Moçambique voltou a regredir no índice de corrupção
Leonel Matias (Maputo)
22 de fevereiro de 2018
País fica na 157ª, atrás de Cabo Verde (51º) e São Tomé e Príncipe (68º). Centro de Integridade Pública vê desempenho com preocupação e adverte que o combate à corrupção está a falhar.
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Moçambique regista nova queda no Índice de Perceção da Corrupção, segundo a avaliação feita pela organização não-governamental Transparência Internacional. Para o Centro de Integridade Pública de Moçambique (CIP), estes resultados demonstram que a ação anticorrupção no país não está a produzir efeitos.
Apesar de o país ter permanecido na posição 157ª, alcançada no ano passado, Moçambique piorou sua pontuação, de 27 para 25 (100 pontos país livre de corrupção). Esta é a maior queda do país em dois anos consecutivos, desde que este índice começou a ser produzido e publicado em 1995.
Baltazar Fael, pesquisador do CIP, explicou numa cerimónia realizada nesta quinta-feira (22.02), que a posição varia em função do número de países avaliados, mas o mais importante para medir a perceção do nível de corrupção é o "score", ou seja, a pontuação do país. "O que está a acontecer é que o país de ano para ano vai registando estas quedas porque não há medidas concretas para combater a corrupção ao nível do setor público”, explica.
Moçambique voltou a regredir no índice de percepção da corrupção
Ao avaliar a queda no índice, Fael observa que os números transmitem uma imagem negativa de Moçambique para o mundo. "O país acaba ficando-se exposto no sentido de que é um país altamente corrupto, é um país onde não há medidas concretas para combater a corrupção”, ressalta.
Casos de corrupção não resolvidos
O Centro de Integridade Pública considera que esta acentuada queda não pode estar alheia às matérias relacionadas com as dívidas ilegais contraídas em 2013 e 2014 pelo Governo, feitas sem o conhecimento do Parlamento e dos parceiros internacionais, e cujos autores ainda não foram responsabilizados.
O impacto destas dívidas acaba por ofuscar qualquer outro tipo de julgamento e condenação de casos de corrupção que o sistema judiciário tramitou em 2017. Além disso, outros casos de corrupção com contornos internacionais ainda não foram julgados.
Baltazar Fael apela a uma reflexão profunda sobre a eficácia da atual forma pela qual os casos de corrupção são julgados, principalmente os da chamada "grande corrupção”. Dentre as possíveis mudanças, ele sugere deixar de lado os trâmites em tribunais. "Uma das medidas que nós pensamos que podem ser tomadas é não se criarem necessariamente tribunais para combater a corrupção, mas criarem-se dentro das secções que já existem unidades específicas (especializadas) para julgar casos de corrupção”, defende.
Comparando com os restantes países africanos de língua portuguesa, Moçambique suplanta, pelo segundo ano consecutivo, apenas Angola (170º) e a Guiné-Bissau (176º). Os países lusófonos melhor posicionados são Cabo Verde (51º), seguido de São Tomé e Príncipe (68º). Apesar da queda, Moçambique está acima de países da sub-região da África Austral como Madagáscar, Zimbabué e República Democrática do Congo.
Como funciona o índice
O índice, que avalia mais de 180 países e territórios segundo os seus níveis de perceção de corrupção no setor público, usa uma escala de zero a 100 pontos, em que zero qualifica um país/território como "altamente corrupto" e 100 um "totalmente livre de corrupção".
Este ano, o índice revela que mais de dois terços dos países têm uma pontuação abaixo de 50, com uma média global de 43. A Nova Zelândia (com 89 em 100) e a Dinamarca (88) continuam nos primeiros lugares.
Ao nível das regiões, a que conseguiu melhor desempenho foi o conjunto de países da Europa Ocidental, com uma pontuação média de 66. As regiões com pior desempenho são a África Subsaariana (pontuação média 32) e a Europa Oriental e Ásia Central (34).
O Índice de Perceção da Corrupção, publicado anualmente pela Transparência Internacional, é o principal indicador global sobre os níveis de corrupção no setor público de cada país, medidos a partir das perceções de especialistas externos e de organizações internacionais.
Obras sobrefaturadas transformam Vilanculos em cidade-fantasma
Falta de transparência, obras inacabadas e a preços exorbitantes. Corrupção generalizada no Conselho Municipal de Vilanculos, em Inhambane, gera construções inacabadas, que não podem aproveitadas pela população.
