Três condenados no caso camião-cisterna em Caphiridzange
Amós Fernando (Tete)
25 de julho de 2018
Ninguém foi responsabilizado pela morte das 115 pessoas na sequência da explosão do camião-cisterna, em 2016. Pena máxima de três anos foi para acusação de furto. Polícias réus vêem pena de 6 meses convertida em multa.
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O tribunal judicial de Moatize condenou esta quarta-feira (25.07) três dos seis réus do caso da explosão do camião-cisterna, em 2016, que matou mais de 100 pessoas. As penas variam entre os seis meses e os 3 anos.
Sabino Sargento, à data um revendedor não autorizado de combustível, recebeu a maior pena no tribunal judicial de Moatize: foi condenado a 3 anos de prisão por furto qualificado.
Sargento terá também de pagar uma indemnização de 350 mil meticais, cerca de 5 mil euros, à empresa do Malawi proprietária do camião desviado que se incendiou durante um roubo coletivo de combustível a 17 de novembro de 2016, matando 115 pessoas.
O tribunal afirma que o fogo que levou à explosão do camião-cisterna terá sido causado por um curto-circuito, no dia anterior, quando Sabino Sargento e o motorista do veículo - ainda em parte incerta - faziam a descarga do combustível para uma segunda viatura, usando uma motobomba.
Mas o juiz Sales Mulima entendeu que não há provas suficientes para responsabilizar Sabino Sargento pelas mortes em Caphiridzange, ficado apenas a pena por furto qualificado.
"A punição foi em função do combustível que existia na camioneta", explicou Mulima.
Belmiro João Paulo, advogado de defesa de Sabino Sargento, diz que esperava penas mais graves, mas, ainda assim, pondera o recurso: "A decisão tomada pelo tribunal não foi tão gravosa como nós esperávamos e alguns réus foram absolvidos. No entanto, vamos sentar para ver se podemos recorrer da decisão".
Polícias condenados a pagar 166 meticais por dia durante 6 meses
Outros dois réus, Custódio Marizane Missassi e Celestino Sebastião, ambos agentes da Polícia de República de Moçambique (PRM), foram condenados a seis meses de prisão, convertidos numa multa de 166 meticais (cerca de 2 euros) diários. São acusados de apoiar Sabino Sargento na remoção do seu carro do local, depois do curto-circuito no camião-cisterna.
Tal como acontece com Sabino Sargento, o juiz Mulima não responsabiliza os polícias pela morte das 115 pessoas no dia seguinte, quando se deu a explosão.
Três condenados no caso camião-cisterna em Caphiridzange
"Quanto ao dia 17 de Novembro (dia da tragédia), olhando pelo comportamento dos membros da PRM que não fizeram o seu trabalho, também o tribunal entendeu que não podia condená-los pelas mortes".
O juiz concordou, contudo, que as ações dos polícias foram contra o que era o dever da sua função.
"Os réus, como agentes da polícia, por dever do ofício tinham que estar lá a proteger a propriedade, mas abandonaram o local".
O tribunal de Moatize decidiu ainda absolver os restantes três réus. Um deles é Luís Tambo, na altura, chefe da localidade de Caphirizange, que era acusado de negligência, por não ter tomado medidas para evitar a tragédia.
Restantes réus absolvidos
Os outros réus – Eugénio Lasteira e Laurindo Manejo, membros da Polícia em Caphiridzange, que eram acusados de associação criminosa para facilitar o roubo de combustível, foram também absolvidos por falta de provas.
A sentença do tribunal não agrada a alguns membros das famílias das vítimas da tragédia presentes no tribunal, que pediam "penas exemplares" pelas mortes em Caphiridzange.
Na sentença lida esta quarta-feira (25.07), não há espaço para as indemnizações às famílias afetadas. O juiz Sales Mulima diz que ainda há outros processos ligados a este caso, sobre os quais o tribunal se irá pronunciar na devida altura.
