O ministro das Finanças de Moçambique, Adriano Maleiane, continua a tentar negociar com os parceiros estrangeiros o alívio da dívida externa. O objetivo é usar o dinheiro na luta contra a pandemia de Covid-19.
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Moçambique está submerso em dívidas aos parceiros estrangeiros e, num cenário de pandemia, o titular a pasta das Finanças, Adriano Maleiane, apela à solidariedade, trazendo a discussão o tema do cancelamento de algumas obrigações para poder dar resposta à Covid-19.
A dívida total de Moçambique à China ronda 1,3 mil milhões de dólares (1,1 mil milhões de euros) e Maputo já pediu um alívio no pagamento de prestações, aguardando por uma resposta, anunciou na terça-feira (13.10) o ministro da Economia e Finanças, Adriano Maleiane.
Moçambique tem "dois tipos de empréstimos com a China", a dívida com o Governo e outra perante o sistema bancário, num total de 1,3 mil milhões de dólares (1,1 mil milhões de euros), detalhou o governanete num debate na Internet no âmbito dos encontros anuais do Banco Mundial.
Adriano Maleiane foi orador numa troca de ideias em que o papel da China esteve em discussão, nomeadamente sobre se estará alinhada com a Suspensão do Serviço da Dívida (DSSI) do Clube de Paris e G20 - 19 maiores economias do mundo mais a União Europeia (UE) - anunciada em abril para vigorar até final do ano e cuja extensão para 2021 está em aberto.
CIP: Dívida à China é "assustadora"
As dívidas de África à China têm motivado diversas análises a propósito dos encargos com a Covid-19. O Centro de Integridade Pública (CIP), ONG moçambicana, considera a dívida de Moçambique ao gigante asiático "assustadora" e pouco transparente. O CIP estima que o país devia à China cerca de dois mil milhões de dólares (1,7 mil milhões de euros) até ao final de 2019 - números superiores ao divulgados pelo ministro da Economia e Finanças.
Esta organização critica o facto de os relatórios da dívida pública do Estado moçambicano não incluírem informações sobre juros e amortizações na dívida com a China, "o que representa uma fraqueza para um documento que na sua generalidade tem um conteúdo rico".
Moçambique deixou "eurobonds" fora de pedido de alívio
Moçambique pediu aos credores de dívida externa um alívio nas prestações para enfrentar a covid-19, mas deixou de fora desse pedido os portadores de títulos soberanos relacionados com as dívidas ocultas para evitar "instabilidade" numa "boa reestruturação", anunciou o ministro das Finanças.
"Levámos muito tempo para discutir esta reestruturação. Para ser honesto, levámos dois anos a negociar com o setor privado e acho que conseguimos um bom resultado", pelo que, mesmo face aos encargos da Covid-19, o país preferiu não causar "instabilidade" no plano estabelecido.
O processo de Moçambique para adesão ao alívio da dívida externa, para lidar com a Covid-19, junto dos credores bilaterais do Clube de Paris - instituição informal cuja missão é ajudar financeiramente estados com dificuldades económicas - está a ser finalizado, anunciou no debate Odile Renaud-Basso, secretária-geral do grupo de credores. "Para Moçambique, o processo está a ser finalizado", referiu a responsável.
A resposta daquela responsável surgiu depois de Maleiane ter referido que o país ainda não recebeu qualquer reação dos credores, aos quais já tinha escrito. "Mandámos carta e o memorando de entendimento com o Clube de Paris, mas estamos à espera de decisão. Até agora não recebemos formalmente reação dos credores. Assumimos que estão a fazer o melhor e que o secretariado do Clube de Paris nos convidará para negociações", disse o governante.
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Suspender ou cancelar a dívida?
Para Adriano Maleiane, o alívio anunciado em abril e no qual está também alinhado o G20 é uma das "mais importantes" iniciativas de ajuda a países como Moçambique, porque é necessário dinheiro para acudir aos mais afetados pela Covid-19.
Nesse sentido, o ministro das Finanças moçambicano sugeriu que se deviam discutir medidas de cancelamento de dívida e não apenas de suspensão. "A suspensão em vez de cancelamento suscita mais questões que respostas" porque é uma incógnita qual será o estado da economia quando as obrigações de pagamento foram retomadas, referiu. "O que será melhor, suspender ou cancelar", questionou Maleiane, desafiando .
"Penso que o cancelamento como fez o Fundo Monetário Internacional (FMI), por exemplo, e usar esse dinheiro para suportar saúde e educação é o mais sustentável", sublinhou - um cenário deixado por Maleiane, sem enjeitar a suspensão já anunciada até final do ano, que classifica como "um bom passo".
Moçambique: O abecedário das dívidas ocultas
A auditoria independente de 2017 às dívidas ocultas não revela nomes. As letras do abecedário foram usadas para os substituir. Mas pelas funções chega-se aos possíveis nomes. Apresentamos parte deles e as suas ações.
