Moçambique: Polícia impede marcha pacífica em Maputo
19 de abril de 2025
Dezenas de jovens e ativistas sociais juntaram-se, neste sábado (19.04), na Estátua de Eduardo Mondlane, na zona ocidental da capital Maputo, para uma marcha pacífica que foi impedida pela Unidade de Intervenção Rápida (UIR) da polícia moçambicana. A corporação justificou "não haver condições para a marcha".
No local da marcha, os jovens viram a UIR fortemente armada e posicionada com gás lacrimogéneo e viatura munida com canhão de água, para impedir o início da marcha.
O evento organizado pela sociedade civil visava repudiar as ondas de assassinatos, sequestros e desaparecimentos de jovens que começaram durante as manifestações do período pós-eleitoral.
"Esquadrões da morte"
Muito recentemente os chamados "esquadrões da morte", os supostos executores destas mortes, alegadamente tentaram matar um membro da Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), o músico Joel Amaral, conhecido como DJ Trufafá e muito ligado ao político Venâncio Mondlane.
Foi mesmo por causa desta tentativa de assassinato que a sociedade civil decidiu agendar a marcha deste sábado, para dizer "basta aos assassinatos", como se podia ler em alguns poucos cartazes no local do evento.
"Sinónimo de ditadura"
O ativista e organizador da marcha, Clemente Carlos, classificou a atitude da polícia como "repressão" e disse que "fica claro que apenas o partido FRELIMO [Frente de Libertação de Moçambique] é que tem o direito de marchar neste país".
Alguns jovens insistiram com a marcha e percorreram pela avenida Eduardo Mondlane, cantando "povo no poder", "salve Moçambique, este país é nosso", mas mais uma vez a polícia interceptou a manifestação e dispersou os jovens.
A polícia, usando megafones, apelava aos jovens para não seguirem com a marcha, alegando que não havia "condições" para tal.
Os organizadoras do evento até tentaram convencer a polícia sobre a legalidade da manifestação, mas a corporação não entendeu assim. Ivandro Sigaval, outro ativista e um dos organizadores da marcha, esclareceu que "antes desta atividade, tivemos um encontro com o comandante geral da polícia para dar detalhes sobre o objetivo desta marcha que é pacífica e prevista pela Constituição da República".
Mesmo diante de insistências, muita confusão e explicações sobre a legalidade da marcha, a polícia, tanto a UIR como a de proteção, preferiu posicionar blindados e "mahindras" (viaturas da polícia de proteção) para não deixar os manifestantes marcharem.
Por causa disto, houve inclusive troca de mimos entre a polícia, jornalistas e os líderes da marcha, mas sem detenções. Clemente Carlos afirmou que esta posição da polícia "é sinónimo de ditadura".
"Fica claro que não há aqui nenhuma espécie de liberdade. É preocupante, é mesmo um atentado à liberdade de expressão", criticou o ativista.
PGR chamada a esclarecer assassinatos
No meio da confusão, o ativista Ivandro Sigaval não deixou de falar aos jornalistas e criticou o silêncio da Procuradoria-Geral da República de Moçambique (PGR) diante dos assassinatos que estão a ceifar vidas a jovens "apenas por pensar diferente daquilo que o Governo pensa e estão aqui a reivindicar a má governação, e a falta de provisão das necessidades básicas da população".
Desde outubro do ano passado, as ondas de assassinatos já vitimaram pouco mais de 350 pessoas, segundo dados da Plataforma Decide. A sociedade civil tem estado a pressionar a PGR a posicionar-se diante destes crimes, mas até agora a Procuradoria ainda não reagiu.
Para o ativista Sigaval, este silêncio "não resolve, muito pelo contrário, ele implanta a dúvida, o medo e a comunicação entra em crise e cada um começa a explicar do seu jeito, a dar suas hipóteses não muito fidedignas sobre os assassinatos".
Os organizadores da marcha prometem reagendar o evento para uma data a anunciar.