Jornalistas e observador eleitoral interrogados em Nampula
Sitoi Lutxeque (Nampula)
12 de janeiro de 2019
Quatro jornalistas e um observador eleitoral ameaçados de morte em Nampula após a derrota da FRELIMO nas autárquicas receberam uma notificação do Serviço Nacional de Investigação Criminal para prestarem declarações.
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O Serviço Nacional de Investigação Criminal (SERNIC), na província moçambicana de Nampula, intimou e começou a interrogar quatro jornalistas e um observador eleitoral ameaçados de morte por desconhecidos, após a derrota da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) nas eleições autárquicas do ano passado.
No entanto, a audição não agrada aos visados, que dizem que o SERNIC só começou a agir depois da pressão de várias organizações. Os interrogados consideram que, no final, não haverá nenhum resultado.
Trata-se dos padres Benvindo Tapua e Cantifula de Castro, o diretor e o diretor adjunto da Rádio Encontro, respetivamente, Aunício da Silva, jornalista e diretor editorial do Jornal Ikweli, Arlindo Chissale, jornalista da Rádio Comunitária de Nacala e António Mutoua, presidente da Sala da Paz, uma plataforma de observação eleitoral.
"Alguém deu um empurrão"
Nesta sexta-feira (11.01), foram ouvidos os padres Benvindo Tapua e Cantifula de Castro, tendo este último lamentado, em declarações à DW, o facto de o SERNIC só ter decidido tomar uma posição depois de ter sido pressionado. O padre lembrou que a sua instituição já tinha denunciado outro caso de ameaça de morte em março do mesmo ano, depois da vitória de Paulo Vahanle, da RENAMO.
"O SERNIC agora mostra-se preocupado porque alguém deu um empurrão - a Liga Nacional dos Direitos Humanos. Provavelmente, se não tivesse sido inscrito este ofício [da Liga] nada poderia acontecer para que houvesse estas audições", considera Cantifula de Castro.
Ainda assim, o padre está otimista quanto aos esclarecimentos e à responsabilização dos indivíduos que ameaçaram os visados: "Como é um organismo [Liga] extra Governo que está a fazer pressão, temos fé que podemos colher resultados que favoráveis".
Habituados ao silêncio
Entretanto, para além destes dois profissionais da comunicação, outros três terão sido intimados, apesar de não lhes ter sido entregue qualquer convocatória. O SERNIC enviou todas as notificações para a Rádio Encontro, que recusou fazer a redistribuição, alegando "não ser esse o seu papel".
Jornalistas e observador eleitoral interrogados em Nampula
Apesar de não ter recebido nenhuma convocatória oficial, Aunício da Silva, jornalista e diretor editorial do Jornal Ikweli, já teve conhecimento através de colegas que foi intimado, mas não sabe a data certa para a sua audição. O jornalista não tem dúvidas de que o SERNIC pouca coisa poderá fazer para além do silêncio a que já habituou os moçambicanos no que concerne a esclarecimentos de determinados crimes.
"As convocatórias para interrogatórios no Serviço Nacional de Investigação Criminal são o reflexo de um Estado e de um sistema falhado", considera. "Num momento de desespero, querendo mostrar serviço, por causa da pressão da Liga dos Direitos Humanos, há esse interesse por parte do SERNIC em esclarecer a questão, mas sabemos que isso não vai dar em nada".
Aunício da Silva lembra que já houve "casos muito mais complicados, como o assassinato de Mahamudo Amurane e de tantos outros membros da RENAMO na província de Nampula que não foram, até hoje, esclarecidos".
Aproveitamento político?
O caso de Mahamudo Amurane é lembrado também pelo jurista Arlindo Muririua, que considera que estas audições no SERNIC podem significar um aproveitamento político, de olhos postos nas eleições gerais de outubro.
"Estas convocatórias não são para as investigações, mas para informar [os visados] sobre as pistas que têm. O SERNIC às vezes perde o sentido do tempo”, afirma. "Nós vimos que Amurane morreu há um ano, mas quando se aproximavam as eleições [de outubro passado] foi quando anunciaram que os arguidos tinham sido constituídos", lembra o analista.
Para Muririua, não haverá nada de especial no caso das ameaças de mortes contra os jornalistas em Nampula.
Chuva em Nampula: Um rasto de destruição
Casas destruídas, estradas esburacadas e um ano letivo em risco: o mau tempo que se faz sentir há um ano na província de Nampula, norte de Moçambique, continua a fazer estragos.
Foto: DW/S. Lutxeque
Muitos estragos, poucos apoios
As chuvas que se fazem sentir desde dezembro do ano passado em Nampula estão a causar enormes estragos. Vários edifícios, entre residências e salas de aulas, ficaram destruídos. Há também estradas e pontes degradadas. Os apoios aos residentes são quase inexistentes. E o início do ano letivo poderá estar comprometido em várias escolas da cidade e província.
