RENAMO e MDM abertos a aliança da oposição contra a FRELIMO
Marcelino Mueia
20 de setembro de 2022
Em declarações à DW na Zambézia, Ossufo Momade e Lutero Simango mostram-se favoráveis a uma aliança da oposição moçambicana para derrotar a FRELIMO nas próximas eleições. Mas quem decide são os órgãos dos partidos.
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O líder da Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), Ossufo Momade, diz que Moçambique precisa de alternância política.
Em entrevista exclusiva à DW África, admite que está aberto à criação de uma coligação de partidos da oposição para destronar a Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) nas eleições gerais em 2024.
"Moçambique nunca teve alternância e nós estamos a fazer este acompanhamento para que cheguemos a esta perspetiva da população", afirma.
Ossufo Momade lembra, no entanto, que não decide sozinho no partido: "Não é o presidente que decide. Tenho que estar perante os órgãos do partido, são esses órgãos que vão dizer se podemos avançar para uma coligação ou não. Eu aceito aquilo que sai dos órgãos do partido, porque não sou ditador."
Resultado histórico da oposição angolana
Declarações de Ossufo Momade menos de um mês depois das eleições gerais em Angola, em que a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) se juntou a outras forças políticas da oposição e membros da sociedade civil para fazer frente ao Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), que governa o país desde 1975.
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A aliança trouxe um resultado histórico: em Luanda, a maior praça eleitoral do país, a UNITA foi o partido mais votado. A Convergência Ampla de Salvação de Angola - Coligação EleitoraL (CASA-CE), que não se juntou à aliança, não elegeu quaisquer deputados, saindo mesmo do Parlamento.
Em Moçambique, a ideia de uma aliança da oposição contra a FRELIMO também parece agradar ao líder do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), Lutero Simango.
Mas tal como Ossufo Momade, Simango remete uma decisão para os órgãos do partido. "A política é semelhante à economia. Para criar uma sociedade empresarial, cada um tem de trazer o seu capital. O MDM tem o seu capital e a decisão máxima não cabe ao presidente do partido, cabe aos órgãos do partido."
Enquanto isso não for decidido, garante que o MDM está "a trabalhar e a mobilizar todos os moçambicanos" e que o partido "está preparado para governar Moçambique, assim como os municípios."
"Distância ideológica" impedirá união?
O analista Ricardo Raboco duvida que seja criada em Moçambique uma aliança ou coligação de partidos políticos da oposição. Para Raboco, há problemas estruturais que impedem uma união entre a RENAMO e o MDM, por exemplo.
"Primeiro, a base fundacional para uma coligação, para uma união entre partidos, é uma identidade ideológica clara", lembra o especialista. Em segundo lugar, "a distância ideológica entre esses partidos não pode ser maior e devem resolver os problemas de institucionalização e de democratização interna."
Na opinião do analista, "enquanto continuarem a serem geridos em função da vontade de um big man, a coligação vai ser ao sabor da vontade das lideranças. A qualquer momento, por qualquer desavença, essa coligação pode se desfazer."
Em Angola, destronar o MPLA foi a cola que uniu a aliança da oposição. Mas o partido no poder desde a independência acabou por levar a melhor. O presidente do MPLA, João Lourenço, acaba de formar um novo Governo.
60 anos da FRELIMO, alguns momentos históricos
A FRELIMO comemora 60 anos desde a sua criação, em 1962, na Tanzânia. Durante este período, já teve cinco presidentes. Só o primeiro não dirigiu o país – Eduardo Mondlane.
Foto: Marco Longari/AFP/Getty Images
Eduardo Mondlane (à direita), o primeiro presidente da FRELIMO
Eduardo Chivambo Mondlane, o primeiro presidente da FRELIMO, nasceu em Manjacaze, província de Gaza, sul de Moçambique, a 20 de junho de 1920 e morreu em 03 de fevereiro de 1969, na Tanzânia, vítima de uma encomenda armadilhada. Eduardo Mondlane é carinhosamente tratado como o "pai da unidade nacional", por ter conseguido unir os três movimentos que fundaram a FRELIMO (UDENAMO, MANU e UNAMI).
Foto: casacomum.org/ Documentos Mário Pinto de Andrade
Samora Machel , o primeiro Presidente de Moçambique independente
Nascido a 29 de setembro de 1933, também em Gaza. Após a morte de Eduardo Mondlane, Samora Machel dirigiu os destinos da FRELIMO e a luta de libertação nacional até à proclamação da independência de Moçambique, a 25 de junho de 1975.
Foto: Fundação Mário Soares/Estúdio Kok Nam
Proclamação da independência nacional
A 25 de junho de 1975, em pleno Estádio da Machava, arredores da cidade de Matola, Samora Machel proclamou a independência nacional. Por essa via, viria a ser ele o primeiro Presidente da República Popular de Moçambique.
Foto: Fundação Mário Soares/Estúdio Kok Nam
Sob liderança de Machel, foi lançada em 1983 a Operação Produção
Na visão de Machel, o país deveria ser autossuficiente na produção de comida. Mas a "Operação Produção" acabou forçando milhares de pessoas, consideradas improdutivas, marginais e prostitutas, das grandes cidades a deixarem as suas famílias, rumo a Niassa.
Foto: Fundação Mário Soares/Estúdio Kok Nam
Samora Machel morre vítima de acidente aéreo em Mbuzini
A 19 de outubro de 1986, quando regressava de mais uma missão de Estado, o avião em que seguia despenhou-se na região de Mbuzini, na África do Sul. Calou-se a voz que marcou gerações em Moçambique. 36 anos depois, ainda não são conhecidos os autores morais e materiais da morte de Samora Machel.
Foto: DW/M. Maluleque
Joaquim Chissano - 2º Presidente de Moçambique e 3º da FRELIMO
Depois da morte de Machel, em 1986, coube a Joaquim Chissano a missão de tomar o remo do "barco" e navegar contra muitas turbulências. Encontrou o país mergulhado numa guerra civil e com alto índice de pobreza. Durante o seu reinado de 19 anos (1986-2005), assinou o acordo de Roma (1992) com a RENAMO, que pôs fim à guerra dos 16 anos. E liderou o processo de entrada no multipartidarismo.
Foto: Ismael Miquidade
Armando Guebuza – 4º Presidente da FRELIMO e 3º de Moçambique (2005-2015)
Sucedeu a Joaquim Chissano. Durante o seu reinado de 10 anos, Moçambique voltou a viver momentos de conflito militar com RENAMO. Também foi durante a governação de Guebuza que o país registou o pior escândalo financeiro na sua história - as "dívidas ocultas". Mas registou-se uma grande evolução em termos de infraestruturas públicas.
Foto: picture-alliance/dpa
Filipe Nyusi - o "homem" do momento (2015 até hoje)
Filipe Nyusi "levou" o poder político dentro da FRELIMO da região sul, onde sempre se concentrou desde o seu surgimento, para o "berço" da luta de libertação, Cabo Delgado. Encontrou o país mergulhado no escândalo das dívidas ocultas. Durante o seu consulado, lidou ainda com conflitos político-militares com a RENAMO, a "Junta Militar" e, atualmente, enfrenta os ataques terroristas de Cabo Delgado.