"A SERNIC está a trabalhar" é a resposta repetitiva da PRM às perguntas sobre a detenção em alto mar, cujas imagens viralizaram nas redes sociais. Quem serão? A resposta só depois da investigação da SERNIC na província.
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Em Moçambique, circularam este fim de semana nas redes sociais fotos e vídeos de supostos iranianos a serem detidos pelas forças moçambicanas ao largo da costa de Pemba. Vê-se num dos vídeos as autoridades numa embarcação a tentarem intercetar o barco dos referidos indivíduos, que por sua vez seguia sem se importar com o cerco. Num vídeo subsequente vê-se o barco suspeito em chamas, depois de abandonado, tal como se vê noutra imagem posterior a esse vídeo os ocupantes já detidos numa lancha ladeados pelas forças moçambicanas.
E nesta segunda-feira (16.12), a Polícia de República de Moçambique (PRM) confirmou à DW África a autenticidade das imagens e da operação, mas como habitualmente escusou-se a fornecer detalhes alegando que o caso está ainda a ser investigado pela SERNIC, os Serviços de Investigação Criminal. O facto teve lugar numa região alvo de ataques armados perpetrados por homens não devidamente identificados desde outubro de 2017, mas que alguns supõem serem radicais islâmicos. A DW África ouviu o porta-voz da PRM em Cabo Delgado, Augusto Guta, sobre essa operação.
DW África: Confirma a autenticidade das imagens que circulam nas redes sociais?
Augusto Guta (AG): Aquele é um trabalho que as forças fizeram que culminou com a explosão daquela embarcação, mas neste momento ainda não se pode avançar muito porque os Serviços Nacionais de Investigação Criminal (SERNIC) estão a trabalhar para apurar todos os factos que contribuiram para aquele incidente. O que se sabe é que naquela embarcação seguiam pessoas e conseguiu-se resgatar 12 delas e que estão [bem] de saúde]. Neste momento está-se a trabalhar para se ter informações completas sobre o que aconteceu lá.
Polícia confirma detenções nas águas de Cabo Delgado
DW África: E o barco foi incendiado ou houve uma explosão?
AG: Não podemos avançar nada agora, como disse, as informações ainda são incompletas. A SERNIC ainda está a trabalhar e depois vão dar-nos um relatório completo do que terá acontecido, se o barco foi incendiado e porquê ou se per si explodiu. Neste momento a SERNIC está a trabalhar, não gostaríamos de [falar] no trabalho que estão a fazer.
DW África: Há a desconfiança de que estes indivíduos estejam envolvidos no tráfico de drogas, mas há também a desconfiança de que podem estar ligados aos ataques armados no norte de Moçambique, na entrega de armas. Já há algum indício disso constatado pela polícia?
AG: Como estamos a dizer, nada podemos avançar agora, porque a SERNIC está a trabalhar. Só depois do fim do trabalho que neste momento a SERNIC está desencadear é que iremos saber se essas pessoas são cidadãos normais ou se estão envolvidos nessa situação que se refere ou não. Mas neste momento a SERNIC está a trabalhar para nos dar elementos para falarmos com propriedade, se eles são ou não. Mas neste momento não temos muitas informações.
DW África: E eles falam português?
AG: Não.
DW África: E em que região da província de Cabo Delgado forma encontrados?
AG: Na cidade de Pemba.
DW África: Foi no âmbito de uma operação de patrulha rotineira ou no contexto de uma denúncia que eles foram detidos?
AG: Este é um trabalho que a SERNIC e as forças estão a fazer já há muito tempo. E é por isso que digo que não tenho muito por avançar porque é um trabalho que a SERNIC já vem fazendo há muito tempo e eles ainda não passaram elementos suficientes para a polícia se pronunciar. Tudo o que a gente sabe é que é que aconteceu isto na cidade de Pemba, mas que a SERNIC neste momento está a trabalhar para apurar todas as desconfianças que estão a ser levantadas agora.
DW África: Houve alguma resistência por parte desses indivíduos ao serem abordados pela polícia?
AG: Como disse, a SERNIC ainda está a trabalhar e ainda não nos deu elementos suficientes para que possamos falar. Tudo o que a gente sabe é que aconteceu aquela ação e que foram resgatadas 12 pessoas que neste momento estão sob custódia policial.
DW África: São iranianos, não é?
AG: Diz-se que são iranianos. Mas a SERNIC ainda não nos deu informações suficientes.
Quais as motivações dos ataques armados em Cabo Delgado?
Há mais de nove meses que o norte de Moçambique tem sido palco de violentos ataques armados. Suspeitas há muitas e até já há um estudo, mas até hoje não está claro quem são os atacantes e nem o que os move.
Foto: Privat
Mocímboa da Praia: Era uma vez um lugar pacato...
Até 5 de outubro de 2017 a província de Cabo Delgado vivia na tranquilidade, pelo menos aparentemente. Mas desde essa data tudo mudou quando cerca de 30 homens armados desconhecidos atacaram três postos da polícia do distrito de Mocímboa da Praia, matando cinco pessoas, entre elas polícias, e ferindo mais de dez. Na altura a Polícia disse que estava a investigar o caso.
