Em Moçambique, as críticas são muitas ao pagamento dos subsídios de reintegração social dos deputados da última legislatura. Mas antigos deputados pelo círculo eleitoral da Zambézia desvalorizam as críticas.
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Mais de mil milhões de meticais (mais de 13 milhões de euros) é o valor previsto no orçamento da Assembleia da República deste ano para o pagamento dos subsídios de reintegração social aos deputados da legislatura anterior. É uma das maiores fatias do orçamento. Cada deputado que terminou o mandato recebe cerca de quatro milhões de meticais (o equivalente a 54 mil euros).
O montante gerou polémica. O Fórum de Monitoria do Orçamento considera o valor "demasiado elevado", sobretudo olhando para as condições de vida da maior parte dos moçambicanos. Mas, contactados pela DW, vários deputados sacodem as críticas e sublinham que o subsídio não é nada de novo.
É o que diz, por exemplo, José Lobo, do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), um dos beneficiados pelo subsídio.
"Os subsídios dos deputados da Assembleia da República foram aprovados em 2014. Eu sei que a sociedade civil está constrangida por causa da ação do Governo, mas o subsídio dos deputados está legislado, não é coisa nova", justifica Lobo, acrescentando que "os deputados das legislaturas passadas também recebiam."
Previsto na lei
O subsídio de reintegração está previsto na lei do Estatuto do Deputado promulgada em dezembro de 2014 pelo então Presidente, Armando Guebuza. O artigo 45 do documento estabelece que, quando cessa o mandato, os parlamentares têm direito a um subsídio de 75% do salário base, por cada ano de exercício.
Para Nelson Paiva, ex-deputado da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) e outro dos beneficiários do subsídio, o pagamento dos quatro milhões de meticais é incontestável - até porque fez descontos para a pensão de aposentação. Quem faz os descontos recebe o subsídio: é o que está previsto na lei.
"Confesso que só quem está lá dentro é que sabe que, realmente, ao deputado é descontado 13% do seu salário. Não é uma oferta. É o direito dele, do deputado."
Sociedade civil contesta
Mas, segundo o académico Lourido Verde, o grande problema é a quantia de dinheiro em causa, além das muitas regalias e "mordomias" dos deputados. É algo que não cai bem na sociedade, numa altura em que o país enfrenta uma grave crise económica e precisa de dinheiro extra para lutar conta a propagação do novo coronavírus.
Para o académico, "todo o excesso cria a diferenciação social" e é este problema que faz com que as pessoas se revoltem.
"Uns sofrem cortes e outros continuam a manter as suas regalias. Estamos a ser representados por pessoas que não são sensíveis, insistem em distribuir o pão para eles e não lutam para distribuir o pão pelo povo", defende Lourido Verde.
Crise de representação
Já o analista Ricardo Raboco entende que a questão do subsídio de reintegração social dos deputados põe a nu a crise de representação política. "Ser deputado já não é ser porta-voz do cidadão. É uma questão de emprego, o que faz com que toda a gente hoje queira ser deputado."
Em 2014, a lei do Estatuto do Deputado foi aprovada no Parlamento com os votos a favor da FRELIMO, e os votos contra da Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO) e do MDM. José Lobo, do Movimento Democrático de Moçambique, faz um apelo:
"Não vale a pena agredir os deputados, porque os deputados não têm culpa nenhuma - fundamentalmente a oposição. Todas as leis, todas as iniciativas apresentadas pela oposição, a maioria chumba, o que passa são as leis e as iniciativas apresentadas pela FRELIMO."
Obras sobrefaturadas transformam Vilanculos em cidade-fantasma
Falta de transparência, obras inacabadas e a preços exorbitantes. Corrupção generalizada no Conselho Municipal de Vilanculos, em Inhambane, gera construções inacabadas, que não podem aproveitadas pela população.
Foto: DW/L. da Conceicao
O triplo do preço real
No Conselho Municipal de Vilanculos, na província moçambicana de Inhambane, os preços das obras estão a ser adulterados para beneficiar funcionários que recebem comissões ilegais de empreiteiros depois da adjudicação. Três balneários públicos ainda em construção custaram meio milhão de meticais aos cofres públicos, três vezes acima do preço normal.
