Moçambique: Revisão da Lei de Terras sob auscultação pública
Silaide Mutemba (Maputo)
10 de julho de 2023
A Lei de Terras está a ser revista em Moçambique. A sociedade civil espera que reflita a vontade das comunidades. O Governo diz querer responder às preocupações da população em relação ao direito e uso da terra.
Publicidade
A organização não-governamental de estudos ambientais Centro Terra Viva entende que a participação pública no processo de revisão da Lei de Terras deve ser melhorada. E alerta que este processo só terá um impacto positivo para todos os moçambicanos se as comunidades forem ouvidas.
"Se não houver participação dos interessados neste processo, poderá ser um instrumento estranho no seio dos cidadãos nacionais e poderá ter um impacto negativo, porque ninguém se vai rever na lei", diz o investigador Nelson Alfredo.
Alberto Tovele, pesquisador do Observatório do Meio Rural, entende que o problema das terras em Moçambique não está necessariamente ligado à legislação, mas sim à sua implementação.
"Há um conjunto de disposições na atual lei que podem conferir uma certa segurança para os titulares do direito e uso da terra. Mas a grande questão sempre esteve ligada à implementação", diz.
Moçambique: Paralegais apoiam comunidades afetadas pelo gás
03:03
Tribunais especializados em conflitos
É por isso que a União Nacional de Camponeses sugere, por exemplo, a instituição de tribunais especializados para questões de conflito de terras. Segundo Isidro Macaringue, "os conflitos de terra são uma especialidade e os tribunais não estão preparados para este tipo de conflitos e os magistrados não tem conhecimento específico para estas questões.”
O pesquisador Alberto Tovele sublinha ainda a necessidade de consultas públicas no processo de decisão sobre a terra em contextos em que a terra é tida como reserva do Estado, para que as comunidades possam decidir o que fazer em caso de investimentos económicos.
Esta posição é igualmente fundamentada pela União Nacional dos Camponeses. "Que ela venha reforçar os principais nós de estrangulamento, principalmente a questão das consultas comunitárias, um vetor de grandes conflitos, pois não se colocava um caráter obrigatório, para que a comunidade pudesse decidir sobre um investimento", afirma Isidro Macaringue.
O processo de revisão da Lei de Terras acontece no âmbito da aprovação, pelo Governo, da Política de Terras e Estratégia de sua Implementação, um instrumento que visa garantir o acesso, uso, aproveitamento e posse da terra pelas comunidades locais, cidadãos nacionais e investidores estrangeiros.
Mapudjé: A cadeia que produz alimentos no norte de Moçambique
Localizada a 100 km de Lichinga, na província nortenha do Niassa, a cadeia aberta de Mapudjé tem um objetivo: produzir alimentos. A produção serve outras cinco cadeias da região e reduz os custos ao Estado.
Foto: DW/M. David
Reclusos
Este centro de reclusão aberto abriga 150 reclusos. São detidos provenientes da cadeia provincial do Niassa, que estão a cumprir as suas penas em regime aberto graças ao bom comportamento apresentado. Aqui, neste estabelecimento penitenciário, eles também trabalham no campo.
Foto: DW/M. David
Via de acesso
Chegar ao centro de Mapudjé não é tarefa fácil. Com uma estrada totalmente lamacenta, pouco frequentada, o acesso ao local é difícil, sobretudo no tempo chuvoso. Recomenda-se carros com tração às quatro rodas para enfrentar este caminho, que passa também por troços de floresta cerrada.
Foto: DW/M. David
Construção típica
Quem chega ao centro de Mapudjé logo surpreende-se com as infraestruturas típicas da região. Esta casa é um exemplo. Foi construída com materiais locais - paus, bambu e capim - para ser o escritório do centro. A construção chama a atenção, pois foi erguida no alto de uma elevação.
Foto: DW/M. David
Posto de saúde
Para oferecer melhor atendimento sanitário aos reclusos, o centro aberto de Mapudjé conta com um posto de primeiros socorros. Em casos mais graves ou atendimento mais especializado, os detidos são transferidos para uma unidade sanitária distrital ou provincial.
Foto: DW/M. David
Produção agrícola
Com um trator e respetivas ferramentas, oferecidas a título de crédito pelo Fundo de Desenvolvimento Agrário (FDA), a cadeia de Mapudjé explora 135 hectares, cultivando milho, feijão manteiga e hortícolas. Na campanha agrícola passada, o centro de Mapudjé colheu mais de 60 toneladas de milho e 35 toneladas de feijão manteiga.
Foto: DW/M. David
Árvores de fruto
O centro também está a apostar em pequenas áreas para o cultivo de árvores de fruto. Aqui o destaque são as laranjeiras, que também ajudam no fornecimento de alimentos aos centros penitenciários do Niassa.
Foto: DW/M. David
Consumo vs. economia
As cadeias provinciais de Lichinga, Marrupa, Cuamba, Mecanhelas e Mandimba deixaram de comprar milho e feijão manteiga para o consumo dos reclusos. Agora consomem a comida produzida pelos detidos do centro de Mapudjé, no distrito de Sanga. Os Serviços Penitenciários do Niassa poupam mensalmente aos cofres do Estado cerca de 2,5 milhões de meticais (quase 35 mil euros).
Foto: DW/M. David
Produção farta
A produção agrícola do centro de Mapudjé é tão farta que a safra passada de feijão manteiga conseguiu alimentar até fevereiro deste ano os reclusos daquelas cinco cadeias provinciais. Quem o diz é o diretor da cadeia de Mapudjé, Jorge Santina. E ele garante que o milho continuará a ser consumido até à próxima colheita.
Foto: DW/M. David
"Experiência será replicada"
De visita ao centro aberto de Mapudjé, o diretor do FDA, Eusébio Tumuitikile, ficou satisfeito com os resultados da mecanização do processo de produção agrícola naquela unidade, que visa acabar com o défice alimentar no país. Por isso, Tumutikile disse que a experiência da autossuficiência alimentar da cadeia aberta de Mapudje será replicada noutros centros prisionais do país.