Foto: DW/S. Lutxeque
Edifícios não resistem à força da chuva
Desde dezembro de 2018, o número de casas destruídas na sequência do mau tempo tem vindo a aumentar. Até ao momento, as autoridades de gestão de calamidades ainda não divulgaram números concretos. No terreno, no entanto, constata-se que só na cidade de Nampula milhares de casas cederam perante a força da chuva.
Foto: DW/S. Lutxeque
Ano letivo comprometido
O início das aulas está marcado para 1 de fevereiro, mas o arranque do ano letivo poderá estar comprometido em diferentes distritos da província mais populosa de Moçambique, na sequência da destruição de algumas salas de aulas, sobretudo os telhados. Só na Escola Primária da Cerâmica, na cidade de Nampula, sete salas de aulas estão sem telhados devido a um vendaval que arrastou a cobertura.
Foto: DW/S. Lutxeque
Erosão ameaça destruir mais casas
Ainda chove na província de Nampula. A força das águas já está a provocar a erosão dos solos. Devido a este fenómeno, muitas moradias estão em risco de desabar: as paredes já estão a ruir.
Foto: DW/S. Lutxeque
Como chegar ao hospital?
O acesso ao Hospital Geral de Marrere, o segundo maior da província, está ameaçado. A ponte sobre o rio Muepelume, infraestrutura que dá acesso à unidade sanitária, está a ser corroída pelas chuvas e deixa os utentes preocupados. "Se as chuvas continuarem e o Governo não fizer uma intervenção, estaremos isolados do hospital", disse o cidadão André Kupula, à DW África.
Foto: DW/S. Lutxeque
Chuva pode isolar bairros
O rio Naphuta separa as unidades residenciais de Piloto e Muthita (à esquerda e à direita na foto, respectivamente). Com as chuvas intensas, um ponto pode, definitivamente, ficar isolado do outro, uma vez que não existe nenhuma infraestrutura a unir as duas regiões. Os moradores pedem que as autoridades municipais criem soluções, construindo uma ponte ou aqueduto, para evitar que o pior aconteça.
Foto: DW/S. Lutxeque
Lixo e pedras contra o mau tempo
Para se defenderem das chuvas, algumas famílias no bairro de Mutauanha decidiram entulhar as estradas e canais da corrente de água das chuvas com pedras e lixo. Mesmo assim, o perigo continua eminente. Se o mau tempo prevalecer, muitas casas poderão ceder.
Foto: DW/S. Lutxeque
A força dos sacos de areia
As famílias vão procurando alternativas para contornar os estragos do mau tempo e desafiar a corrente das chuvas. À entrada de muitas moradias vêem-se sacos de areia empilhados como uma espécie de "muralha" para travar a chegada das águas ao interior das casas e quintais.
Foto: DW/S. Lutxeque
Buracos nas estradas
Além das zonas residenciais, as intempéries afetam também o centro e as principais ruas da terceira cidade moçambicana. Muitas estradas e ruas estão esburacadas, mas as autoridades municipais afirmam que nada podem fazer, por enquanto, estando a aguardar o abrandamento das chuvas. Entretanto, os buracos vão ferindo a beleza da cidade, dizem os residentes.
Foto: DW/S. Lutxeque
Melhorar acessos "a medo"
Enquanto a chuva continua a cair, as estradas vão sofrendo as consequências. As vias das zonas periféricas são as mais afetadas. Ainda assim, a edilidade já começa os trabalhos de reparação, ainda que de forma "tímida". Uma das estradas em causa é a que liga a cidade ao bairro de Marrere, a zona em expansão mais concorrida dos arredores, devido às boas infraestruturas.
Foto: DW/S. Lutxeque
Trabalho infantil em alta
Com a queda das chuvas, as obras de reparação surgem um pouco por toda a província. E a construção civil gera um aumento do trabalho infantil, com muitas crianças a fazer o transporte de areia para venda nos locais das empreitadas. Jeremias, de 10 anos, trabalha para conseguir comprar material escolar: "Não tenho pasta nem cadernos". Precisa de juntar 400 meticais (cerca de cinco euros e meio).
Foto: DW/S. Lutxeque
Oportunidade para fazer dinheiro
A procura de blocos melhorados para a construção de moradias tem aumentado nas últimas semanas. Entre as consequências das chuvas, há quem encontre oportunidades de negócio. Na zona da Faina, um grupo produz e vende blocos de cimento: "Ultimamente, o negócio está a caminhar bem", diz um dos trabalhadores. "É normal, por dia, conseguir entre 2 mil e 5 mil meticais (entre 29 e 70 euros)".