Foto: DW/Luciano da Conceição
Construções desnecessárias
O Conselho Municipal de Vilanculos construiu um alpendre com mais de 50
bancas. O investimento foi de 1,5 milhões de meticais, mas, há dois anos, quase ninguém ocupa esta infraestrutura. Os vendedores negam-se a ocupar as
bancas alegando que "não querem servir de fatura de alguém". A obra
não corresponde ao preço real segundo empreiteiros ouvidos pela DW África.
Foto: DW/Luciano da Conceição
Obras continuam
As construções continuam em Vilanculos sem que ninguém ocupe as bancas. No mercado central, está a ser construído um novo mercado de peixes financiado pelo programa PROPESCA. O valor é de 9,6 milhões de meticais, quatro vezes acima do preço normal. A obra tem um prazo de 240 dias para ser executada e está a cargo da empresa Vilcon, cujo dono é investigado por fuga ao fisco.
Foto: DW/Luciano da Conceição
Areia vermelha nas ruas principais
Muitas ruas na vila turística de Vilanculos não têm pavimento, mas o Conselho Municipal gasta mais com a colocação de área vermelha do que com paves. Os munícipes reclamam da degradação dos seus automóveis e questionam: "Por que gastar dinheiro com areia enquanto pode-se colocar paves ou saibro com o mesmo valor?". A colocação da areia vermelha facilita o esquema de corrupção no município.
Foto: DW/Luciano da Conceição
Ruas em péssimo estado
Todos os anos, a Assembleia Municipal aprova o orçamento para a reabilitação desta rua do Mercado Novo. A via, no entanto, continua esburacada. O dinheiro sempre é dividido em comissões e resta pouco para a execução. A empreiteira selecionada é, há dois anos, a única empresa contratada para o efeito e não é sediada em Vilanculos, gerando o descontentamento de empresários locais.
Foto: DW/L. da Conceicao
Arrendamento caro
O sistema de corrupção no Conselho Municipal de Vilanculos tem foco na construção de novas bancas para facilitar a divisão do dinheiro entre os empreiteiros e os funcionários do órgão. É o caso concreto destas 12 bancas que foram construídas há dois anos no bairro 19 de Outubro, mas ninguém quer arrendar. Segundo os vendedores, o arrendamento está muito caro e não há rede elétrica.
Foto: DW/L. da Conceicao
Uma residência que custa milhões
As obras superfaturadas em Vilanculos também envolvem o governo da província de Inhambane. Este projeto prevê um investimento de quase 83 milhões de meticais para a construção de uma residência protocolar. Entretanto, falta transparência. A obra tem duração prevista de cinco anos, mas não se sabe quando começou.
Foto: DW/L. da Conceicao
Cadê o dinheiro?
O conselho empresarial de Vilanculos reclamou recentemente a reabilitação da Rua da Marginal para servir como cartão de visita aos turistas. Entretanto, anualmente tem se colocado areia vermelha para diminuir buracos de modo a permitir a circulação de viaturas, mas a rua continua em estado crítico. Os munícipes sempre questionam: Para onde vai o dinheiro da reabilitação desta via importante?
Foto: DW/L. da Conceicao
Corrupção de barba branca
A corrupção em Vilanculos vem desde há muito tempo. Em 2012, uma obra da reabilitação de uma avenida com quase três quilómetros custou quase 44 milhões de meticais aos cofres do município. A obra esteve a cargo da empresa chinesa Sinohydro e o financiamento veio do fundo de estrada. Até hoje, ninguém sabe
como tanto dinheiro foi gasto nesta obra.
Foto: DW/L. da Conceicao
Funcionários detidos por corrupção
Cerca de dez funcionários do Conselho Municipal de Vilanculos foram indiciados pelos crimes de corrupção e adjudicação de obras acima do preço normal. Dois foram detidos no ano passado por vender terrenos na zona da costa. Mangais foram destruídos para dar lugar à construção de um hotel residencial. Um flagrante desrespeito à lei ambiental.
Foto: DW/L. da Conceicao
Mangal vendido para dar lugar a hotéis
Boa parte da terra na costa foi adquirida por um empresário sul-africano que destruiu o mangal para construir condomínios. Alguns funcionários do Conselho Municipal de Vilanculos ainda estão sendo ouvidos no gabinete de combate à corrupção. A lei ambiental moçambicana proíbe a destruição de mangais e prevê punições.