Moçambique: Província de Manica marcha contra a corrupção
Bernardo Jequete (Manica)
9 de dezembro de 2017
No Dia Internacional Contra a Corrupção (09.12), Moçambique celebra a data sob o lema "Unidos contra a corrupção para o desenvolvimento, paz e segurança". Cidadãos querem pôr fim ao "refresco".
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Em Manica, no centro de Moçambique, o Dia Internacional Contra a Corrupção foi marcado pela marcha promovida pela Procuradoria Provincial e Gabinete Anti-corrupção. Agentes da polícia de migração, da Polícia da República de Moçambique, guardas prisionais, entre outros cidadãos, marcaram presença na marcha que pretendeu repudiar os atos de corrupção na província e no país.
Celestino André, residente em Chimoio, é da opinião que os casos de corrupção se estão a multiplicar nos últimos anos. "Há corruptos tanto no seio dos funcionários públicos como nos privados. Principalmente nas estradas, existem muitos polícias que cobram dinheiro sem justa causa ou sem que se tenha cometido alguma infração. Também em concursos públicos se pede o chamado "refresco" para se poder ser admitido em determinado emprego", lamenta Celestino André.
"Gostaria que o Governo lutasse para diminuir este mal. Na minha ótica, acabar com o fenómeno será difícil. Todavia, deve haver rigorosidade no cumprimento da lei como também na sua implementação", defendeu o cidadão.
Para Celestino André, além das vias públicas, a corrupção tem lugar também em hospitais e escolas. "Quando estamos no final do ano, os professores pedem mais os vulgos refrescos aos alunos, de forma a que seja atribuido ao aluno uma boa nota" acrescentou o cidadão.
Também a procuradora-chefe provincial, Angélica Napica, condenou com veemência os atos de corrupção que tendem a crescer envolvendo dirigentes públicos e privados.
"A corrupção tem um caráter destruidor e maléfico. Contribui para o descrédito, perda de legitimidade, enfraquecimento do poder de influência das instituições públicas e privadas. Degrada os valores morais da sociedade. A corrupção atrofia as fundações do desenvolvimento económico e social e desencoraja o investimento estrangeiro direto, até mesmo das companhias nacionais", disse a procuradora-chefe provincial de Manica.
Angélica Napica disse ainda que a luta contra a corrupção e peculato, participação económica ilícita, tráfico de influência, enriquecimento ilícito são um imperativo nacional e não apenas monopólio do Gabinete Central de Combate à Corrupção (GCCC).
"Entendemos que, para combater a corrupção nas nossas instituições públicas e privadas, ações repressivas não são suficientes. Exortamos que sejam divulgadas medidas preventivas e punitivas dos crimes de corrupção e conexos, a todos níveis. Estamos cientes de que o combate à corrupção e os crimes conexos com envolvimento de toda sociedade são um desafio possível para o Governo de Moçambique", afirmou Angélica Napica.
A procuradora-chefe provincial defendeu que o Governo do país está "comprometido" com a causa nacional contra a corrupção. "Juntos conquistaremos a consciência daqueles que ainda não a ganharam sobre a necessidade absoluta de combater este fenómeno nefasto para a sociedade em geral", disse Angélica Napica.
Governador pede fim da corrupção nas maternidades
Já o governador da província de Manica, Alberto Ricardo Mondlane, encorajou os servidores públicos e privados a pautarem-se pelo bom atendimento aos cidadãos moçambicanos visando acabar com os comportamentos que considerou como desumanos.Alberto Mondlane desafiou aos técnicos de saúde a abandonarem atos de cobranças ilícitas aos pacientes, principalmente em maternidades.
O governador disse que "os índices de corrupção que se apresentam no país são muitos elevados e assustadores" e que, para o combate ao fenómeno, é necessária a "participação ativa e patriótica de todos os órgãos de justiça e de legislação".
"O sucesso da nossa missão será aferido não somente pelo mero cumprimento das tarefas plasmadas nos nossos programas e planos; mas, sobretudo, pelo grau de satisfação da população pelos serviços que prestamos. O Governo deve ser implacável contra a corrupção. Portanto, não esperem mais uma outra orientação", desafiou Alberto Mondlane.
Maxixe: Obras sem qualidade são adjudicadas por milhões
Em Maxixe, Moçambique, somam-se os casos de obras públicas sobrefaturadas. A DW África juntou exemplos de obras cujo processo de adjudicação não foi transparente e nas quais os orçamentos foram inflacionados.
