Moçambique quer endurecer luta contra o trabalho infantil
Sitoi Lutxeque (Nampula)
22 de abril de 2019
Mais de um milhão e duzentas mil crianças trabalham em Moçambique. Na província de Nampula, onde o fenómeno é mais flagrante, organizações não-governamentais e Governo traçam planos para conter a exploração infantil.
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Dados estatísticos do Ministério do Trabalho, Emprego e Segurança Social de Moçambique apontam Nampula como uma das províncias com mais casos de trabalho infantil. De acordo com Marta Isabel Mate, diretora nacional do Trabalho, Emprego e Segurança Social, o problema ‘‘está espalhado um pouco por todo o país”, mas localiza-se sobretudo no "comércio informal, nas atividades do garimpo e nos corredores junto às regiões fronteiriças''.
A pobreza extrema, segundo Marta Mate, é um dos principais fatores que contribui para o aumento da exploração infantil, por isso o Governo, no âmbito da política do emprego, produziu, no ano passado, o plano nacional para combater o trabalho infantil.
‘‘Estamos agora a desempenhar aquilo que são as principais tarefas desse plano, que tem a ver com a sensibilização, neste primeiro ano, e divulgação. Já produzimos uma lista dos trabalhos considerados perigosos para crianças e já a introduzimos na proposta de revisão da lei do trabalho [depositada na Assembleia da República]”, indica a responsável.
Erradicar a exploração infantil
Marta Mate garante que o Governo está comprometido com o objetivo de eliminar o trabalho infantil. "O nosso plano de ação prevê atividades para a retenção das crianças nas famílias. Prevê apoio às famílias vulneráveis, através de programas de ação social e prevê, igualmente, apoio a crianças em situação de vulnerabilidade, resultado do VIH/SIDA'', exemplificou a diretora nacional do Trabalho, Emprego e Segurança Social.
Além do Governo, organizações não governamentais (ONG) que trabalham com crianças estão a fazer campanhas de sensibilização contra o trabalho infantil. Uma delas é a Solidariedade Zambézia, com sede na província de Nampula.
Manuel Conta é o diretor-executivo da organização e revela à DW África que muitas crianças acabam nas teias da prostituição em áreas da indústria extrativa, razão pela qual a organização tem investido em trabalhos de sensibilização em zonas de mineração. ‘‘Vamos continuar a fazer esse trabalho [de sensibilização], é um trabalho que iniciámos em 2016”, afirmou.
Falta de apoios
Moçambique quer endurecer luta contra o trabalho infantil
A falta de verbas é uma das dificuldades que a Solidariedade Zambézia enfrenta para levar a cabo a sua missão. Manuel Conta assevera que a organização tem um projeto voltado para as crianças que vivem nas ruas, mas atualmente precisa de 18 milhões de meticais (cerca de 247 mil euros) para o concretizar.
‘‘Estamos agora a fazer um projeto, mas não sabemos se teremos um doador, porque muitos não querem financiar a área socia. Na verdade, a província de Nampula tem sérios problemas de trabalho infantil”, disse.
Por outro lado, o responsável daquela ONG alerta que, em função da realidade vivida no terreno, o número de crianças envolvidas no trabalho infantil em Moçambique pode ser bem superior a um milhão e duzentas mil, embora não avance outros números.
Moçambique: Os jovens carregadores de Manica
Carregar mercadorias à cabeça é uma profissão comum em Manica. O trabalho é pesado e implica competir com colegas e transportes de passageiros pelos clientes. Ainda assim, também há crianças entre os carregadores.
Foto: DW/B. Jequete
Usar a cabeça
Os carregadores transportam diversos tipos de mercadorias ou bagagem de um ponto para o outro, usando a cabeça como suporte. Este é o ganha-pão de muitos jovens moçambicanos, que assim conseguem garantir a sustentabilidade da família. Mesmo que a bagagem seja pesada, os carregadores não têm "mãos a medir".
Foto: DW/B. Jequete
Quando não há emprego
Na maioria, os carregadores são jovens escolarizados, mas fazem carga e descarga de produtos em viaturas, usando a cabeça para ganhar dinheiro. Há também chefes de família nesta profissão: os filhos frequentam a escola graças a esta atividade. Mas muitas pessoas evitam assumir-se como carregadores, por vergonha.
