Moçambique apoia autodeterminação do Saara Ocidental
Leonel Matias (Maputo)
23 de fevereiro de 2017
Presidente da República Árabe Saarauí Democrática recebeu o apoio de Maputo no diferendo com Marrocos. Joaquim Chissano será o enviado especial da União Africana para a resolução do conflito.
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O Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, reiterou esta quarta-feira (22.02), em Maputo, o total apoio do país a todas as iniciativas internacionais na luta do povo saarauí à autodeterminação. Uma promessa deixada durante a visita do Presidente da República Árabe Saarauí Democrática (RASD), Brahim Ghali, a Moçambique, que terminou esta quinta-feira (23.02).
Um diferendo opõe a República Saarauí a Marrocos, com este país a reivindicar a autonomia do território sob a sua soberania. As autoridades saarauís rejeitam esta reivindicação e exigem a autodeterminação do território.
UA como plataforma de conciliação
A RASD é membro de pleno direito da União Africana (UA) desde 1984, facto que levou, na altura, Marrocos a abandonar a organização pan-africana. O país foi readmitido no passado mês de janeiro.
Esta readmissão é encarada por Filipe Nyusi como a criação de condições de uma plataforma de oportunidades necessárias para conciliar as posições das duas partes. o Presidente defende que a União Africana deverá facilitar a abertura de vias para negociações abertas e francas no quadro dos princípios da intangibilidade das fronteiras e boa vizinhança que caracteriza a interação no seio da organização.
"O Governo de Moçambique continuará a apoiar os esforços tendentes a aproximação das partes e o alcance de uma solução sustentável e duradoura no quadro da União Africana e da Organização das Nações Unidas”, defende.
Do lado da RASD, Brahim Ghali afirma que "o povo saarauí irá continuar a resistir até a vitória, até que África esteja totalmente independente”.
"Somos e seremos a última colónia em África”, entende.
Readmissão sem consenso
A readmissão de Marrocos na União Africana tem dividido os países africanos. O ministro moçambicano dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, Oldemiro Balói, defende sinceridade dos que apoiaram a decisão.
"O nosso desejo ardente é que haja boa-fé por parte dos que defenderam a entrada de Marrocos a todo o custo, argumentando que seria a forma do problema do Saara Ocidental ser debatido dentro da família, respeitando os princípios da União Africana”, nota.
Já o homólogo saaraui, Muhamed Salek, espera que Marrocos mantenha e honre os compromissos que assumiu, aceitando, sem condições e sem reservas, a ata constitutiva da União Africana.
Chissano o enviado da UA
O ministro dos Negócios Estrangeiros e Cooperação da RASD revelou ainda que Joaquim Chissano, antigo Presidente moçambicano, será o enviado especial da União Africana para a resolução do diferendo entre a RASD e Marrocos. Um nome que agrada a Salek.
"O Presidente [Joaquim] Chissano e todos os diplomatas moçambicanos têm trabalhado para que haja paz em Madagáscar, nas Comores e em muitos países e Moçambique, na sede da ONU e da União Africana, tem trabalhado sempre nas operações de manutenção da paz e contribuiu positivamente”, refere.
A visita do Presidente da República Árabe Saarauí Democrática, Brahim Gahli, a Moçambique culminou com a assinatura de um memorando de cooperação sobre consultas políticas entre os dois países.
23.02.2017 RASD / Moçambique - MP3-Mono
50 anos de União Africana
A Organização da Unidade Africana (OUA) nasceu há 50 anos. Em 2002, a União Africana seguiu-lhe os passos. Recordamos cinco décadas de unidade.
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Uma mulher no poder
Em 2012, Nkosazana Dlamini-Zuma tornou-se a primeira mulher a presidir à Comissão da União Africana (UA). A ex-ministra do Interior da África do Sul trouxe uma nova dinâmica à UA, diziam observadores 100 dias depois de Dlamini-Zuma tomar posse. O grupo de 53 Estados celebra o 50º aniversário a 25 de maio de 2013.
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Unidade contra a divisão
Do grupo inicial da Organização da Unidade Africana (OUA) faziam parte todos os 30 países que já tinham conquistado a independência no continente. A união política tentava evitar uma África dividida. Isto porque os estados africanos se polarizavam a favor e contra o Ocidente, influenciados pelas grandes potências da Guerra Fria. Aqui uma fotografia de uma cimeira em 1966.
