Professores de vários subsistemas do ensino em Tete, em greve há cerca de duas semanas, reivindicam o pagamento de salários referentes a 2016 e 2017. As autoridades reconhecem o problema e pedem calma.
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Professores de vários subsistemas do ensino na província moçambicana de Tete estão em greve há cerca de duas semanas, reivindicando o pagamento dos salários e subsídios das horas extraordinárias referentes aos anos de 2016 e 2017.
Afirmam que não vão entregar as cadernetas de notas antes de receberem os seus ordenados em dívida. A Direção Provincial de Educação e Desenvolvimento Humano naquela região confirma a dívida e pede mais "calma" aos docentes.
Docentes da escola secundária de Tete ouvidos pela DW África disseram que todas as comunicações legais foram efetuadas junto das autoridades competentes, de modo a receberem os seus salários e subsídios em atraso. Mas esgotaram-se as negociações sem que se alcançasse um resultado que agradasse os docentes.
Falando em condição de anonimato, um docente da Escola Secundária de Tete garantiu que não vai entregar as cadernetas de notas aos sector pedagógico como forma de reivindicar o dinheiro em falta.
Questionado sobre a resposta da Direcção Provincial da Educação e Desenvolvimento Humano, o mesmo professor esclareceu: "só dizem que temos que aguardar, que estão a resolver o assunto e que brevemente será pago o dinheiro em dívida. Mas nunca mais chega o dia do pagamento".
Um outro professor, que também pediu para não ser revelada a sua identidade, apontou o dedo: "Existe dinheiro para pagar aos professores. Mas parece que ao nível da Direção Provincial [de Educação e Desenvolvimento Humano] não nos querem pagar. Estão sem vontade de fazê-lo. Mas nós iremos exigir a todas vias para recebermos o dinheiro", garantiu o docente .
Queixas na universidade
A greve dos professores na província de Tete não está a afetar apenas o ensino secundário, mas também no ensino superior. Os docentes da Universidade Zambeze (UniZambeze) estão em protesto desde 27 de novembro.Não deram exames aos estudantes
durante dois dias e só o fizeram depois das negociações com a direcção da universidade.
Um docente da UniZambeze, que também pediu anonimato por temer represálias, queixa-se de salários em atraso. "Há cinco meses que não sei o que é salário. Tenho dívidas nas lojas onde compro comida e não tenho como pagar. Mudei de casa duas vezes por não conseguir pagar a renda. Combinámos entre todos os docentes em não entregar as notas de frequência dos estudantes no setor pedagógico. A direção prometeu pagar até no fim do mês de janeiro, mas não tenho a certeza se o farão. Sempre justificam que vão pagar e nunca pagam", queixa-se o professor.
Uma estudante de um curso pós-laboral na Unizambeze, na província de Tete, disse à DW África que não fez exames durante dois dias, na semana passada, porque os docentes estavam em greve. Interromperam para controlar exames, mas depois voltaram à greve.
"Não sabíamos o que fazer. Fomos manifestar-nos em frente à direção no dia 29 de novembro, pedindo uma explicação. Prometeram que tudo já estava resolvido, mas esta semana ficamos surpresos quando os docentes não quiseram divulgar as notas alegando que ainda não haviam recebido os seus salários. Estamos a pedir socorro porque mensalmente pagamos propinas", lembra o estudante.
Autoridades prometem pagar
O sindicato provincial dos professores já se reuniu com a Direção Provincial da Educação e Desenvolvimento Humano de Tete, de modo a ultrapassar o impasse. Mas não resultou em nenhum acordo positivo.
O diretor-adjunto provincial da Educação e Desenvolvimento Humano em Tete, João Barroso, disse à imprensa que os professores deviam ter mais "paciência" e "calma" porque o assunto está sendo resolvido junto as autoridades competentes para se pagar todas as dívidas que o setor tem juntos dos docentes.
"Os professores não se devem pautar por este tipo de comportamento. Já nos sentámos e fizemos perceber que o assunto dos salários e horas extraordinárias está a ser resolvido o mais rápido possível. Por isso, queremos que eles entreguem as cadernetas nos setores pedagógicos para facilitar o apuramentos das notas de cada aluno. (...) a dívida será paga”, afirmou João Barroso.
Faces de Tete e do carvão de Moçambique
A vida mudou na província de Tete desde a chegada de empresas multinacionais para explorarem o carvão. Os ventos da mudança trouxeram, para alguns, oportunidades para melhorar de vida; para outros, novas preocupações.