Foto: DW/L. da Conceicao
O triplo do preço real
No Conselho Municipal de Vilanculos, na província moçambicana de Inhambane, os preços das obras estão a ser adulterados para beneficiar funcionários que recebem comissões ilegais de empreiteiros depois da adjudicação. Três balneários públicos ainda em construção custaram meio milhão de meticais aos cofres públicos, três vezes acima do preço normal.
Foto: DW/Luciano da Conceição
Construções desnecessárias
O Conselho Municipal de Vilanculos construiu um alpendre com mais de 50
bancas. O investimento foi de 1,5 milhões de meticais, mas, há dois anos, quase ninguém ocupa esta infraestrutura. Os vendedores negam-se a ocupar as
bancas alegando que "não querem servir de fatura de alguém". A obra
não corresponde ao preço real segundo empreiteiros ouvidos pela DW África.
Foto: DW/Luciano da Conceição
Obras continuam
As construções continuam em Vilanculos sem que ninguém ocupe as bancas. No mercado central, está a ser construído um novo mercado de peixes financiado pelo programa PROPESCA. O valor é de 9,6 milhões de meticais, quatro vezes acima do preço normal. A obra tem um prazo de 240 dias para ser executada e está a cargo da empresa Vilcon, cujo dono é investigado por fuga ao fisco.
Foto: DW/Luciano da Conceição
Areia vermelha nas ruas principais
Muitas ruas na vila turística de Vilanculos não têm pavimento, mas o Conselho Municipal gasta mais com a colocação de área vermelha do que com paves. Os munícipes reclamam da degradação dos seus automóveis e questionam: "Por que gastar dinheiro com areia enquanto pode-se colocar paves ou saibro com o mesmo valor?". A colocação da areia vermelha facilita o esquema de corrupção no município.
Foto: DW/Luciano da Conceição
Ruas em péssimo estado
Todos os anos, a Assembleia Municipal aprova o orçamento para a reabilitação desta rua do Mercado Novo. A via, no entanto, continua esburacada. O dinheiro sempre é dividido em comissões e resta pouco para a execução. A empreiteira selecionada é, há dois anos, a única empresa contratada para o efeito e não é sediada em Vilanculos, gerando o descontentamento de empresários locais.
Foto: DW/L. da Conceicao
Arrendamento caro
O sistema de corrupção no Conselho Municipal de Vilanculos tem foco na construção de novas bancas para facilitar a divisão do dinheiro entre os empreiteiros e os funcionários do órgão. É o caso concreto destas 12 bancas que foram construídas há dois anos no bairro 19 de Outubro, mas ninguém quer arrendar. Segundo os vendedores, o arrendamento está muito caro e não há rede elétrica.
Foto: DW/L. da Conceicao
Uma residência que custa milhões
As obras superfaturadas em Vilanculos também envolvem o governo da província de Inhambane. Este projeto prevê um investimento de quase 83 milhões de meticais para a construção de uma residência protocolar. Entretanto, falta transparência. A obra tem duração prevista de cinco anos, mas não se sabe quando começou.
Foto: DW/L. da Conceicao
Cadê o dinheiro?
O conselho empresarial de Vilanculos reclamou recentemente a reabilitação da Rua da Marginal para servir como cartão de visita aos turistas. Entretanto, anualmente tem se colocado areia vermelha para diminuir buracos de modo a permitir a circulação de viaturas, mas a rua continua em estado crítico. Os munícipes sempre questionam: Para onde vai o dinheiro da reabilitação desta via importante?
Foto: DW/L. da Conceicao
Corrupção de barba branca
A corrupção em Vilanculos vem desde há muito tempo. Em 2012, uma obra da reabilitação de uma avenida com quase três quilómetros custou quase 44 milhões de meticais aos cofres do município. A obra esteve a cargo da empresa chinesa Sinohydro e o financiamento veio do fundo de estrada. Até hoje, ninguém sabe
como tanto dinheiro foi gasto nesta obra.
Foto: DW/L. da Conceicao
Funcionários detidos por corrupção
Cerca de dez funcionários do Conselho Municipal de Vilanculos foram indiciados pelos crimes de corrupção e adjudicação de obras acima do preço normal. Dois foram detidos no ano passado por vender terrenos na zona da costa. Mangais foram destruídos para dar lugar à construção de um hotel residencial. Um flagrante desrespeito à lei ambiental.
Foto: DW/L. da Conceicao
Mangal vendido para dar lugar a hotéis
Boa parte da terra na costa foi adquirida por um empresário sul-africano que destruiu o mangal para construir condomínios. Alguns funcionários do Conselho Municipal de Vilanculos ainda estão sendo ouvidos no gabinete de combate à corrupção. A lei ambiental moçambicana proíbe a destruição de mangais e prevê punições.