Foto: DW/B. Jequete
Amigos, amigos... Negócios à parte
Os carregadores são amigos, mas apenas de "trincheira". Quando acaba de chegar um camião contendo mercadoria para ser carregada, há muitas vezes troca de "mimos" na disputa pelo trabalho. Não são raros os empurrões para decidir quem ganha mais lotes para transportar: quanto maior for o número de mercadorias, maior será o valor recebido ao final do dia.
Foto: DW/B. Jequete
Carregadores VS Chapas
Também os transportes de passageiros ou chapas são vistos como adversários diretos dos carregadores. Os motoristas acabam por usar a parte de cima dos veículos como bagageira. "Nos últimos dias, não temos tido movimento, porque muitos são enganados pelos cobradores [de bilhetes dos chapas] para que as suas bagagens sejam levadas nos <i>minibuses</i>", diz um carregador ouvido pela DW em Manica.
Foto: DW/B. Jequete
Poupar no transporte
Algumas "mamanas", mulheres moçambicanas, recusam recorrer aos serviços dos carregadores. Percorrem longas distâncias com muito peso à cabeça, mas não desistem de o fazer para poupar dinheiro. Por vezes, os carregadores cobram valores que chegam quase à metade do preço do produto a ser transportado. "Não faz sentido mandar carregar, preferimos fazê-lo sozinhas", afirmam.
Foto: DW/B. Jequete
Descansar o pescoço
Elídio Morais, pai de três filhos, decidiu comprar uma bicicleta após cinco anos a carregar mercadorias à cabeça, numa altura em que já sentia que "o pescoço se atrofiava". Usa a bicicleta para fazer o mesmo trabalho e consegue alimentar a sua família. Encoraja os jovens que se envolvem na criminalidade alegando a falta de emprego a enveredar pela ocupação de carregador: "Há espaço para todos".
Foto: DW/B. Jequete
Trabalho infantil
No Mercado 38mm, o maior mercado grossista em Chimoio, há quem pague às crianças que por ali circulam em busca de produtos rejeitados para carregarem mercadorias. Nestes casos, é o proprietário da carga quem estipula o preço. Mas há quem "contrate" estas crianças a baixo custo. E muitas acabam por abandonar a escola. O peso excessivo das cargas é um risco nesta fase de desenvolvimento.
Foto: DW/B. Jequete
Carregar para estudar
Zacarias Fombe, de 16 anos, é carregador. Frequenta a 10ª classe e carrega mercadorias para pagar os estudos. Quer ser funcionário público e ajudar os irmãos a estudar. "Um dia estava a passear neste mercado e um senhor chamou-me para transportar a sua bagagem. Vi que o meu problema seria resolvido com esta atividade", conta.
Foto: DW/B. Jequete
Pagar para carregar: um desperdício?
Joelma Banda, acompanhada pela irmã, conta à DW que está na fase inicial do seu negócio e, por isso, opta por carregar sozinha o produto. Pagar a um carregador é um desperdício: o valor cobrado pode ser usado para investir no seu negócio ou comprar comida para casa. Quando o negócio aumentar, diz Joelma, já poderá contratar carregadores.
Foto: DW/B. Jequete
A alma do negócio
Abrãao Fazbem, de 18 anos, foi carregador. Mas não por muito tempo. Entrou na atividade com o intuito de ganhar dinheiro para começar o seu próprio negócio. "Fi-lo durante alguns meses. Quando consegui juntar um valor, deixei e parti para o mundo do negócio. Vendo sacos de plástico e temperos", conta o jovem. De manhã, trabalha no mercado, à tarde vai à escola.
Foto: DW/B. Jequete
De carregador para "tchoveiro"
Os "tchovas", carrinhos de mão de tração humana, mudaram a vida de alguns carregadores. Mas os velhos hábitos mantêm-se: quando a carga é pouca, os "tchoveiros" ainda usam a cabeça. Estes e outros veículos são competição direta para os carregadores. Em Manica, cidadãos com viatura própria aproveitam para passar no mercado a caminho do trabalho para carregarem produtos e ganharem um dinheiro extra.
Foto: DW/B. Jequete
As vantagens dos carrinhos de mão
Por vezes, a carga é muita e os carregadores recusam transportar a mercadoria. É aqui
que entram em ação os "tchovas" - um serviço mais caro, mas, ainda assim, mais barato do que alugar uma carrinha. Os carrinhos de mão são os mais solicitados pelos agentes económicos para fazer o transporte dos produtos do mercado grossista para as suas lojas.