Foto: DW/G. Sousa
O alastramento dos ataques
Dois meses depois Mocímboa viveu novos ataques e desde essa altura os ataques armados têm vindo a alastrarar-se muito rapidamente para outros distritos. Palma começou a ser alvo a partir de janeiro de 2018.
Foto: DW/Estácio Valoi
Marcha contra um "Islão que não existe"
Uma semana depois do primeiro ataque Mocímboa da Praia marchou pela paz. A iniciativa juntou líderes de diferentes religiões, cristã e muçulmana, estes últimos a maioria na região. Os atacantes, que se dizem muçulmanos, defendem uma visão radical do Islão. As autoridades do distrito consideram que esse é um "Islão "que não existe", e acusam "os bandidos" de usaram a religião como "capa".
Foto: Estácio Valoi
Os indícios que não terão sido tomados a sério
Já em 2016 supostos pregadores do Islão foram expulsos do país por estarem ilegais no país. Também já foi intercetado um angariador de crianças a cujos pais era prometida educação e bons tratos. Mas o destino, passando por Nampula, eram escolas corânicas com o fim de radicalização. Há também detenções de pessoas que propagam a insurgência contra as instituições do Estado.
Foto: Colourbox/krbfss
Detenções e excesso de zelo
Cinco dias após o início dos ataques, a Polícia já tinha detido 52 pessoas, o que assustou alguns líderes religiosos. Mas havia outros líderes que eram a favor, justificando a necessidade de denunciar malfeitores para "purificar fileiras", mesmo que isso leve a excesso de zelo. Mas a Polícia ainda não sabe dizer quem são os atacantes, justificando sempre que está a trabalhar no assunto.
Uma das maiores reservas de gás de mundo está em Cabo Delgado. Em Palma as multinacionais operam no setor. Em Mocímboa da Praia há minas de rubis que são bem cotados nos mercados internacionais. O IESE, MASC e um líder muçulmano realizaram um estudo na sequência dos ataques e concluiram preliminarmente que o objetivo dos atacantes é garantir o tráfico dos inúmeros recursos da região.
Foto: ENI East
Erik Prince, o salvador da pátria?
Empresário norte-americano na área de segurança tem interesses nas empresas envolvidas nas dívidas ocultas. Uma delas a Proindicus, criada para garantir a segurança nas águas moçambicanas. Por outro lado acredita-se que tenha criado uma empresa de segurança e estaria a contar como pagamento pelos serviços os dividendos do gás. Eric Prince já prestou serviços para o Governo dos EUA no Iraque.
Foto: Imago/UPI Photo
Deslocados internos: Existem ou não?
O medo dos violentos ataques fez com que a população fugisse. Mas as autoridades locais garantem que ela regressa às suas comunidades graças à patrulha feita pelo exército e afirmam que são poucas as deslocações. Entretanto, não há números exatos. Quem está a lidar com esses deslocados são as autoridades locais. Até ao momento nenhuma agência da ONU ou ONG humanitária foram chamados a intervir.
Foto: Privat
Participação das FDS na reconstrução
Embora as FDS, Forças de Defesa e Segurança, não consigam impedir as ações dos atacantes elas garantem o patrulhamento depois dos ataques. Também auxiliam diretamente na reconstrução das casas incendiadas pelos atacantes. Isso, segundo as autoridades, permite o retorno da população às suas aldeias.
Foto: Borges Nhamire
Participação das comunidades
Supõe-se que os jovens que integram os grupos armados sejam recrutados nas comunidades. As autoridades pedem, por isso, que as populações se mantenham vigilantes e denunciem qualquer ilícito ou movimentação suspeita.
Foto: Privat
Governador visita comunidades
Os assassinatos tornam-se cada vez mais bárbaros. Há decapitações com recurso à catanas e nem as crianças escapam. Na sequência do recrudescimento dos ataques e do nível de violência o governador da província de Cabo Delgado, Júlio Parruque, visitou familiares das vítimas.
Foto: Privat
Presidente de Moçambique em Cabo Delgado
A 29 de junho de 2018 o Presidente Filipe Nyusi esteve nos distritos alvo dos ataques. Pouco antes disso o estadista tinha sido criticado por alguns setores por nunca se ter pronunciado publicamente sobre os ações violentas. Em Cabo Delgado, Nyusi prometeu proteção contra ataques e mostrou abertura, convidando os atacantes para dialogar.
Foto: privat
Um mar de gente para ouvir Nyusi
Em Cabo Delgado, Filipe Nyusi foi ouvido por milhares de pessoas a quem exortou para que se distanciem de crenças religiosas que estariam na origem da instabilidade: "Estão a recrutar pessoas nos distritos costeiros. Estão a ir também a Nampula recrutar pessoas para vir morrer aqui. Não deixem que isso aconteça. Estão a semear luto nas vossas famílias. E são jovens que vocês conhecem, denunciem".