Foto: DW/Marta Barroso
Coque, o trabalhador
Coque tem 28 anos. Trabalha há quatro anos na empresa mineira britânica Beacon Hill. Lá, amarra lonas nos camiões que transportam o carvão até ao vizinho Malawi. Tal como muitos jovens na região, dantes Coque fabricava tijolos que vendia no mercado local. Mas hoje, diz, vive melhor. Por camião recebe 800 meticais, cerca de 20 euros, que divide com o colega que estiver com ele no turno.
Foto: Marta Barroso
Paulo, o diretor de operações da Vale
Apesar dos enormes incentivos fiscais de que gozam as empresas dos megaprojetos em Moçambique, como a brasileira Vale, Paulo Horta diz que um projeto de mineração como o de Moatize gera uma cadeia produtiva tão grande que a população local beneficia em grande medida com a sua vinda para Tete: através da criação de outras empresas, serviços, tributos gerados por terceiros e criação de empregos.
Foto: DW/Marta Barroso
Gomes António, vítima de maus tratos
Gomes António Sopa foi espancado e detido pela polícia na sequência da manifestação de 10 de janeiro de 2012, quando os habitantes de Cateme bloquearam a passagem do comboio que transportava carvão das minas até ao porto da cidade da Beira. Muitas das promessas feitas pela Vale, responsável pelo reassentamento de centenas de famílias, continuam por cumprir. Ainda hoje, Gomes António sente dores.
Foto: Marta Barroso
Duzéria, a curandeira
Os habitantes do Centro de Reassentamento de 25 de Setembro, no distrito de Moatize, queixam-se de que muitos aspetos culturais não foram respeitados durante o processo de reassentamento pelas empresas mineiras. A curandeira do bairro, por exemplo, diz que no planeamento do complexo não se teve em conta a construção de uma casa para o seu espírito.
Foto: Marta Barroso
Lória, a rainha
Provavelmente Lória Macanjo e a sua comunidade deverão ser reassentadas brevemente: a multinacional Rio Tinto está já a operar um mina de carvão em Benga, perto da sua aldeia, Capanga. Também aqui, debaixo da terra que herdou do pai, a empresa mineira descobriu carvão. Mas a rainha sabe do destino dos que já se mudaram e recusa-se a deixar a sua casa.
Foto: DW/Marta Barroso
Olivia, a cabeleireira
Olivia (esq.) tem 29 anos e veio em 2008 do seu país, o Zimbabué, fugindo à crise financeira que lá se vive. Tete é agora a terra das grandes oportunidades, tinham-lhe dito. Hoje, é cabeleireira no Mercado Primeiro de Maio e, tal como a amiga Faith (dir.) faz trabalhos de manicure. Diz que, por dia, consegue 500 a 1000 meticais, entre 15 e 25 euros. Com esse dinheiro consegue sustentar-se.
Foto: DW/Marta Barroso
Guta, o empresário
Ao todo, Guta emprega 130 homens nas áreas de carpintaria e construção civil na cidade de Tete. Diz que desde a chegada das grandes empresas à região não sentiu grandes alterações no seu negócio. Os projetos de mineração requerem quantidades às quais não consegue responder. Uma vez, conta, a Vale pediu que fornecesse, juntamente com outra carpintaria da cidade, 5000 portas em 60 dias.
Foto: DW/Marta Barroso
Canelo, o vendedor de amendoins
Canelo diz que tem 11 anos. E diz também que frequenta a segunda classe. Todas as tardes vende amendoins no centro de Tete. "Para ajudar a mãe que não tem trabalho." O pai também está desempregado. Canelo é uma de muitas crianças que vendem amendoins na cidade. Um saco pequeno fica por dois meticais, cerca de cinco cêntimos de euro, o maior custa cinco meticais, treze cêntimos de euro.
Foto: DW/Marta Barroso
Catequeta, o ativista
Manuel Catequeta mudou-se para Tete em 2001. O ativista dos direitos humanos sabe o que custa viver com a subida constante do custo de vida. O seu salário não lhe permite luxos. A sala de sua casa "de dia é sala, de noite vira quarto". Mas mudar de casa, para já, está fora de questão. Hoje em dia, uma boa casa na capital provincial passa dos 5.000 dólares, cerca de 4.000 euros, por mês.
Foto: DW/Marta Barroso
Júlio, o otimista
O músico Júlio Calengo vê oportunidades de negócio, agora que em Tete há tantas empresas novas. O seu objetivo é, em breve, montar uma empresa de limpeza: tanto nos escritórios das empresas mineiras como nos das firmas que entretanto apareceram na cidade. Interessados não vão faltar, diz Júlio. O que é preciso é ter criatividade e, claro, dinheiro.