Está cada vez mais difícil encontrar soluções para a crise da dívida moçambicana. Organizações da sociedade civil reuniram-se para discutir possíveis saídas ao problema.
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O Centro de Integridade Pública (CIP), o Instituto de Estudos Sociais e Económicos de Moçambique (IESE), a Fundação MASC (Mecanismo de Apoio à Sociedade Civil) e o Observatório do Mundo Rural (OMR), quatro organizações da sociedade civil em Moçambique, realizaram esta segunda-feira (31.10.) um encontro para discutirem temas como a monitoria da dívida pública, auditoria à dívida pública como "quick fix solution” ou oportunidades para uma reforma estrutural na gestão das finanças públicas em Moçambique.
No encontro, estas organizações da sociedade civil moçambicana alertaram o Banco de Moçambique para deixar de estar "ancorado” ao sistema político a fim de solucionar o problema da dívida.
As organizações criticaram, por outro lado, o Banco Central por estar a sustentar um Estado ineficiente, para além de destacarem que aquela instituição está a tirar dinheiro do setor privado para aliviar os efeitos da dívida. Jogo político para proteger interesses particulares
O presidente da Observatório do Meio Rural, João Mosca, chegou mesmo a afirmar que há muito jogo político visando proteger os negócios particulares. "Nós atacamos o Estado… Reestruturando, para que ele não faça este tipo de papel que não deve fazer. Então, estamos a apertar necessariamente esses grandes interesses desses grandes jogos de poder que existem em Moçambique".
As organizações entendem que o Governo moçambicano está com dificuldades para gerir o assunto da dívida de forma construtiva.
Convencer os doadores a abrir as portas novamente O cenário da dívida está confuso, admite António Francisco, do Instituto dos Estudos Económicos e Sociais. Segundo ele, "a saída não está nas mãos do executivo".
"Agora há um aspeto que é preocupante e por isso vai ser um quick fix na mesma. É que eu não vejo a abertura ou capacidade de uma solução que não seja através do Fundo Monetário Internacional (FMI) e dos doadores. A nossa preocupação agora é como convencer os doadores a voltarem a abrir a porta", defende o especialista.
A falência do Estado moçambicano não preocupa este analista. O que assusta neste momento António Francisco "é se conseguirmos evitar um Estado falhado". "O Estado falhado é um risco. Está ligado à guerra, à instabilidade económica. E é isso sim que acho que a sociedade civil devia estar preocupada,para contribuir para um diálogo mais produtivo", explica.
Segundo o Banco de Moçambique, a inflação chegará aos 30% até dezembro. As pequenas e médias empresas são as mais sacrificadas.
Relançar a confiança
Mas a melhor solução para sair deste problema, aos olhos de Jorge Matine, do Grupo Moçambicano da Dívida, é a criação de "mecanismos para que se possa relançar a economia e a confiança em relação aos investidores, aos doadores e sobretudo em relação as instituições que o Governo precisa para poder relançar a economia".
A crise financeira em Moçambique surgiu depois da descoberta de cerca de dois mil milhões de dólares de dívidas que o Governo contraiu de forma secreta.
Moçambique: centenas de pessoas marcham contra a situação política e económica
Centenas de moçambicanos marcharam no dia 18 de junho de 2016 em Maputo contra a situação política e económica do país. A manifestação foi convocada pela sociedade civil para exigir esclarecimentos ao Governo.
Foto: picture alliance/dpa/A. Silva
Pela Avenida Eduardo Mondlane rumo à Praça da Independência
"Pelo direito à esperança" foi o mote da manifestação que reuniu centenas de pessoas no centro de Maputo, no sábado dia 18 de junho de 2016. Os manifestantes exigem o fim do conflito político-militar entre o Governo da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) e a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO), o esclarecimento da dívida pública e mais liberdade de expressão.
Foto: picture alliance/dpa/A. Silva
"A intolerância política mata a democracia"
Em entrevista à DW África, Nzira de Deus, do Fórum Mulher, uma das organizações envolvidas, afirma que a liberdade dos moçambicanos tem sido muito limitada nos últimos meses. "É preciso deixar de intimidar as pessoas, deixarem as pessoas se expressarem de maneira diferente, porque eu acho que é isso que constrói o país. Não pode haver ameaças, não pode haver atentados", diz Nzira.
Foto: DW/L. Matias
De preto ou branco, manifestantes pedem paz
Com camisolas pretas e brancas e cartazes com mensagens de protesto, centenas de moçambicanos mostram o seu repúdio à guerra entre o Governo e a RENAMO, às dívidas ocultas e às valas comuns descobertas no centro do país. Num percurso de mais de dois quilómetros, entoaram cânticos pela liberdade e pela transparência.
Foto: DW/L. Matias
"Valas comuns são vergonha nacional"
Recentemente, foram descobertas valas comuns na zona central de Moçambique. Uma comissão parlamentar enviada ao local para averiguações nega a sua existência. Alguns dos corpos encontrados foram sepultados sem ter sido feita uma autópsia, o que dificulta o conhecimento das causas das suas mortes.
Foto: DW/L. Matias
"É necessário haver um diálogo político honesto e sincero"
Nzira de Deus considera que a crise política que Moçambique enfrenta prejudica a situação do país e defende que “haja um diálogo político honesto e sincero e que se digam quais são as questões que estão em causa". Para além da questão da dívida e da crise política, os manifestantes estão preocupados com as liberdades de expressão e imprensa.
Foto: DW/L. Matias
Ameaças não vão amedrontar o povo
No manifesto distribuído ao público e lido na estátua de Samora Machel, na Praça da Independência, as organizações da sociedade civil exigiram à Procuradoria-Geral da República uma auditoria forense à dívida pública. "Nós queremos que o ex-Presidente [Armando Guebuza] e o seu Governo respondam por estas dívidas", declarou Alice Mabota, acrescentando que as ameaças não vão "amedrontar o povo".
Foto: DW/L. Matias
Sociedade Civil presente
A manifestação foi convocada por onze organizações da sociedade civil moçambicana. Entre as ONGs que organizaram a marcha encontram-se a Liga dos Direitos Humanos (LDH), o Instituto de Estudos Sociais e Económicos (IESE), o Observatório do Meio Rural, o Fórum Mulher e a Rede HOPEM.