso. Adriano Nuvunga entende o gesto como uma forma de coartar o seu trabalho.
"O facto de a procuradora Sheila estar a meio de um processo do maior escândalo de corrupção que envolve o antigo PR e o antigo ministro da Defesa, que é o atual PR, e aparecer hoje o poder público a oferecer prebendas à procuradora Sheila é para fechar o processo, é para calar algum lado que sobrava da atuação da Sheila", acusa.
E Nuvunga prossegue: "Portanto, isso é limitar o estado de direito democrático, é limitar o espaço de atuação da Sheila, compreendendo que ela, por exemplo, ajudou a negar que o ex-ministro da Defesa fosse arrolado como declarante. Por um lado é pagamento a isso, mas por outro visa limitar o espaço de ação dela".
Profissional que se preze executa sempre o seu trabalho com zelo. Mas, neste caso, levanta-se a seguinte questão: terá a procuradora Sheila Marrengula feito algo extraordinário para justificar tal certificação, mesmo antes do desfecho do caso? Enquanto a resposta não chega, Nuvunga critica a velha interferência do poder político nas outras esferas da sociedade.
"E tudo isso concorre para a nota mais elevada da politização e controle do julgamento pelo poder político", acusa.
Moçambique: Propriedades e instituições ligadas às "dívidas ocultas"
O processo denominado "dívidas ocultas" envolve não apenas pessoas de muitos quadrantes políticos e sociais, mas também empresas, propriedades e instituições.
Foto: Romeu da Silva/DW
O julgamento das "dívidas ocultas" decorre no Tribunal Judicial da Cidade de Maputo
O processo decorre no Tribunal Judicial da Cidade de Maputo desde 23 de Agosto de 2021. A sexta sessão revelou que arguidos e declarantes adquiriram residências luxuosas e criaram empresas de lavagem de dinheiro. A sociedade moçambicana ficou a conhecer a extensão da lesão que sofreu por causa das dividas ocultas.
Foto: Romeu da Silva/DW
Tudo começou no bairro de Sommerschield
Tudo começou no bairro de elite da Sommerschield, onde fica a sede do Serviço de Informações e Segurança do Estado (SISE). Não se trata do edifício na foto, já que é proibido fotografar o edifício do SISE. Mas foi nas suas instalações que foi desenvolvido o projeto de proteção da Zona Económica Exclusiva (ZEE), que acabou endividando o Estado em cerca de 2,2 mil milhões de dólares.
Foto: Romeu da Silva/DW
Lavagem de dinheiro
No julgamento, o Ministério Público (MP) acusou o réu António Carlos do Rosário de ser proprietário de vários apartamentos neste edifício chamado Deco Residence. O MP refere que do Rosário comprou, em 2013, três apartamentos, no valor de 500 mil dólares cada. O valor foi transferido pela IRS para a Txopela Investiments, de que era administrador.
Foto: Romeu da Silva/DW
Tribunal confisca apartamentos
Alexandre Chivale, advogado do réu António Carlos do Rosário, ocupava um apartamento aqui na Deco Assos. Foi obrigado a abandonar a unidade e a entregar a chave ao Tribunal de Maputo. A área residencial está a ser construída ao longo da marginal, uma zona que passou a ser muito concorrida.
Foto: Romeu da Silva/DW
Apartamento Xenon
António Carlos do Rosário também terá "metido a mão" neste imóvel. Na acusação consta que, em 2015, a Txopela transferiu 2,9 milhões de dólares para a Imobiliária ImoMoz para a compra de apartamentos neste edifício, que antes funcionava como cinema Xenon.
Foto: Romeu da Silva/DW
Alerta lançado pela INAMAR foi ignorado
A INAMAR é uma empresa que se dedica à inspeção naval. No processo da contratação das dívidas, a INAMAR avisou que os barcos da empresa pública EMATUM, que custaram 600 milhões de dólares, foram construídos à revelia das normas. Por causa das irregularidades, a INAMAR chumbou as embarcações. E alertou as autoridades relevantes, que ignoraram o relatório.
Foto: Romeu da Silva/DW
Casa de câmbios transformada em "lavandaria"
A Africâmbios transformou-se numa casa na lavagem de dinheiro. Alguns funcionários foram obrigados a abrir contas, usadas pelos seus superiores para a transferência de dinheiro da empresa Privinvest, igualmente envolvida no escândalo. O proprietário da Africâmbios, Taquir Wahaj, fugiu e é procurado pela justiça moçambicana.
Foto: Romeu da Silva/DW
Presidência e reuniões do comando conjunto
A presidência da República, perto da edifício da secreta moçambicana, acolheu algumas reuniões do Comando Conjunto e Operativo onde estiveram os ministros da Defesa, Filipe Nyusi, atual Presidente da República, Alberto Mondlane, ministro do Interior e elementos do SISE. Há muita pressão para que o antigo Presidente Guebuza e Nyusi sejam ouvidos como réus e não como declarantes no caso.
Foto: Romeu da Silva/DW
MINT fazia para do Comando Conjunto
O Ministério do Interior, assim como o Ministério da Defesa, eram considerados cruciais no projeto de Proteção da Zona Económica Exclusiva. O tribunal tem na lista de declarantes o antigo ministro Alberto Mondlane para prestar declarações e o papel que este Ministério teve na contratação das dívidas ocultas.