Tragédia em Tete
A explosão de um camião-cisterna em Tete, centro de Moçambique, durante um roubo coletivo de combustível causou 93 mortos. Dezenas de famílias ficaram desestruturadas e sem base de sustento.
Foto: DW/A. Zacarias
A explosão
A explosão deste camião-cisterna (17.11) que transportava combustível, em Nhacathale, localidade de Caphiridzange, província de Tete, centro de Moçambique, matou 93 pessoas, segundo o último balanço oficial. Entre as vítimas, há duas grávidas e 12 crianças, que estavam envolvidas no roubo coletivo do combustível, quando se deu a explosão. Há 50 feridos no hospital provincial, 13 em estado crítico.
Foto: DW/A. Zacarias
Camião abandonado
Este camião de uma companhia malauiana transportava dois tanques de combustível. Ter-se-á desviado da rota, para vender combustível a revendedores de rua, segundo a agência Lusa. Mas uma das secções do tanque incendiou-se. Os motoristas ter-se-ão posto em fuga e, na ausência das autoridades, a população começou a retirar combustível da segunda secção do tanque, onde se deu a explosão.
Foto: DW/A. Zacarias
Roubo de combustível fatal
Esta moto foi usada por alguns populares para o transporte de combustível, desde o local onde se encontrava o camião, em Nhacathale, na localidade de Caphiridzange, para as casas dos populares, para posteriormente ser vendido.
Foto: DW/A. Zacarias
Aldeia de luto
Em Nhacathale quase todas as famílias estão de luto. Há órfãos, viúvas e há casas onde todos perderam a vida. Dezenas de famílias ficaram desestruturadas e perderam a base de sustento. No sábado (19.11), pelo menos 22 corpos foram a enterrar no cemitério local.
Foto: DW/A. Zacarias
Causas ainda por apurar
A ministra da moçambicana da Administração Estatal e Função Pública, Carmelita Namashulua, visitou o local da tragédia, cujas causas permanecem incertas, disse.
A ministra anunciou que o Governo criou uma comissão para assegurar que a desintegração das famílias não conduza os sobreviventes para um caos social. A comissão de apoio social deverá fazer um levantamento das necessidades.
Foto: DW/A. Zacarias
Sozinho com 11 filhos
Manuel António ficou viúvo. Tinha duas esposas, as duas morreram carbonizadas no local da tragédia. António tem agora 11 filhos menores à sua guarda. O carpinteiro de 57 anos conta que quando a explosão aconteceu estava no mato à procura de madeira para sua carpintaria.
Foto: DW/A. Zacarias
Lágrimas
Helena chora pela irmã. Muitas famílias estão desesperadas, porque a cada dia há mais mortes no hospital e há novas famílias atingidas ou repetindo o luto. Vários residentes dizem que vai demorar ainda muito tempo até que a aldeia recupere da dor da tragédia.
Foto: DW/A. Zacarias
Famílias desestruturadas
Joseph, de 51 anos, perdeu três elementos da família na explosão do camião-cisterna. Sobrinho, irmão e cunhado, todos morreram no local da tragédia. Moçambique cumpriu três dias de luto nacional.
Foto: DW/A. Zacarias
Sofrimento generalizado
Enquanto se choram os mortos, trata-se dos feridos. O Governo moçambicano anunciou que reforçou a capacidade de intervenção dos serviços de saúde, nomeadamente do Hospital Provincial de Tete, incluindo mais médicos, medicamentos e a disponibilização de dispositivos de climatização para os blocos de enfermaria. Ainda nenhum dos feridos teve alta.
Foto: DW/A. Zacarias
Órfãos
Muitos menores ficaram órfãos em Nhacathale, na sequência da explosão do camião-cisterna que transportava combustível. Na aldeia, quase ninguém sai à rua para consolar os vizinhos em luto, como é tradicional na cultura moçambicana. Isto porque quase todas as casas estão de luto.