Foto: DW/L. da Conceição
Favorecimento na seleção das empresas
Em Maxixe, parte das obras de construção civil têm sido adjudicadas à empresa SGI Construções Lda. que não se encontra registada no Boletim da República e que apenas tem escritórios em Maputo. A empresa, com laços fortes com o Presidente do município, Simão Rafael, faturou, nos últimos dois anos, mais de 30 milhões de meticais (cerca de 427 mil euros) em obras que até hoje ainda não terminaram.
Foto: DW/L. da Conceição
Falta de transparência
Como se vê na imagem, para além de não se saber a data do início desta obra, não se conhece o fiscal nem a distância exata para a colocação de pavés. Sabe-se apenas que tem um prazo de execução de 90 dias.
Foto: DW/L. da Conceição
Figuras ligadas à FRELIMO criam empresa
Esta obra, orçada em mais de sete milhões de meticais, foi adjudicada à MACROLHO Lda, uma empresa com sede em Inhambane e que tem, segundo a imprensa local, participações de sócios ligados ao partido FRELIMO, como o ex-governador de Inhambane, Agostinho Trinta. Faturou, nos últimos dois anos, mais de 40 milhões de meticais em obras que, até agora, ainda não foram entregues. O prazo já expirou.
Foto: DW/L. da Conceição
Obras faturadas e abandonadas
Esta via é a entrada do bairro Eduardo Mondlane. Desde 2016, o munícipio já gastou na reparação desta estrada - com cerca de 200 metros -, mais de quatro milhões de meticais. Até à data, apenas foram executados 150 metros. Ao que a DW África apurou, o empreiteiro apenas trabalha nos dias de fiscalização dos membros da assembleia municipal. O dinheiro faturado dava para pavimentar mais de 1 km.
Foto: DW/L. da Conceição
Obras sobrefaturadas
Este é o estado atual de várias obras na cidade de Maxixe. Na imagem, a via do prolongamento da padaria Chambone, foi faturada em mais de cinco milhões de meticais (cerca de 71 mil euros) no ano de 2016. No entanto, esta mesma obra voltou a ser faturada este ano, não tendo o valor sido tornado público.
Foto: DW/L. da Conceição
Obras sem qualidade
Desde o ano de 2015, o conselho municipal da cidade de Maxixe já gastou mais de 10 milhões de meticais (cerca de 142 mil euros) com as obras de reparação de buracos nas avenidas e ruas do centro da cidade. No entanto, o trabalho não tem qualidade e os buracos continuam a danificar carros ligeiros. O empreiteiro desta obra é também a SGI Construções Lda.
Foto: DW/L. da Conceição
MDM denuncia corrupção
A bancada do MDM na assembleia municipal de Maxixe denunciou que as viaturas adquiridas pela edilidade não estão a ser compradas em agências, mas no mercado negro em África do Sul. Diz a oposição que as últimas duas viaturas adquiridas custaram mais de sete milhões de meticais. Um preço quatro vezes superior, quando comparado ao valor das duas viaturas no mercado em Moçambique.
Foto: DW/L. da Conceição
“Não interessa qualidade, queremos faturar”
Jacinto Chaúque, ex-vereador do município de Maxixe, está a ser investigado pelo Gabinete de Combate à Corrupção de Moçambique. Da investigação consta, entre outros, uma gravação telefónica entre Chaúque e o empreiteiro desta obra, na avenida Ngungunhane, e em que o ex-vereador afirma que “não interessa a qualidade. Queremos faturar nestas obras”. Chaúque está a aguardar julgamento.
Foto: DW/L. da Conceição
Preços altos nas construções de edifícios
Em 2015, o conselho municipal de Maxixe construiu um posto policial no bairro de Mabil. Esta infraestrutura - com apenas dois quartos, uma sala comum e uma cela com capacidade para cinco pessoas – custou mais de 1,3 milhões de meticais, não contando com a aquisição de material como mesas ou cadeiras. Ao que a DW África apurou junto do mercado, esta obra não custaria mais de 300 mil meticais.
Foto: DW/L. da Conceição
Um milhão de meticais por cada sede do bairro
As sedes dos bairros são outro exemplo. Todas as sedes dos bairros construídas pelo conselho municipal contam com a mesma planta. Cada uma custou cerca de um milhão de meticais (cerca de 14 mil euros). O preço real de mercado para uma casa tipo dois, sem mobília de escritório, é de cerca de 300 meticais.
Foto: DW/L. da Conceição
Empreiteiro exige dinheiro de volta
O empreiteiro Ricardo António José reclamou, em 2015, a devolução do dinheiro que foi exigido pelo ex-chefe da Unidade Gestora Executora e Aquisições, Rodolfo Tambanjane. O montante pago por Ricardo José era referente ao valor da comissão de Tambanjane por ter selecionado esta empresa e não outra. Rodolfo Tambanjane foi preso, tendo saído depois de pagar caução. O caso continua em tribunal.