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Precursores do pan-africanismo
Kwame Nkrumah (esq.), o primeiro Presidente do Gana, e o imperador etíope Haile Selassie (centro) são dois dos fundadores da OUA. O pan-africanista Nkrumah tinha em mente a criação de uns "Estados Unidos de África" para competir com as forças coloniais e desenvolver um mercado comum. Mas os estados recém-independentes não queriam ir tão longe.
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Inimigo comum
Um objetivo bastante importante nas primeiras décadas da OUA foi a luta contra o regime racista de 'apartheid' na África do Sul. Logo no ano em que foi criada, a organização criou um comité de libertação. A partir de 1970, a OUA apoiou também a luta armada contra o regime de 'apartheid'.
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Novo impulso para a economia
A OUA quis acelerar o desenvolvimento económico em África com o Plano de Ação de Lagos em 1980. O plano previa, entre outros pontos, a criação de um mercado comum até 2000. Mas, à semelhança de outros projetos da organização, o plano não passou do papel. Em 1991 seguiu-se o Tratado de Abuja, que prevê o estabelecimento de uma Comunidade Económica Africana até 2025.
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Decisão polémica
Apesar da sua política de não se imiscuir nos assuntos de delimitação de fronteiras, a OUA reconheceu em 1982 a "República Árabe Sarauí Democrática" (Saara Ocidental), reivindicada pelo movimento independentista Frente Polisário. Nessa altura, Marrocos saiu da organização. Até hoje, foi o único país que saiu da OUA por livre iniciativa.
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Críticas à OUA
O caso do Saara Ocidental continua a ser uma exceção à política de não interferência da OUA. Mas essa posição também levantou críticas. Observadores protestaram contra o chamado "clube dos ditadores" na cimeira anual em Addis Abeba. Um dos poucos críticos na organização foi Yoweri Museveni, que se tornou Presidente do Uganda em 1986.
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Atuação em conflitos
No início dos anos 90, a OUA introduziu uma nova política: África queria assumir a responsabilidade pelos seus conflitos. Por isso, criou o chamado "Mecanismo de Paz". No golpe militar no Burundi em 1996, a organização respondeu com sanções. Porém, o "mecanismo" mostrou-se frequentemente incapaz de atuar. Inclusive no genocídio no Ruanda.
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Quem espera…
Grande motivo de contentamento foi a adesão da África do Sul à OUA em 1994, três décadas depois do nascimento da organização. Entretanto, o país desempenha um papel importante em Addis Abeba – para alguns, demasiado importante.
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Uma nova era
Com o fim da Guerra Fria e do 'apartheid' na África do Sul, a OUA tentou começar de novo a partir de 1999. Isso proporcionou ao líder líbio Mouammar Kadhafi (aqui numa cimeira em 2006) uma boa oportunidade para trazer, de novo, à luz do dia a ideia pan-africana dos "Estados Unidos de África". Para a alcançar, Kadhafi utilizou também a sua riqueza, pagando as dívidas de vários estados-membros.
Foto: picture alliance/dpa
OUA torna-se União Africana
Mas Kadhafi não conseguiu que as suas ideias fossem para a frente. O seu plano contribuiu apenas para dividir opiniões depois do lançamento oficial da União Africana em 2002 na cidade de Durban, na África do Sul. O tratado fundador da União Africana prevê, como princípio orientador, o abandono da política de não interferência.
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Instituição sem poder
Ao criar as suas estruturas, a UA usou como modelo a União Europeia (UE) e propôs um Parlamento pan-africano. O órgão foi inaugurado em 2004, sendo constituído por 235 representantes de 47 países. O Parlamento fica na pequena cidade de Midrand, na África do Sul. A distância relativamente à sede da União Africana em Addis Abeba simboliza o limitado poder de influência do Parlamento.
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Luta pela paz
No início do século XXI, conflitos violentos afetavam 20% dos africanos. O foco principal da UA foi, por isso, a paz. Em 2004, a organização criou um Conselho de Paz e Segurança, que está também autorizado a enviar tropas de intervenção. Nesse mesmo ano, a UA enviou soldados para a região sudanesa do Darfur para proteger a população civil. Os desafios continuam a ser muitos.