Foto: Fotolia/Africa Studio
Indivíduo "A"
Supõe-se que Carlos Rosário seja o indivíduo "A" do relatório da Kroll. Na altura um alto quadro da secreta moçambicana que se teria recusado a fornecer as informações solicitadas pelos auditores da Kroll alegando que eram "confidenciais" e não estavam disponíveis. Rosário foi detido em meados de fevereiro no âmbito das dívidas ocultas. Há inconsistências nas informações fornecidas pelo indivíduo.
Foto: L. Meneses
Indivíduo "B"
Andrew Pearse é ex-diretor do banco Credit Suisse, um dos dois bancos que concedeu os empréstimos. No relatório da Kroll é apontado como um dos envolvidos nos contratos de empréstimos originais entre a ProIndicus e o Credit Suisse. De acordo com a justiça dos EUA, terá recebido, juntamente com outros dois ex-colegas, mais de 50 milhões de dólares em subornos e comissões irregulares.
Foto: dw
Indivíduo "C"
Manuel Chang, ex-ministro das Finanças, assinou as garantias de empréstimo em nome do Governo moçambicano. Admitiu à auditoria que violou conscientemente as leis do orçamento ao aprovar as garantias para as empresas moçambicanas. Alega que funcionários do SISE convenceram-no a fazê-lo, alegando razões de segurança nacional. Hoje é acusado pela justiça dos EUA de ter cometido crimes financeiros.
Foto: Getty Images/AFP/W. de Wet
Indivíduo "D"
Maria Isaltina de Sales Lucas, na altura diretora nacional do Tesouro, terá coadjuvado o ministro das Finanças Manuel Chang, ou indivíduo "C", na arquitetura das dívidas ocultas. No Governo de Filipe Nyusi foi vice-ministra da Economia e Finanças, mas exonerada em fevereiro de 2019. Segundo o relatório, terá recebido 95 mil dólares pelo seu papel entre agosto de 2013 e julho de 2014 pela Ematum.
Foto: P. Manjate
Indivíduo "E"
Gregório Leão foi o número um do SISE, os Serviços de Informação e Segurança do Estado. O seu nome é apontado no relatório da Kroll e foi detido em fevereiro passado em conexão com o caso das dívidas ocultas.
Foto: Ferhat Momad
Indivíduo "F"
Acredita-se que Lagos Lidimo, diretor do SISE, Serviços de Informação e Segurança do Estado, desde janeiro de 2017, seja o indivíduo "F". Substituiu Gregório Leão, o indivíduo "E". Na altura disse que não tinha recebido "qualquer registo relacionado as empresas de Moçambique desde que assumiu o cargo." A ONG CIP acredita que assumiu essa posição para proteger Filipe Nyusi, hoje chefe de Estado.
Foto: Ferhat Momad
Indivíduo "K"
Salvador Ntumuke é ministro da Defesa desde de 2015. Diz que não recebeu qualquer registo relacionado com as empresas moçambicanas desde que assumiu o cargo. O relatório da Kroll diz que informações fornecidas pelo Ministério da Defesa, Ematum e a fornecedores de material militar não coincidem. Em jogo estariam 500 milhões de dólares. O ministro garante que não recebeu dinheiro nem equipamento.
Foto: Ferhat Momad
Indivíduo "L"
Víctor Bernardo foi vice-ministro da Planificação e Desenvolvimento no Governo de Armando Guebuza. E na qualidade de presidente do conselho de administração da ProIndicus, terá assinado os termos e condições financeiras para a contratação do primeiro empréstimo da ProIndicus ao banco Credit Suisse, juntamente com Maria Isaltina de Sales Lucas.
Foto: Ferhat Momade
Indivíduo "R"
Alberto Ricardo Mondlane, ex-ministro do Interior, terá assinado em nome do Estado o contrato de concessão da ProIndicus, juntamente com Nyusi, Chang e Rosário. Um email citado pela justiça dos EUA deixa a entender que titulares de alguns ministérios moçambicanos envolvidos no caso, entre eles o do Interior, iriam querer a sua "fatia de bolo" enquanto estivessem no Governo.
Foto: DW/B . Jaquete
Indivíduo "Q"
Filipe Nyusi, na altura ministro da Defesa, seria identificado como indivíduo "Q" no relatório. Uma carta publicada em 2019 pela imprensa moçambicana revela que Nyusi terá instruído os responsáveis da Ematum, MAM e ProIndicus a fazerem o empréstimo. Afinal, parte dessas empresas estavam sob tutela do seu ministério. Hoje Presidente da República, Nyusi nunca esclareceu a sua participação no caso.
Foto: picture-alliance/Anadolu Agency/M. Yalcin
Indivíduo "U"
Supõe-se que Ernesto Gove, ex-governador do Banco de Moçambique, seja o indivíduo "U". Terá sido uma das entidades que autorizou a contração dos empréstimos. E neste contexto, em abril de 2019 foi constituído arguido no processo judicial sobre as dívidas ocultas. Entretanto, em 2016 Gove terá dito que não tinha conhecimento do caso das dívidas. (galeria em atualização)